"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



quarta-feira, 29 de maio de 2019


Feliz aniversário, Marina!

Que a tua sensibilidade acorde a parcela mais bonita de amor próprio e (re)invente um caminho só seu, enfeitado de delicadezas.
Que o afeto que você distribui nunca cesse - dentro de você. Aquele afeto que ninguém vê, que ninguém sabe, que ninguém reconhece, mas que sustenta os laços mais duradouros de amor, amor puro, amor bonito.
Que antes de ser para o outro, você seja para você, seja seu e seja todo. Sempre inteira 
Que haja reciprocidade em cada gesto teu. E inteireza em todo sentimento que habita o seu íntimo. 
Que não lhe faltem abraços, ainda que sem os braços. 
E que você não se esqueça um segundo sequer que o meu carinho por você existe e acontece, sempre. 
Amém!


#dia do sociólogo

um amor que se põe


O céu ostenta uma nuvem de fogo. Uma gorda e fofa brasa disfarçando o sol sobre um azul opaco de fim de tarde. Volto para casa depois de mais uma viagem. Desta vez, deixei alguma coisa por lá. Talvez a esperança de uma ilusão que se dissolveu pelo caminho.

Preciso chorar por isso tudo. Tenho chorado a prestação, em pequenos momentos de delicadeza que me remetem ao que sonhei para nós. A música do comercial das bolas, que girava em looping no seu notebook durante aquela noite em que nos encantamos um com o outro. Junto com uma sensação de fracasso, ficaram muitas interrogações, a maioria delas vindas de perguntas que você mesmo nunca quis se fazer. Devolvo aqui cada uma delas.

Lembro de um encontro simples e natural entre duas pessoas dispostas a seguir juntas, não importava o que acontecesse. Lembro de noites em claro em que muitos segredos foram revelados, confissões feitas e acolhidas por corações abertos e limpos. Lembro de medos postos na mesa, planos traçados e uma família sendo delicadamente construída com tudo o que tínhamos recolhido – de bom e de ruim – pelo caminho. Lembro dos seus olhos verdes me olhando vivos como sempre, ávidos por tudo o que eu tinha para lhe dar. Lembro de noites maldormidas em uma cama não tão grande, como se adormecer fosse a ameaça de perder de vista a descoberta preciosa que havíamos feito. Nós tínhamos nos encontrado. E o trato de seguir de mãos dadas foi espontâneo, esperado, comemorado, comovente. Lembro de uma sensação de proteção com a qual há muito tempo eu não sonhava.

Não tive dúvidas: era com você que eu queria ir. Eu sabia que não seria fácil nem simples. Mas cada vez que você tomava a minha mão eu sentia que valia a pena ir naquela direção. Fui inteira, de mala, cuia e filho, sem me importar em deixar reservas para uma possível mudança de planos. Você não precisou ir. Apenas ficou. Você, que se planeja. Reserva para o futuro. Você, que poupa dinheiro, palavras, fúria, noites de sono. Poupa a si mesmo para o que pode faltar mais adiante.

Você prefere viver na companhia do medo – é a ele que você verdadeiramente se entrega. Eu, não. Eu não guardo nada. Nem dinheiro, nem raiva, nem palavras, nem segredos. Como escrevo essa carta para não deixar nem mesmo palavras não ditas.

Gosto da sensação de ter sido lapidada pelas pessoas. Com um ex-namorado aprendi a dirigir mais suave, com uma amiga aprendi o prazer de um café, com meu pai aprendi o humor, com minha mãe a alegria. Você me ensinou muitas coisas e eu estive disposta a aprender. Você não via em mim nada para somar. Eu sou muito brava, perco a paciência fácil, digo o que penso sem calcular. E a intensidade dessa fúria é a mesma que alimenta um amor que luta muito e não desiste fácil. Sou furiosa para confessar o que me incomoda, tanto quanto para lutar pelo amor em que acredito. Você se preserva, não sei exatamente por quê, mas o fato é que se guarda muito, se guarda inteiro. Para não lhe faltar.

E por muitas vezes você não disse o que sentia, o que pensava, preferiu se controlar para não machucar. Com algum fato ou alguém você aprendeu que é feio se mostrar, sentir raiva, levantar a voz, ser humano e falível, como se evitar desrespeitar o outro justificasse desrespeitar-se a si mesmo. Já eu aprendi que respeito anda lado a lado com a palavra mútuo, e peitei as leis da polidez. Aprendi que deixar escapar minha fúria pode ser um grande sinal de amor. Despir-se diante do outro é entrega. Aprendi que aceitar os meus defeitos é antes de tudo não escondê-los. Nem de mim, nem de ninguém. Sou falível, sim. Sou bicho, às vezes. E é isso que me deixa ser gente, e não robô. Não sorrio o tempo todo, não falo baixo e comedida por mais tempo do que aguento.

E é esse ser falível e factível que amou você. Amou muito. E me mostrei. E pedi que você não desistisse de mim. E quis ajudar você a sair da sua casca, a se conhecer melhor, a entender o que realmente deseja e a lutar por isso. Você desistiu muito rápido, muito cedo, muitas vezes. Diante de qualquer dificuldade, você preferia desistir. Desistir de mim ou de si mesmo? E, como quem acaba o jantar e pede a conta, logo estava na hora de ir embora. Eu não era como você imaginava. Talvez tenha lhe faltado a lição de que ninguém que ainda não conhecemos é como imaginamos, ninguém mesmo, pois a imaginação é muito sem imaginação – a realidade é bem mais criativa.

O amor tira cada um dos parceiros do seu lugar para que cresçam e se tornem melhores. Então chegamos a um ponto: sua vaidade. Essa, que vem te matando aos poucos. E vaidade não é o mesmo que autoestima, muito pelo contrário. Vaidade é o que as pessoas colocam no lugar vago da autoestima. Você não está disposto a mudar nada – mudar é muito arriscado, não é mesmo? Você não sabe amar. Diz “eu te amo” sem ter a menor ideia do que isso significa. Sua calma nada mais é que a falta de alma. Algo ou alguém ou episódios do passado fizeram de você uma ilha. Uma ilha deserta, não habitável, sem verde nem água nem vida. Sim, você me deu muito. Mas se esqueceu de me dar o mais precioso: o coração. Talvez tenha até tentado, mas não se pode dar o que não se tem.

Amar é bom, aquece o corpo, me faz sentir viva, me altera, me tira do lugar, me muda para melhor. Mas você não se acredita, não se enxerga, não se sente, não se mistura, não vive. Seus abraços são poucos e parcos. Seus passos são apenas em sua própria direção. Que pena que alguém lhe tirou a alma tão cedo e te fez esse fantasma vagando sem rumo e sem amor. Você se ocupa das telas da TV e do videogame para não pensar no vazio que lhe invade dia e noite.

Amo alguém que não existe, que talvez nunca tenha existido, e preciso me despedir. Não quero outra solidão para acompanhar a minha. Deixe-me só com ela, que tem muito a me nutrir.


O Senhor Deus é bom.
Em tempos difíceis, ele salva o seu povo
e cuida dos que procuram a sua proteção.

Naum 1:7 / NTLH

terça-feira, 28 de maio de 2019



“A gente sabe da importância da luz, no momento em que a gente está no escuro.”


“Após alguns coices a gente aprende a domar os cavalos. 
Ou abandoná-los, se for o caso.”

__Letícia Palmeira



A vida é um sopro...
E a morte é como uma avalanche na vida de alguém.
Inesperadamente ela atravessa a vida interrompendo um ciclo.

Já pararam pra pensar que hoje pode ter sido o último dia de alguém?
Que hoje pode ser o último dia até mesmo pra você?

É duro de ouvir!
É assustador de saber.
Mas é verdade.

Hoje pode ter sido o último dia para tantas pessoas.
E isso só nos faz pensar o quanto somos frágeis.
E o quanto não somos donos nem da nossa própria vida.

Nós planejamos mil coisas para o futuro, mas não somos donos dele.
O futuro não pertence à nós.

Por isso ame hoje!
Valorize hoje!
Viva o hoje como se fosse o seu último dia, porque uma hora ele vai ser de verdade!


Jesus disse:
— Não fiquem aflitos. Creiam em Deus e creiam também em mim. Na casa do meu Pai há muitos quartos, e eu vou preparar um lugar para vocês. Se não fosse assim, eu já lhes teria dito. E, depois que eu for e preparar um lugar para vocês, voltarei e os levarei comigo para que onde eu estiver vocês estejam também.

João 14:1-3 / NTLH

quarta-feira, 22 de maio de 2019


#dia do abraço

terça-feira, 21 de maio de 2019


“Quando sabemos que amamos?
Quando somos capazes de querer para o outro o mesmo bem que queremos para nós.”

brigando direito


Um dos personagens jornalistas do seriado “Newsroom”, diz para a sua colega de trabalho que vive se separando do namorado: “Vocês precisam aprender a brigar direito”.

É um conselho que deveria ser levado para o ouvido do noivo e da noiva ao pé do altar: aprender a brigar direito é reduzir os danos e evitar as rupturas (e desgastantes reconciliações).

Briga boa é discussão curta, sem tempo para envolver outras pessoas e com espaço reduzido para não produzir ressentimentos. É falar o que feriu, explicar o ponto de vista, ouvir o contraponto, acolher as desculpas e seguir em frente, sem o risco de retaliações e excessos. Dependendo do que aconteceu, um longo telefonema ou um chimarrão ao entardecer resolve a pendenga.

Briga boa é aquela que não sai de casa, permanece dentro do círculo do relacionamento, a portas fechadas. Não vira cobrança, sermão e dívida. Mágoa longa sempre gera fofocas e opiniões incontroláveis de terceiros.

Briga boa não deve ultrapassar 24h, pois o mal-estar faz vítimas rapidamente. Nem todos têm paciência para ruminar desentendimentos. O suspense pela paz desperta o pessimismo nas almas amorosas. É duro controlar a ansiedade. O tema só chegará ao terapeuta depois de passar pela comunidade inteira.

O ideal é ter simplicidade para falar o que incomoda, não dependendo de conversas sérias e avisos de despejo.

Saber brigar é solucionar o impasse procurando as palavras certas, respirando fundo, prevenindo-se das agressões gratuitas, cuidando para não recorrer a afastamentos.

Ao banalizar o término, estará abrindo caminho para chantagens cada vez mais pesadas.

Briga boa significa preservar o seu par de algumas ofensas. Ultimatos são perigosos e costumam ser aceitos no momento de raiva. Desaconselhável desafiar a sua companhia com o fim – apressando a chance de ela fazer as malas.

Afinal, na gritaria, é o orgulho que manda, jamais o amor.

Briga boa é manter o foco de tudo o que é vivido a dois, e não apenas sublimar um momento ruim. Acima de tudo, cabe a delicadeza de trazer o contexto do romance à tona, o dia anterior, a sequência da intimidade. Fica mais fácil compreender a falha diante do conjunto da obra.

Ninguém está livre do erro, do engano e da distração. Brigas são desabafos. Não distorça a sua natureza catártica para um desproporcional acerto de contas.

Briga boa é, depois de reclamar, devolver a esperança com um beijo e um abraço apertado.



Quem não castiga o filho não o ama. Quem ama o filho castiga-o enquanto é tempo.

Provérbios 13:24 / NTLH

segunda-feira, 20 de maio de 2019

cavalheirismo não é crime


Eu abro a porta do carro para a minha esposa. Eu puxo a sua cadeira para que sente. Eu seguro o guarda-chuva. Eu caminho no lado de fora da calçada. Eu peço licença para falar. Eu deixo ela provar o vinho para depois me servir. Eu dou a passagem para ela numa escada ou numa porta. Eu só começo a comer quando ela começar. Eu não a deixo esperar, chego sempre adiantado. Eu não tomo nenhuma decisão sozinho, pergunto primeiro o que ela deseja. Eu me interesso em saber qual a roupa que devo vestir para ocasiões especiais. Eu ofereço o meu casaco quando cai a temperatura.

Essas atitudes não são machismo, mas educação. Não abro mão das gentilezas tradicionais, pois a amo e a respeito como prioridade em minha vida - é natural pensar no bem-estar dela antes do meu conforto. 

Não faço porque ela é frágil. Aliás, faço porque o amor é frágil.

Não devia fazer propaganda, mas Neckyr é assim!




Fiquei sem entender. Há alguns anos diziam que a vida começava aos 40. E agora li em uma manchete que a fulana “até que está muito bem para quem tem 40 anos e dois filhos”. Esse muito-bem-pra-quem-tem-quarenta me deixou embasbacada, quem vê pensa que os quarentinha são oitenta.

Todo mundo quer ser bonito e eu acho isso saudável, é um empurrãozinho na autoestima. Mas até que ponto as pessoas são vaidosas e em que momento passam a cometer excessos em prol da beleza?

Meninas comem somente uma folha de alface e um pepino em conserva por dia e tomam vários remédios para emagrecer, pois precisam estar dentro dos padrões que a novela das oito mostra todos os dias. A sociedade é cruel com as mulheres: você precisa ser que nem as outras. E as “outras” estão nas revistas, nas passarelas, na televisão. Mas ninguém pensa que esse grupo de mulheres vive exclusivamente para isso.

A mídia vende e explora o belo. As pessoas acabam esquecendo o que são de verdade, pois buscam freneticamente “o nariz da modelo da capa da revista”. Ninguém entende que para aparecer na revista existe todo um processo nos bastidores e que uma mulher de cara lavada não é a mesma que estampa a capa de uma revista. As pessoas ficam mais bonitas e atraentes quando bem maquiadas e penteadas. E, como não poderia deixar de ser, photoshopadas.

Não acho errado, gosto de ver gente bonita, você também deve achar bom. Mas eu gosto – e muito – de gente real, de verdade. Deve ser por isso que gostei bastante daquela Campanha pela Real Beleza, da Dove. Mulheres comuns posaram com roupas íntimas sem nenhum retoque ou maquiagem. E elas tinham quilinhos a mais. Muita gente criticou a campanha, levantando uma questão: o que as pessoas gostam de ver? Gente bonita, alta, magra, com cabelos esvoaçantes e roupas que fazem o estilo isso-só-funciona-na-passarela?

Eu sei que vivemos numa busca – que beira a perseguição doentia – constante pela beleza. Não critico, também vivo. Só não é saudável destruir a saúde. E esquecer quem somos de verdade – sem salto alto e chapinha no cabelo. Bonito mesmo é ser natural. E se sentir à vontade dentro do próprio corpo.


Não seja vingativo; confie em Deus, o Senhor, e ele fará justiça a você.

Provérbios 20:22 / NTLH

domingo, 19 de maio de 2019


#dia do físico

quinta-feira, 16 de maio de 2019



Homens e mulheres possuem maneiras distintas de embarcar em uma relação.
“Para o homem, o sexo é o princípio do amor”.
“A porta da percepção do amor para a ala masculina, é o sexo. Ou seja, ele ficará com quem ele realmente amou se relacionar. Já a mulher pode dar o maior voto de confiança e se apaixonar, não através do sexo, mas pela gentileza, pelo cuidado, pela amizade, pelas outras demandas emocionais”.

Em tempos de extrema pressa e desatenção, “precisamos reaprender a segurar a mãozinha, a olhar nos olhos, a não atropelar o silêncio, a fazer cafuné. Pouquíssimos realizam bom cafuné. Tem casais que não sabem fazer massagens nos pés; tem casais que não sabem coçar as costas um do outro”.

Seja nos biscoitos da sorte, nas frases de facebook ou nas linhas tortas da palma da mão que a cigana da esquina traduz com seu braile místico, a fidelidade é assunto em alta. 

Mas quase sempre a lealdade acaba ficando de fora da conversa. Será medo de saber realmente o que o outro pensa? De exercitar o ato de ouvir o outro, principalmente quando as notícias e confissões tendem a não ser tão animadoras quanto esperamos? A impressão que fica é de que a fidelidade é seletiva em seus parâmetros.

“As pessoas não colocam a lealdade junto da fidelidade porque a lealdade é muito mais difícil de ser exercida. A lealdade é dizer o que está pensando, o que está querendo, onde quer ir, se está feliz ou não”.

“Lealdade é expor nossas intenções. A fidelidade é apenas proteger as nossas intenções a dois. Ou seja, de repente alguém não trai, mas passa a relação inteira sendo desleal. Lealdade é prestar contas diariamente, do que somos, do que queremos ser e nunca abdicar das confidências, dos segredos, da conversa permanente”.

Gosto de usar a metáfora fidelidade como jardim, como fachada da casa. Já a lealdade seria como o fundo dela, algo que não se vê.

“A lealdade é amar quando o outro não está nos enxergando”.

Em suma, com toda a problemática que envolve os romances virtuais e práticos, “é preciso ser fiel e leal na vida real e na vida virtual”.

“Não sou guru do amor. Eu sou um poeta e o poeta mora na dúvida. A dúvida traz muito mais experiência do que a certeza”.

FC em entrevista para CONTI outra

perder a vida



Estava dentro do carro, presa num engarrafamento, escutando música. Enquanto esperava o trânsito fluir, fiquei observando o céu azul e algumas árvores. O dia estava lindo e Domingos Oliveira* estava morto. Um homem essencialmente emocional, que tinha um olhar encantado pra vida, que dirigiu filmes, escreveu peças e deixou registrado em livros sua convicção de que nada é mais importante que os encontros e desencontros, os desejos e as dilacerações que caracterizam a nossa humanidade. Eu o admirava tanto, e quando ele se foi, não pensei “que perda”. Pensei apenas que ele mereceu morrer em casa ao lado das pessoas que mais amava, e que tudo havia sido um ganho, então, sem drama: só restava dizer “obrigada, Domingos, obrigada, obrigada, obrigada”.

Isso me fez lembrar o enterro do pai de uma grande amiga, falecido aos 80 e poucos anos. Enquanto baixavam o caixão, o silêncio era absoluto. Foi então que escutamos a voz grave e comovida de um garoto de 21 anos: “Obrigado, vô”. Nossa. Aquele “obrigado” continha todos os sorvetes que haviam tomado juntos, todas as brincadeiras, todos os abraços, todas as discussões, todas as idas ao estádio, todos os conselhos, toda a possante presença de um na trajetória do outro.

Serve para a morte de um parente, de um amigo, e também de uma pessoa pública que fez a parte dela para tornar o mundo mais suportável. Se ao cair do pano, ninguém tiver nada a nos agradecer, de pouco serviu ter vivido.

É só abrir o jornal, espiar as redes: esta é uma época estranha, apressada, egocêntrica. Há muita gente do bem, mas várias não se importam com a dor dos outros, elogiam pouco, não escutam nada, não colaboram para a evolução da sociedade, são implacáveis com os outsiders e nunca se perguntam: quando eu me for, deixarei uma impressão positiva sobre minhas atitudes e pensamentos?

Até um crápula pode deixar saudades numa namorada ou irmão, mas falo de algo maior. Quando você morrer, deixará ao menos uma ou duas pessoas transformadas por sua existência? Você terá feito diferença na vida delas?

Nem o dinheiro que acumulou, nem a big casa que construiu, nem seus títulos e prêmios, nem seu sobrenome, nem suas postagens, nem sua pele sem rugas, nem as festas, nem a fama, nem seu passaporte megacarimbado, nada, nada, nada disso vai sobreviver. Nossa vida pode ter sido preenchida por muitos convites e conquistas, pode ter sido rica em experiências curriculares e sensoriais, mas só o que dá real sentido a ela é a nossa ampla e franca generosidade, é a visão amorosa e humanista sobre tudo o que nos cerca, é o esforço em deixar o mundo um pouco melhor do que quando aqui chegamos. 

Se não merecermos um “obrigado” verdadeiro no final, aí sim pode-se dizer: que perda. Nossa vida terá sido em vão.

* Domingos Oliveira, cineasta, diretor de teatro, 
roteirista, dramaturgo e ator, 
faleceu, aos 82 anos, no dia 23/03/2019


As palavras do falador ferem como pontas de espada, mas as palavras do sábio podem curar.

Provérbios 12:18 / NTLH

domingo, 12 de maio de 2019



Feliz dia a todos os tipos de mães!

mães postiças


Estereótipos precisam ser revisados de tempos em tempos. O da madrasta má felizmente está com o prazo de validade vencido, mas ainda assim pouco se fala no modelo que a substituiu: o da madrasta boa gente, aquela mulher madura que não tenta substituir a mãe de seus enteados e sim contribuir para que eles se sintam emocionalmente amparados.

Muitas madrastas são mães: tiveram seus próprios filhos no primeiro casamento e, entrando numa segunda relação, se depararam com a experiência de conviver com os filhos de seu novo marido. Não é uma tarefa mole, pois são crianças ou adolescentes que passaram pelo trauma da separação dos pais e não estavam exatamente ansiosos para ver uma nova pessoa entrar para a família.

A atual mulher do pai chega sempre como uma intrusa, mas havendo bom senso na distribuição dos papéis, logo ninguém se sentirá ameaçado e o novo núcleo se forma: os meus, os teus e, quem sabe, os nossos - no caso do novo casal querer ter um filho em comum. Até aí, tudo certo, é um arranjo equilibrado. Mas tenho pensado naquela mulher que sempre sonhou em engravidar e ser mãe, que alimentou esse desejo desde garota, e que um dia conhece o homem da sua vida: um cara que já teve os filhos que gostaria durante o primeiro casamento e que não cogita ter mais um. “Como não cogita? Que egoísta!” podem bradar algumas colegas de auditório, mas, convenhamos, um homem de meia-idade talvez não deseje um novo bebê.

Algum direito esses pobres portadores de cromossomos XY ainda têm. A mulher talvez pegue sua bolsa e vá bater em outra freguesia para realizar o sonho de ser mãe biológica — e deve fazer isso mesmo, caso não tenha a menor vontade de se adaptar às circunstâncias.

Mas se ela resolver ficar com este homem, poderá transferir todo seu potencial de afeto para os filhos do seu grande amor, não a fim de ocupar o espaço da mãe deles, mas a fim de inaugurar um novo espaço para si mesma - um espaço que exigirá cuidado, paciência e muita dedicação. Não é uma maternidade legítima, mas é uma experiência familiar e sentimental que também costuma impactar a vida de todos os envolvidos.

A elas, essas mulheres que abriram mão do seu desejo ancestral de ser mãe a fim de preservar o seu ideal romântico (o de não procurar um reprodutor, e sim manter uma relação amorosa com o homem pelo qual se apaixonaram e com os filhos dele), o meu mais profundo respeito. Feliz dia das mães que, do jeito possível, vocês também se tornaram.



Ele faz com que a mulher
que não tem filhos
seja respeitada no seu lar
e a torna feliz, dando-lhe filhos.

Salmos 113:9 / NTLH

sexta-feira, 10 de maio de 2019

maternidades


Talvez o assunto esteja esgotado em termos literários. Ainda haverá o que escrever em poemas, crônicas, romances e contos sobre essa experiência transformadora e inigualável, para algumas deslumbrante, para outras apenas inconveniente, assustadora ou trágica? Haverá ainda algo que não se conseguiu descrever em todos os livros do mundo? Por outro lado, essa experiência tão diferente para cada uma, que pode ir de êxtase e euforia a amargura, tem sido objeto de milhares e milhares de esforços para reproduzi-la em frases faladas, escritas, cantadas, por toda parte – talvez desde sempre.

Acho que não há muito mais a dizer, e raramente escrevo sobre datas. Mas esta me agrada, e, sim, gosto do Dia das Mães. Gosto de qualquer celebração que renove nossos pensamentos e emoções. Comercialização de sentimentos? Só pra quem leva a vida como consumo, mede amor pelo gasto e precisa, quem sabe, encobrir suas culpas com visita, telefonema ou presente.

Na vida dita normal (sem discutir o que é isso) nas relações amorosas, entre as quais a de mãe e filhos se inclui, claro, nem tudo é dramático e transcendental. Quase sempre fica entre aquele curativo e beijo na hora do joelho esfolado, noites sem dormir junto da criança doente, colo na hora do coração partido, risadas juntas nas aventuras cotidianas, segredinhos bem guardados, olhar vigilante procurando não intervir nem aborrecer, amor desmedido querendo não oprimir. Mais a chatice inevitável “bote o casaquinho, não fale de boca cheia, não bata no seu irmão, respeite os outros, volte cedo, olhe com quem anda saindo, se cuideeee!!!”. O mais difícil: corrigir sem humilhar, proteger sem enfraquecer, estimular sem iludir. (E ainda tem aquela culpa obtusa que nos assalta mesmo se o filho quebra o pé escalando o Everest: por que não cuidei dele?)

Assistir (discretamente) aos voos que se pode divisar, no resto rezando e torcendo, e sendo otimista: a cria vai dar certo, seja lá o que isso signifique. Não vai quebrar demais as asas e a cara, não vai sofrer demais, vai ser um ser humano decente e bom, e bem-sucedido nas suas escolhas, sejam de profissão, de parceiro, de modo de vida. A gente recebendo um telefonema, um whats, uma visitinha, pra se certificar de que afinal está tudo bem – e ficar feliz da vida.

Mas há as maternidades atormentadas: filho doente, filho viciado, filho perseguido, filho acidentado, assassinado, filho fazendo escolhas negativas, filho precisando de coisas que não se pode dar porque o dinheiro não chega, enfim, filho sumido no mundo ou na morte. Isso, não há palavras que expliquem, então sobre isso me calo, por profundo respeito.

Termino com minha tripla experiência de maternidade: euforia e assombro, cada vez que de mim saiu um ser humano, uma pessoazinha – e a cada vez pensei e disse em voz alta, sem querer: “Mais uma pessoa no mundo”.

Isso me impressiona e comove até hoje: cada um é uma pessoa, com sua personalidade, suas decisões, sua vida, sua morte. Pouco vou poder interferir. Procurar não estorvar já é difícil. Mas posso fazer com que saibam que, seja como for, onde, quando, a mãe vai estar sempre do seu lado, muitas vezes sem entender direito, muitas vezes desajeitada, muitas vezes impotente, mas, inteiramente, um colo, um abraço, e um amor que nenhuma palavra de nenhum idioma poderia definir.

quarta-feira, 8 de maio de 2019


terça-feira, 7 de maio de 2019


#dia do oftalmologista

mãe porta-de-cadeia



Quando o filho enfrenta um divórcio, a mãe quer sofrer mais do que ele.

Ela não lamenta que ele está sofrendo, ela destaca que ela está sofrendo muito.

Em vez de tranquilizá-lo, trata de acentuar o desespero.

- Eu não merecia passar por mais esta infelicidade!

Realmente acredita que o desenlace atingiu sua honra.

Exagera o drama, potencializa a tragédia, classifica um simples desentendimento como impasse diplomático.

Como o filho não esclareceu o que ocorreu, justamente com medo da fofoca, ela tem toda a liberdade para inventar os fatos e concluir por conta própria.

Daí joga a pá de cal no romance. A ex acreditará que ele meteu a língua nos dentes quando, na verdade, nem abriu o bico. A mãe enterra a nora viva. Se possível, com a sogra junto.

A difamação partirá da imaginação materna sem limites, feita na melhor das intenções. Cola pedaços de conversa, gruda insinuações e emite um veredito arbitrário do fim do amor.

Converterá o luto do filho, sua discrição triste e silenciosa, seu acanhamento reflexivo, em programa de auditório.

Como ele não pode se defender de nada, muito menos dela, abusa do microfone.

Aproveita o momento em que ele não tem condições de falar para falar por ele. Atende ao telefone, caminha no bairro, conduz eventos familiares como a porta-voz recém-empossada do divórcio.

O porteiro do prédio será o primeiro a saber - pois o porteiro do prédio é o marido espiritual da mãe solteirona.

Ela não deixa esfriar a ruptura, não permite tempo das pazes, um intervalo para cicatrizar as feridas, faz questão de incendiar o resto para que os dois nunca mais voltem.

Não oferece paz e sossego, e sim escarcéu e suspeita

Põe o remédio na língua no instante de narrar o episódio, diz que não vai aguentar, chora pela família destruída, ainda mais se tem criança no meio.

Separação dos filhos para as mães é melhor do que morte, já que não têm que pagar enterro.

Ela conta para o mundo inteiro que o filho se separou, explica aos amigos os capítulos do dia anterior da novela, recebe as condolências em nome dos envolvidos. Não cumprimenta mais direito as pessoas, já sai informando: - Bom-dia, meu filho se separou...

Estraga qualquer reconciliação criticando a ex-mulher, sugerindo que o filho foi corneado. Não dá para entender como toda mãe torce para que o filho seja corneado. É uma adoração pela hipótese da infidelidade, quando na maioria das vezes não é o caso. Propaga a teoria com objetivo de comprovar de que nenhuma mulher mais presta, somente ela.

É a mãe porta-de-cadeia. O filho errou, pisou na bola, infernizou a vida da outra, mantinha amante, mas será sempre um santo, um injustiçado pelo amor.

Na hora de se separar, pense no poder de fofoca de sua mãe. Com certeza, ajudará muito a permanecer casado.