terça-feira, 31 de março de 2020
há outros pássaros cantando na janela
Para conservar a
esperança, temos que defender os ouvidos, não somente escutar os grasnidos de
urubus e corvos. Há outros pássaros cantando lá fora e dentro de nossa memória.
Precisamos revezar a
audição com o curió, o canário, o sabiá, o pardal, o rouxinol, o mateiro, o
pintassilgo pelas janelas de nossa alma. Todo amigo é uma ave cantando
diferente.
Que usemos o tempo
sozinhos para melhorarmos as nossas relações, corrigirmos as omissões e os
lapsos pelo excesso de trabalho, dedicarmos com mais afinco à educação de
nossas crianças, revisando os seus desenhos e jogando juntos algum tabuleiro da
nossa infância.
Como disse padre Fábio de
Melo, não estamos isolados, mas protegidos.
A proteção é ninho
aquecido de afeto, uma chance de reabastecimento emocional para retornarmos à
labuta mais convictos de nossas aspirações. Cuidar dos ouvidos é evitar o
bombardeio pessimista da atualidade. Não ser alienado, mas alternar os fatos
tristes com ações edificantes presentes no nosso cotidiano.
Não permanecer exclusivamente
no celular assistindo e partilhando vídeos apocalípticos, soma de infectados e
mortos, numa contagem regressiva até chegar a um familiar ou a um conhecido.
Que retiremos o pânico da pandemia. Não há como ser feliz sob ameaça constante.
O jeito de apequenar o
medo é procurar interagir com as melodias caras de nossa vida: a voz dos pais,
dos filhos, da esposa, dos amigos. Fazer perguntas de como eles nos enxergam,
se estamos sendo presentes ou não. Ouça como os demais o percebem, é importante
o ponto de vista externo para construir a nossa imagem.
Aproveite a quarentena
para autocrítica, para o trabalho permanente de se aperfeiçoar, de ser gentil
sem segundas intenções. Gargalhe com bobagens, faça mais piadas e memes com
aqueles que estão próximos de você.
Regue as plantas e
reorganize as roupas no armário, para voltar a vestir as peças que andam
esquecidas pela pressa.
Como não há como ir ao
salão, por que não brincar de manicure e cabeleireiro com o pessoal de casa?
Ler um livro para soltar
a âncora da realidade imediata e viajar para distintas épocas e contextos.
Improvisar um karaokê com
a sua playlist preferida. Cozinhar receitas da avó, para recuperar sabores
perdidos. Não se sentir culpado por se divertir. Especialmente isso. Não sofrer
de modo desnecessário é respeitar quem está realmente sofrendo.
Ocupar a imaginação
positivamente, combatendo premonições assustadoras é o remédio para a saúde
mental. Não se prender ao “se”, abolir o “se” do vocabulário, não penar por
antecipação.
Palavras amáveis são
fáceis e ficam para sempre. O canto dos pássaros é o nosso despertador
interior.
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Fabrício Carpinejar
segunda-feira, 30 de março de 2020
enfim sós
Ela mora sozinha há
muitos anos. Gosta, pois leva a vida do jeito que quer, não há ninguém em volta
fiscalizando suas manias. Mas sente uma ponta de inveja de lares ocupados por
muita gente, famílias numerosas. Preferiria ser mais requisitada, já que são longos
os seus momentos sem companhia. Já a ouvi reclamar de passar um dia inteiro sem
escutar a própria voz. Até que veio o coronavírus e obrigou o isolamento de
todos. Deixou de ser uma escolha, e sim um ato compulsório. E, para minha
surpresa, ela não reclama mais, está adorando seus dias de leitura,
introspecção e silêncio. Mas se sua rotina já era desse jeito, o que mudou?
É que agora não é só ela
que está em casa, mas toda a cidade. Ela já não é diferente da maioria de seus
amigos. A solidão deixou de ser um problema apenas seu.
É um assunto que sempre
me atraiu. Acredito que ter uma relação cordial com a solidão é a saída para
evitar perturbações mentais. Quem encara a solidão como uma terrível ameaça
acaba comprometendo suas experiências afetivas. Os vínculos se tornam
asfixiantes em vez de naturais. As relações sociais tornam-se mais obrigatórias
do que espontâneas. É difícil aceitar que as pessoas chegam, ficam e um dia vão
embora de nossas vidas. Essa dinâmica inevitável nos obriga a passar por momentos
de resguardo eventual ou prolongado, o que conduz a um encontro profundo com a
gente mesmo. Para alguns, é assustador.
Não sou nenhuma ermitã e
considero que ter amigos é sagrado. Lamento pelos que se encarceram numa
existência sem vínculos - essa, sim, uma solidão corrosiva. Bem diferente de
quem pode se dar ao luxo de passar temporadas sem contato, pois sabe que não
existe distância entre os que preservam laços vitalícios.
Muitas pessoas moram sós.
Quando a pandemia passar, voltarão a caminhar pelas ruas, ir a bares, ao
cinema, encontrarão pessoas e continuarão sós, e não há vergonha nenhuma nisso.
Sei que conviver é fundamental, um hábito que até ajuda a imunizar: ficamos
mais saudáveis ao sermos tocados, abraçados, beijados. Mas não precisamos ter
nossa vida testemunhada 24 horas por dia.
Sozinhos, agimos como
anjos. Não mentimos, não julgamos os outros, não agredimos ninguém.
“Sozinha
não há céu que me rejeite” - verso de um poema que escrevi
25 anos atrás, quando me parecia interessante esse benefício da solidão:
impedir que fôssemos uns malas. Hoje se mente, se julga e se agride pelo
Twitter, pelo Facebook. Meu verso caducou. Então aproveitemos o cativeiro para
valorizar as demais vantagens da solidão: autoconhecimento, paz de espírito,
concentração, relaxamento. E, se conseguirmos ignorar o celular (como há 25
anos, quando ele não existia), a vantagem sublime de não sermos atazanados e de
não atazanar ninguém.
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Martha Medeiros
Amar não tira pedaço, e
se tira: não é amor. Ele te ama, mas... odeia suas roupas. Ela te ama, mas...
odeia seus amigos. Vocês se amam, mas... não conseguem passar uma única semana
sem brigar.
Amar não arranca sua paz!
Te ama, mas te tira o sono, te ama, mas te tira a privacidade: te ama, mas...
Tem muito carência disfarçada de amor, muito apego fantasiado de paixão.
Amor é liberdade, e tudo
aquilo que te tira a paz, a liberdade ou o respeito: é tudo, mas... amor não é.
__Marcos Bulhões
um novo dia: a escolha é sua
Está calmo. É cedo. Meu
café ainda está quente. O céu ainda está escuro. O mundo ainda está dormindo. O
dia está vindo.
Em alguns momentos o dia
vai chegar. Virá estrondoso com o nascer do Sol. A calma do amanhecer será
trocada pelo barulho do dia. A tranquilidade da solitude será substituída pela
marcha turbulenta da raça humana. O refúgio do amanhecer será invadido pelas decisões
a serem tomadas e prazos a serem cumpridos. É agora que preciso tomar a
decisão.
Por causa do Calvário
estou livre para escolher. Então eu escolho.
Eu escolho o amor.
Nenhuma ocasião justifica ódio; nenhuma injustiça merece amargura. Eu escolho
amor. Hoje amarei a Deus e o que Deus ama.
Eu escolho a alegria. Eu
convidarei o meu Deus para ser o Deus das circunstâncias. Eu recusarei a
tentação de ser cético… a ferramenta do pensador preguiçoso. Eu recusarei a ver
pessoas como algo menos que seres humanos, criados por Deus. Eu recusarei a
enxergar qualquer problema como algo menos que uma oportunidade para ver a
Deus.
Eu escolho a paz. Eu
viverei para perdoar. Eu perdoarei para que eu possa viver.
Eu escolho a paciência.
Eu olharei além das inconveniências do mundo. Ao invés de amaldiçoar aquele que
toma meu lugar, eu o convidarei a fazer isso. Ao invés de reclamar que a demora
é longa demais, eu agradecerei a Deus por um momento de orar. Ao invés de
fechar meus punhos contra novas tarefas, eu as encararei com alegria e coragem.
Eu escolho a bondade. Eu
serei bondoso para com os pobres, pois eles estão sozinhos. Bondoso para com os
ricos, pois eles estão com medo. E bondoso para com os grosseiros, pois foi
assim que Deus me tratou.
Eu escolho ser justo. Eu
ficarei sem dinheiro ao invés de tomar dinheiro desonesto. Eu serei
negligenciado antes de me vangloriar. Eu confessarei antes de acusar. Eu
escolho a justiça.
Eu escolho a fidelidade.
Hoje cumprirei as minhas promessas. Meus credores não se arrependerão da sua
confiança em mim. Meus sócios não duvidarão da minha palavra. Minha esposa não
duvidará do meu amor. E meus filhos nunca temerão que seu pai não voltará para
casa.
Eu escolho a mansidão.
Nada é conquistado pela força. Eu escolho ser manso. Se eu levantar a minha
voz, que seja apenas em adoração. Se eu fechar o meu punho, que seja apenas em
oração. Se eu exigir algo, que seja somente de mim mesmo.
Eu escolho o
autocontrole. Sou um ser espiritual. Depois deste corpo morrer, meu espírito
irá voar. Eu recuso permitir o que vai apodrecer dominar o que é eterno. Eu
escolho o autocontrole. Eu serei embriagado somente por alegria. Eu serei
apaixonado apenas pela minha fé. Eu serei influenciado somente por Deus. Eu
serei ensinado somente por Cristo. Eu escolho o autocontrole.
Amor, alegria, paz,
paciência, bondade, justiça, fidelidade, mansidão, e autocontrole. Para estes
eu comprometo o meu dia. Se for bem sucedido, eu darei graças. Se eu errar,
buscarei a graça d’Ele. E quando este dia terminar, deitarei a minha cabeça no
meu travesseiro e descansarei.
de Max Lucado
sexta-feira, 27 de março de 2020
terça-feira, 24 de março de 2020
“Na solidão da escuridão,
quase consegui sentir a finitude da vida e sua preciosidade. Não damos valor,
mas ela é frágil, precária, incerta, capaz de terminar a qualquer momento, sem
aviso.”
Marley & eu
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enfim, a coroa
Meu marido entra na sala
sorrindo, jornal na mão: "Você ainda consegue não escrever sobre o
coronavírus?". E eu, rindo: "Nem o vírus, nem o Dia da Mulher".
O assunto mulher, porque
não aguento mais, dezenas de anos, dezenas de artigos, palestras, palavras.
Inúteis ou com alguma mínima repercussão? Nunca saberei. Crônicas se soltam aos
ventos, centenas, milhares de leitores que provavelmente amanhã não lembrarão
mais. É da profissão. O resumo do que penso não é muito simpático mas: vamos
nos respeitar, e nos fazer respeitar, e talvez... nos respeitem. Luta dura,
demorada, de preferência sem xingamento nem lamuriação. Nós, mulheres, somos
melhores do que isso.
O vírus, bem, o vírus.
Quando muitas Polianas e
malandrinhos ainda achavam graça, me chamavam de mensageira da agonia ou coisa
parecida, eu já sentia medo. Algo estranho, sinistro, estava embutido nessa
peste que logo deitaria sobre o mundo, sobre nós, sua feia sombra. Intuição,
quem sabe? Um alerta que a idade vai nos concedendo feito um chip especial? Não
sei. Sei que desde as primeiras notícias, senti medo.
Hoje, até os alegrinhos,
que anunciam que devemos cultivar alegria em nossos corações porque ela nos
salvará, começam a se remexer preocupados. Que bom se a alegria nos salvasse.
Mas, por outro lado, o desespero, a raiva e a amargura certamente nos liquidarão
junto com a doença.
Meio-termo é uma
expressão de que gosto, mas que acho difícil. Entre prudência e negligência,
entre terror e cautela, cada um de nós tem de escolher sua posição.
O que me desgosta
sobretudo: a raiva fácil com que algumas pessoas apontam o dedo, eu acuso: os
chineses, os americanos, os capitalistas, grandes laboratórios... Acho pobre,
contraproducente e irreal. Não acredito que uma cúpula de líderes de qualquer
país, ou diretores de grandes laboratórios, um dia se reunisse para cochichar
atrás de portas fechadas como poderia ferrar com o mundo. Acredito, sim, que as
doenças ocorrem porque somos humanos, porque não nos cuidamos, porque abusamos,
porque somos ignorantes - mas também porque o azar existe e às vezes predomina.
E ninguém é nem culpado, nem responsável.
Tenho medo, sim, dessa
doença, que se arrasta, bufando, sobre nós, pobre humanidade. Ninguém sabe
direito o que fazer, uns esbravejam, outros soltam bravatas, outros, ainda, nem
levantam os olhos. Todos estamos nessa rota, que para muitos será a morte, para
outros, vida com sequelas graves, mas, para a maioria, eu acho, e espero, será
pouco incômodo ou nem notar se tem, ou não, o vírus.
Sofro pelos que serão
coroados. Rezo para que ninguém seja, mas é oração de criança pedindo ao Menino
Jesus que hoje não faça noite, porque quero brincar na calçada até bem tarde.
segunda-feira, 23 de março de 2020
não somos números
Todos são iguais perante
a lei da doença. Quem não pensava assim, descobrirá com a epidemia.
Coronavírus não escolhe
suas vítimas pela classe social, credo, ideologia. Não poupará famosos, não
dará chance aos poderosos e influentes, não cederá vantagens aos artistas e
formadores de opinião, não pegará leve com presidentes e ministros.
Não diminuirá o seu
impacto se você reza ou não, se é bondoso ou não. Não se compadecerá de seu pai
ou de sua mãe velhos, de seus bebês de colo, de suas crianças pequenas, dos
asmáticos e dos diabéticos, dos hipertensos e depressivos.
Não analisará a sua ficha
corrida, seus antecedentes, seus pecados, suas omissões. Não recuará por
palavras bonitas e promessas de redenção.
Não avaliará o tamanho de
suas redes sociais, não consultará o seu extrato bancário.
Não pedirá licença, e nem
sempre avisará que chegou em seu corpo.
Ele não tem olhos, não
tem boca, não tem ouvidos, não tem capacidade de discernimento e julgamento. É
um animal implacável, vai acumulando baixas em sua guerra suja.
E só cresce pela
desinformação, quando você acha que a doença é um exagero da mídia, que a
quarentena é dispensável.
E só cresce pela cultura
do medo. Pois o medo não pensa, é egoísta, passa por cima de tudo, devasta as
prateleiras dos supermercados e das farmácias para apenas ter privilégios.
Enquanto não é encontrada
a vacina, o único antídoto do vírus é a empatia: usar somente o que precisa,
viver com o que é fundamental.
Ainda em condições
adversas, ainda que isolado, preocupar-se como o outro está. Cuidar de si e de
quem sequer conhece, pelo simples fato de ser morador da mesma cidade.
Fortalecer os amigos com
a saudade e as lembranças dos dias felizes. Manter a doçura da voz. Converter a
fragilidade em delicadeza. Renovar o poder e o significado da esperança.
Não deixar jamais que as
particularidades das pessoas sejam transformadas em números impessoais de
infectados e de mortos.
As ruas estão vazias, que
o coração permaneça cheio.
Qualquer perda é
importante, qualquer vida é valiosa, o vírus nunca se importou com ninguém para
entender a força do apego, a força do amor.
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Fabrício Carpinejar
🌸Mateus 10:16
@diariocomdeus_
O mundo está em convulsão,
a maioria das pessoas está ansiosa e aterrorizada com essa crise global de
saúde.
O medo, isolamentos,
incertezas, eventos culturais e esportivos cancelados, ruas vazias, escolas,
comércio, fronteiras fechadas, companhias aéreas obrigadas a suspender seus vôos,
bolsas de valores despencando.
É o caos instalado e
aquilo que se limitava oficialmente a um País muito distante, agora chega ao
Brasil e está próximo de nós.
E, diante de situações
como essas, vemos nossa fragilidade.
Não importa a raça, a
cor, condição social, religiosa, política.
TODOS estão sujeitos a
essa pandemia.
A Bíblia diz, em
Eclesiastes 9:12, que tudo sucede igualmente a todos, inclusive a possibilidade de
ficarmos doentes.
É bom lembrarmos que a fé
nunca despreza a prudência (Mateus 10:16).
Dessa forma siga as
recomendações de prevenção do Ministério da Saúde e das autoridades.
Seja responsável e
diligente nisso. Zele por você e pelos outros!
Isso faz parte do AMOR ao
próximo.
Deus tenha misericórdia
de nossas vidas e nos proteja!
Amém!
sábado, 21 de março de 2020
#fique por dentro:
O dia nacional da poesia
era em 14 de março, no aniversário de Castro Alves. A partir de 2015, foi sancionada a lei
13.131, que mudou a data para o aniversário de Carlos Drummond de Andrade em 31
de outubro. Ou seja, agora o dia nacional da poesia é em 31 de outubro.
O dia mundial da poesia é
em 21 de março. Criado pela UNESCO, em 1999.
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Mulherde30,
Tirinhas
sexta-feira, 20 de março de 2020
quinta-feira, 19 de março de 2020
essa mensagem foi apagada
Tenho certeza de que já aconteceu de você
começar a discar um número (na época do telefone discado) e desistir antes de
completar a ligação. “Não, não vou ligar agora, é tarde, vou deixar pra amanhã”.
Também já deve ter escrito uma mensagem por
e-mail e deletado antes de enviar. “Ih, bebi demais, vou acabar me arrependendo
de ter escrito isso”.
Em uma noite de sábado, ficou dentro do carro
estacionado na frente do prédio de alguém, pensando: “Entro ou não entro?”.
Saiu do carro, caminhou até o painel do porteiro eletrônico, chegou a
posicionar o dedo em direção ao número do apartamento desejado e pensou: “E se
ela estiver com outro?”. Voltou para o carro, deu a partida no motor e sumiu na
escuridão, sem saber que ela estava sozinha e que, se você tivesse tido a
coragem de se anunciar pelo interfone, o destino de vocês teria sido
espetacular. Seu banana!
Ela nunca soube. Ninguém nunca soube das
nossas desistências. Aquela vez em que quase entramos na sala do diretor para
pedir demissão, mas recuamos. A vez em que quase tentamos o suicídio, mas
caímos na real antes de fazer a besteira. E mais uma tonelada de “quases” que
também fizeram parte da nossa história, mas de que os outros não foram
informados.
(Fiquei imaginando agora que meu personagem,
aquele que voltou para o carro, deveria se declarar para a moça do apartamento,
mesmo com 20 ou 30 anos de atraso - seria uma cena poética, ainda que nada se
possa fazer com um amor desperdiçado).
Mas não é sobre poesia essa crônica. É sobre
sadismo essa crônica. Chegamos ao assunto: qual a razão de o WhatsApp comunicar
que uma mensagem foi apagada? Ora, se a pessoa se arrependeu do que enviou, ela
apaga discretamente e fim, encerrado o assunto. Qual a vantagem de o
interlocutor ser avisado de que alguém desistiu do que escreveu pra você?
Sadismo. Você nunca saberá se a pessoa apagou porque cometeu um atentado contra
a ortografia, ou porque se deu conta de que estava num grupo onde havia alguém
que não poderia ler aquilo, ou porque fez um comentário político e estremeceu
ao lembrar a enxurrada de agressões que receberia. Animal! Demente! Ignorante!
Vá que não estivesse num dia bom para lidar com o linchamento usual. Melhor
não. Nada de política hoje.
Essa mensagem foi apagada.
Qual a bomba que terá sido desativada a tempo?
Por alguns minutos, ficamos especulando. Uma traição seria denunciada. Viria
uma fofoca daquelas. Uma foto que faria o governo cair. O pedido de perdão que
tanto aguardávamos. Um nude! Claro, um nude é bem provável. A mensagem não
teria sido apagada por causa de um simples erro de digitação, certo que era uma
obscenidade das boas - e que nunca adivinharemos. Sadismo, WhatsApp, sadismo.
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Martha Medeiros
quarta-feira, 18 de março de 2020
salvo pelo atraso
O Zé andava esgotado,
pudera. Nas últimas décadas, o mundo parecia ter virado de cabeça pra baixo.
Quando ele era criança, seu pai saía para trabalhar e sua mãe ficava em casa
cuidando dele e dos irmãos. Zé conhecia poucos negros, e fazia piadinhas sobre
eles sem ninguém se importar. Quando se tornou um rapaz, logo descobriu que
havia as garotas pra transar e as garotas pra casar. Todos tinham a família
ideal, a vida ideal. Quem inventou de mudar o rumo dessa história?
Zé não imaginava que
seria tão cansativo acompanhar as mudanças de costumes. De repente, tinha que
reconsiderar o valor dos negros, respeitar todas as mulheres, se
responsabilizar pela poluição do ar e dos mares, aceitar que um homem se
apaixonasse por outro homem, que uma esposa não quisesse ter filhos e que
filmes sobre prostitutas não fossem pornográficos. Mais 10 anos nessa toada,
corria o risco de virar um cara civilizado. Ainda bem que foi salvo a tempo.
Pronto, pronto. Ninguém
mais vai obrigar o Zé a evoluir.
Zé pode continuar com
seus preconceitos, não será mais incomodado. Não precisa nem mesmo ocultá-los.
Está autorizado a dizer tudo o que pensa, sem se importar se vai ofender,
constranger, humilhar alguém. Tampouco precisa falar e escrever direito, quem
dá bola pra isso? Só uma coisa importa: a economia. Dinheiro no bolso. Virá.
Prometeram. Por enquanto os investidores estrangeiros sumiram, o dólar
disparou, mas as reformas foram feitas, é sentar e aguardar. Deixa o homem
trabalhar.
Enquanto o Brasil não
vira uma superpotência, o Zé passa as horas livres jogando sinuca, conversando
sobre baboseiras, atirando em quem mexe com a patroa (ou na própria patroa, se
ela quiser se mandar), dando uma coça nos filhos que não forem “ideais”,
acreditando que a vida é o que acontece até o limite do muro do seu quintal.
Livros? Ciência? Pesquisa? Patrimônio histórico? Cultura? Conhecimento?
Educação? Servem pra nada. Zé frequenta a Igreja e deixa lá 10% do seu salário,
a pedido dos pastores, que falam em nome de Deus. É suficiente pra garantir seu
futuro.
Zé está dando uma banana
para quem não concordar com ele. Não precisa mais saber se comportar. Pode
saudar em público um torturador, pode adotar a filosofia nazista como sendo
dele, pode distribuir medalhas a assassinos, pode espalhar fake news, pode
falar besteira, pode rejeitar esse mundo moderninho que tentam lhe enfiar goela
abaixo. Não tem mais nenhum motivo para ser culto ou bem informado. O exemplo
vem de cima, ele agora tem em quem se inspirar.
Um alívio para o Zé. Em
vez de avançar, se instalou no limitado universo da ignorância e da
mediocridade, e nunca foi tão feliz. Bendita hora que Cazuza provocou: Brasil,
mostra tua cara.
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Martha Medeiros
terça-feira, 17 de março de 2020
Pela primeira vez eu vejo
a humanidade com medo. Um vírus foi capaz de por todo o planeta em uma luta
igual: sobreviver!
O COVID-19 foi capaz de
cancelar eventos milionários, parar todos os esportes, cancelar eventos,
derrubar a economia, e mostrar para todos como somos iguais: frágeis!
O vírus infectou; negros
e brancos, pobres e ricos, famosos e desconhecidos, gays e héteros: humanos!
A quarentena (pela
primeira vez na história) fechará escolas e trabalhos, e todos precisaremos
pela primeira vez nos afastar: para se unir!
Pela primeira vez na
história a distância significará presença! Desta vez precisaremos dos nossos
celulares, para desejar força, para sentir-se seguro, para não nos sentirmos
tão sós!
Talvez isso passe, talvez
seja o fim, talvez descubram a cura amanhã.
Mas hoje, precisamos
ficar nas nossas casas, e colocar as nossas diferenças em quarentena, pelo bem
da humanidade, pelo bem de quem amamos, pelo bem de quem detestamos!
Pelo bem da história
humana!
Juntos passaremos por
isso.
A distância nunca diz
tanto, quando a sobrevivência diz mais.
__Marcos Bulhões
“Quanto antes nos
afastarmos, antes nos abraçaremos de novo.”
Você pode não ser
solidário, mas o coronavirus é. Não vê cara, cor, classe social, nacionalidade
ou posição política. Pra ele todos são iguais, basta um espirro, uma tosse, um
aperto de mão, um bocado de gente reunida e lá vai ele, lutar pela sobrevivência
a qualquer custo, venha de quem vier.
Você pode não ser empático, e o
coronavirus também não é. Mas, mesmo que você não se importe, a contaminação do
outro afeta você, reduzindo a distância entre você e o coronavirus.
Você pode
ser a favor do presidente a ponto de achar necessário ir às ruas manifestar
isso em comboio, ignorando qualquer perigo, qualquer ciência, qualquer saber
acima do seu não saber. O coronavirus também não quer nem saber. Estará ali,
entre os manifestantes, mesmo não sendo a favor de ninguém além de si mesmo – e
nesse ponto o coronavirus parece você. A diferença é que o coronavirus não pega
coronavirus. Você, sim.
Pra ele, quanto mais gente contaminada, melhor.
Pra
você, que acha que o coronavirus é só uma gripe, saiba que para 20% das pessoas
ele não será. Só que não será você quem vai escolher se fica entre os 20 ou os
80% que passarão pelo coronavirus sem maiores problemas. E, se você estiver
entre esses 20% que precisam de atendimento hospitalar, pode ser que, por causa
de você, que não está nem aí pra ninguém, e foi às ruas manifestar,
desconsiderando esse virus bobo, muito mais gente tenha se contaminado e esteja
também entre os 20% que precisam de hospital, como você. Ou como o seu avô, ou
como a sua tia, que tem diabetes. E pode ser que não tenha lugar no hospital
pra você, e nem pro seu avô, nem pra sua tia. E aí será tarde demais pra
repensar.
Então, enquanto há tempo, faça a sua parte.
Evite sair de casa. Faça
home office. Cuide dos idosos e pessoas do grupo de risco.
O importante não é
só não ser contaminado, mas fazer a sua parte para reduzir a velocidade da
disseminação do virus.
Lave suas mãos várias vezes ao dia, com atenção.
Lave
suas mãos no sentido literal, mas não no sentido figurativo.
O coronavirus é
problema seu.
E também problema meu. De todos nós.
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Cris Guerra
Outro dia li uma frase
que dizia mais ou menos assim: “Não trate como prioridade quem só te trata como
opção”, e fiquei pensando nos amores rasos que de vez em quando vejo por aí.
Tenho visto muita relação
desigual, e por mais que um dos lados viva de esperanças, na expectativa
infantil de que tudo pode mudar num piscar de olhos, é preciso enxergar os
fatos como eles são.
Já ouvi muito a história:
“A gente não escolhe quem vai amar”, mas será que é isso mesmo? Será que não
podemos escolher o que fazer de nós mesmos quando estamos amando?
Nem sempre o coração está
certo, e podemos entrar numa “canoa furada” pela simples dificuldade de sermos
amorosos com nós mesmos.
Amor nenhum deveria doer.
Amor nenhum deveria impor angústia e sofrimento. Amor nenhum deveria fazer você
duvidar se o outro sente amor e alegria na sua companhia.
Acredito sim que a gente
escolhe quem amar. E muitas vezes repetimos erros porque não aprendemos a ser
gentis e generosos com aqueles que deveríamos colocar em primeiro lugar: nós
mesmos.
Apaixone-se por alguém
que adore a sua companhia e escolha estar com você sob o sol forte ou embaixo
de uma chuva fria. Alguém que sinta a sua falta e demonstre que precisa do seu
abraço a qualquer hora do dia.
Apaixone-se por alguém
que goste do seu cheiro, que aprecia suas ideias e admira suas atitudes. Alguém
que não titubeie ao andar ao seu lado nem tenha a intenção de guarda-la só para
si.
Apaixone-se por alguém
que assuma que lhe ama, alguém que tenha orgulho de ter sido cativado por você.
Apaixone-se por alguém
que valorize seus gestos e escute sua opinião. Alguém que lhe queira sempre por
perto, e que sinta saudades se você demora.
Apaixone-se por alguém
que lhe dê segurança, alguém cujas atitudes dizem mais que mil “eu te amo”
recitados da boca pra fora; alguém que faça valer a pena, pois sabe que não é
todo dia que é possível encontrar alguém como você.
Apaixone-se por alguém
que ame a sua risada e queira ter consigo todas as suas manias; alguém que lhe
enxergue como uma pessoa especial e não vacile na hora de ter você como
companhia.
Apaixone-se por alguém
que releve suas variações de humor e se divirta com sua euforia; alguém que
segure forte a sua mão numa turbulência e comemore as vitórias com alegria.
Apaixone-se por alguém
que não tenha medo de se comprometer e amar; alguém que não tenha dívidas nem
dúvidas, e que esteja disposto a fazer do encontro de vocês uma história
especial.
Apaixone-se por alguém
que não desista de você quando faltar grana, quando a receita daquela torta der
errado, quando você passar mal, quando uma briga boba afastar vocês dois.
Apaixone-se por alguém
com quem você não precisa insistir para ficar; alguém que deseja estar ao seu
lado por vontade e prazer; alguém que tenha a definitiva certeza de que fez a
escolha certa ao querer você…
Fabíola Simões
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