"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



terça-feira, 27 de novembro de 2018

outra pessoa em casa



Volta e meia deparo com estatísticas de pessoas que moram sozinhas. Não lembro os números exatos, mas sei que são elevados. Jovens que deixaram suas cidades para estudar, idosos que viram a família seguir o rumo sem eles, homens e mulheres que se divorciaram, que enviuvaram ou que nunca se casaram, enfim, gente que, por escolha ou contingência, hoje habita só. Talvez um cão ou gato atenue a ausência de companhia, mas o fato é que não há outra pessoa na casa.

O rádio acaba virando a outra pessoa na casa.

Essa frase impactante eu pincei do livro da Katia Suman, que acaba de lançar as memórias da Ipanema FM, revelando os bastidores do estúdio em que trabalhou por tantos anos e nos ajudando a entender como uma rádio com equipamento precário, poucos funcionários e muito improviso conseguiu, de 1984 a 1997, conquistar ouvintes fiéis que interagiam diretamente com os locutores e que se sentiam representados por aquela bagunça pulsante, criativa, descolada. Uma turma independente que colocava no ar a nova cena musical e cultural do extremo sul do país. Fez história, logo, merece ser contada.

O rádio como meio de comunicação já teve sua extinção prevista “n” vezes, mas seu obituário continua adiado. Veio a tevê, veio o computador, vieram os home theaters, os celulares inteligentes, e que fim levou o rádio? Segue firme e forte no meio rural e urbano, no interior e na capital, tocando música, dando as horas, noticiando, informando, transmitindo futebol, debates, fazendo humor, promovendo encontros - sendo a outra pessoa dentro da casa enquanto lavamos a louça ou tomamos banho.

Sem imagem, o rádio se torna “alguém” por meio de vozes que a gente reconhece pelo timbre. É presença suficiente. Na cozinha, no pátio, na garagem, no banheiro, no quarto, na sala, um homem ou mulher invisível nos faz rir, nos faz refletir, nos comove, nos tira pra dançar. É diferente da televisão, que entretém com figurino, maquiagem e texto ensaiado, entregando uma fantasia. Rádio é emoção genuína, espontânea, de verdade. O exemplo mais célebre é o de Orson Welles com seu programa A Guerra dos Mundos, que 80 anos atrás, na véspera do Halloween de 1938, fez mais de 1 milhão de pessoas acreditarem que os Estados Unidos estavam realmente sendo invadidos por marcianos, instaurando o pânico. Por sintonizarem a transmissão no meio, muitos ouvintes não escutaram a abertura avisando que se tratava de radioteatro - e surtaram. Dê um Google para recordar. O episódio firmou para sempre a potência do veículo.

Como diz a Katia em seu livro: “por mais que avance a tecnologia, humanos continuarão falando e escutando”. É o que basta. Enquanto existir rádio, a solidão terá um adversário à altura.


#li, não concordo, mas quero prosseguir mesmo assim.



Ele o cobrirá com as suas asas,
e debaixo delas você estará seguro.

Salmos 91:4 / NTLH

segunda-feira, 26 de novembro de 2018




Existe um ditado irlandês: “É melhor ter sorte do que ser rico”. Adoro esse ditado. Quero ter sorte.

Uma vez um colega disse, desdenhando de um “boa sorte!”, que sorte é para incompetentes. Que seja. Vou optar pela sorte. Agradeço todos os dias pelas coisas boas que me aconteceram, que não têm explicação científica alguma. Alguns chamam isso de Deus.

Me lembro até hoje do Caio, um garoto raquítico de pele muito branca de quem todos gostávamos porque tinha o videogame mais legal e sempre nos convidava para ir na casa dele. Ele ganhava um presente toda vez que tirava uma nota boa. Ele ganhava um presente realmente caro sempre que passava de ano. Eu tinha inveja do Caio. Toda vez que eu tirava nota boa minha mãe falava: “Não fez mais que a obrigação”. Passava de ano e ouvia: “Não fez mais que a obrigação”. Era o melhor da turma e “não fez mais que a obrigação”.

Ouvi falar esses dias que o Caio destruiu seu carro novinho dirigindo bêbado. Fiquei chocado. Me fez pensar na influência negativa de pais que nunca dizem “não” pros filhos. Mas pensei também na influência de bons pais. Será que teremos sorte?

Pais atenciosos, esses que passam horas estudando com os filhos, pais que conversam, que dizem não, esses pais podem, por alguma razão inexplicável, ter filhos malsucedidos. Ter filhos que fazem coisas erradas. Imaginem que tristeza é, para um pai dedicado, não ver seu filho brilhar. Que mundo injusto é esse, em que nós, humanos, somos tão imprevisíveis.

Se nossos filhos serão brilhantes, não sabemos. Aproveitamos cada momento torcendo pra que sim. Se tivermos sorte. Se tivermos sorte, serão decentes, bem-sucedidos, ajudarão outras pessoas, mudarão o mundo. Se tivermos sorte. Serão bondosos, reconhecidos, sorridentes e educados. Se tivermos sorte.

Terão valido a pena as noites em claro, as vezes em que não pensamos no trabalho, as tardes de estudos, a dedicação, as conversas, a abnegação. Teremos feito tudo isso, e talvez dê certo, talvez não.
Se der certo, seremos os pais mais felizes do mundo. Não fizemos mais que a obrigação.


Sempre que puder, ajude os necessitados. Não diga ao seu vizinho que espere até amanhã, se você pode ajudá-lo hoje.

Provérbios 3:27-28 / NTLH

terça-feira, 20 de novembro de 2018


#dia da consciência negra


“Não sou racista”, dizem todos, mas alguém assumiria? Não temos amigos negros porque não tivemos colegas negros na escola particular em que estudamos, e é só por isto que eles não fazem parte do nosso convívio, a não ser como empregados. Não somos racistas, o distanciamento deve-se apenas à desigualdade social. Será mesmo?

Ainda consideramos que ser branco é normal e que ser negro é outra coisa. Ainda pensamos na África como um lugar exótico que produz bons vinhos, que é ótimo destino para fazer safáris cinco estrelas e cujo artesanato é perfeito para decorar nossas paredes e estantes. Não estudamos nossa ancestralidade e não conhecemos todas as versões da nossa própria história, apenas a escrita pelos brancos, que ignoram a cultura africana difundida de forma oral. Nossos olhos se voltam para a Europa como se lá estivesse toda a nossa origem.

Temos falado muito em empoderamento da mulher, um processo que tem conquistado vitórias importantes, mas, para sermos uma sociedade moderna, igualitária e justa precisamos estar atentos também à questão dos negros (questão, aliás, que não é só deles, e sim de todos). Nossa cabeça tem que mudar. É fundamental trocar experiências e acabar de vez com estereótipos e preconceitos. Nunca foi tão necessário um humanismo expandido, agregador, pacífico – único antídoto contra a crise generalizada em que vivemos.

Convivo com pouquíssimos negros, mas tenho o privilégio de ser amiga da escritora e atriz Elisa Lucinda, uma mulher lúcida, engajada. Através dela, aprendo sobre valores, tradições, orgulho racial. Outro artista a quem devemos escutar é o ator Lázaro Ramos, que acaba de lançar um livro chamado Na Minha Pele, em que faz um relato sensível sobre a realidade do negro no Brasil, chamando nossa atenção para atitudes vexaminosas que nem percebemos. Um exemplo banal: incontáveis vezes ele foi cumprimentado pela sua atuação em Cidade de Deus, mesmo não tendo participado do filme.

Simplesmente é automática a associação entre negro e violência. Lázaro também salienta manchetes de jornal que lemos todos os dias, sem perceber a sutil troca de uma palavra: “Traficante preso com 30 quilos de cocaína” e “Estudante preso com 30 quilos de cocaína”. Adivinhe a razão de um ser qualificado como traficante e o outro não.

Estas percepções equivocadas demonstram o tamanho do nosso atraso e impedem o país de crescer – não é só a política que nos afunda, mas toda uma mentalidade ainda escravagista que nos prende a um modelo antigo de nação. Como começar a evoluir? O caminho é longo, mas fica a sugestão de leitura do livro de Lázaro Ramos para começar a perder o medo de enxergar o que há por baixo da pele de todos nós.


A pessoa que procura segurança
no Deus Altíssimo
e se abriga na sombra protetora
do Todo-Poderoso
pode dizer a Ele:
“Ó Senhor Deus, tu és o meu defensor
e o meu protetor.
Tu és o meu Deus; eu confio em ti.”

Salmos 91:1-2 / NTLH

segunda-feira, 19 de novembro de 2018





#dia mundial dos pobres
data instituída pelo Papa Francisco, em 2017



Meus filhinhos, o nosso amor não deve ser somente de palavras e de conversa. 
Deve ser um amor verdadeiro, que se mostra por meio de ações.

1 João 3:18 / NTLH

domingo, 18 de novembro de 2018

liberdade, substantivo feminino


Pergunte a uma mulher o que ela inveja nos homens e a resposta provavelmente será “fazer xixi em pé”. Nada original, mas pense: não fosse isso, seria o quê?

Nossas avós e bisavós costumavam responder essa enquete dizendo “invejo a liberdade deles”. Eram de outra época, ainda que contemporâneas da escritora e psicanalista Lou Andreas-Salomé (sugiro comemorar o Dia da Mulher assistindo ao filme Lou), que nasceu há 157 anos e que, muito antes da palavra empoderamento constar dos dicionários, já era dona da sua vontade. Ela sabia que convenção é uma abstração, e não um capataz com peso, altura, medida e um chicote nas mãos. O conjunto de costumes sociais é um acordo sem contrato. Facilita as relações, mas é passível de questionamento.

As convenções foram criadas por homens, logo, seus maiores beneficiários. Eram deles a prerrogativa de não ter horário para chegar em casa, não precisar dar explicação sobre seus passos, contratar, demitir, legislar. Ninguém controlava seu vocabulário nem o jeito que sentavam, nem com quem transavam. Qualquer escorregadela em seu comportamento era recebida com uma desculpa abonadora: homem é assim mesmo. “Assim mesmo” era seu habeas corpus. Um homem fora da curva costumava ser, no máximo, um exótico, um excêntrico, já uma mulher fora da curva era a doida, a sem vergonha. Ai de nossas avós se não andassem na linha, mesmo suspeitando o descompasso desse arranjo.

Isso foi na pré-história. Que mulher hoje precisaria invejar a liberdade de um homem? Apenas as que escolheram ficar dentro da prisão, mesmo estando a porta destrancada. A liberdade é excitante como fantasia, mas nem todas querem assumir a responsabilidade de suas escolhas. Uma vez acostumadas ao quadradinho conhecido, pode colocar a chave na mão delas que não saem, não. Ficam onde estão.

Lá fora tem empregos e demissões, tem viagens e tem penúria, tem paixão e tem sofrimento, tem escolhas acertadas e vacilos históricos, tem você sozinha e muito bem casada. A vertiginosa inconstância da vida, acessível a ambos os sexos.

Fazer xixi em pé? Nem nisso vejo vantagem – com a correria dos dias, poder sentar por 30 segundos é um luxo. Portanto, hoje estamos aptas a dar a mesma reposta que eles dão a este tipo de pesquisa (como bem lembrou Mirian Goldenberg em recente artigo). Quando perguntados o que invejam nas mulheres, eles naturalmente respondem: nada.

Melhor assim, sobra mais tempo para a admiração mútua. Liberdade não significa libertinagem, irresponsabilidade ou descompromisso. Ser livre não é um defeito, e sim uma virtude. É o que permite criar uma trajetória que não seja imitação de outras, ter uma existência com assinatura própria, enfim, ser uma pessoa absolutamente honesta e autêntica. Mulher é assim mesmo. Agora é.


sorvete, chocolate, pizza, macarrão, coca-cola, feijoada



Vocês são a luz para o mundo. Não se pode esconder uma cidade construída sobre um monte. Ninguém acende uma lamparina para colocá-la debaixo de um cesto. Pelo contrário, ela é colocada no lugar próprio para que ilumine todos os que estão na casa. Assim também a luz de vocês deve brilhar para que os outros vejam as coisas boas que vocês fazem e louvem o Pai de vocês, que está no céu.

Mateus 5:14-16 / NTLH

sexta-feira, 16 de novembro de 2018


#dia da tolerância 

quinta-feira, 15 de novembro de 2018


#proclamação da República

terça-feira, 13 de novembro de 2018

“gentileza gera gentileza”


#dia mundial da gentileza

para além da vida, o amor



escrito por Oliver Bredariol

Você nasce, cresce, estuda e trabalha. E antes da morte, nesse meio tempo, você se apaixona e ama muitas pessoas “eternamente”. Daí, você morre.
Como a vida pode ser tão ínfima e perecível, perto do tamanho da vontade de quem se ama?

(...) Somos autodestrutivos, invejosos, gananciosos, odiosos e consumistas por natureza. E, por natureza, também amamos.
O amor, diferente de todos os outros sentimentos, rompe o tempo e o espaço. Ultrapassa os limites do real e continua a fazer sentido depois que partimos daqui. Provavelmente, em breve, descobriremos um cálculo matemático e metafísico pra provar a eficácia e permeabilidade do amor.

Ainda quando eu tratava de depressão, Vinícius, uma das pessoas mais importantes da minha curta existência, me disse que não podemos enxergar a vida como uma passagem, e sim, como o começo, o meio e o fim de tudo. Por isso, as coisas precisam ter significado aqui e não depois. Afinal, mesmo que a morte fosse um outro capítulo, ela não faria parte desse mesmo livro onde estamos agora.

Significado é sentido. Sentido é amor. E amor é puramente significado.

Ódio não faz sentido, preconceito não faz sentido. Comer e beber, embora bom, também não fazem sentido. Mas o amor faz. E faz todo! Se faz por inteiro e compartilhado. E mesmo que seja possível poder amar a si próprio, amor sozinho também não faz sentido.

A partir desse dia, eu comecei a dar abraços mais sinceros, dizer aos meus amigos “eu te amo” com mais frequência, beijar meus pais com toda a minha vontade, respeitar e ouvir o que o outro tem a dizer e, deixar amor nas coisas em que eu acredito ou faço. Afinal, de todas os seres vivos e objetos com prazo de validade, o amor é a única exceção.

Amanhã, quando sua existência não passar de história, 20, 30 ou 100 anos depois, ainda vai restar amor nas coisas pelas quais você zelou, nos lugares onde passou, nas pessoas em que você, de alguma forma, tocou, e até mesmo, nos textos que você escreveu. Nada mais.

Eu tenho muito medo de morrer. E se pra quem acredita em céu e inferno esse sentimento já é forte, pra mim, é um pouco pior.

E não me refiro ao como, quando e onde. Me refiro ao “com quem”. Qual será o último olhar que vai encontrar com o meu? Quem vai segurar a minha mão antes de partir? Estarei rodeado de pessoas que me amaram?

Como não sei a resposta para isso, eu me tranquilizo amando. E para além de me consolar, o amor, de quebra, ainda me deixe firme, me deixa saudável e me faz, por mais incrível que pareça, ainda acreditar nas pessoas e na significância da vida.



E agora, Senhor, o que posso esperar?
A minha esperança está em ti.

Salmos 39:7 / NTLH

segunda-feira, 12 de novembro de 2018



“Eu tinha vergonha de fazer quadrinhos enquanto outras pessoas faziam medicina.
Então entendi: entretenimento é uma das coisas mais importantes na vida das pessoas.
Sem isso, elas entrariam em depressão.”

Stan Lee, criador de heróis da Marvel

“novembro é o mês em que eu cansei de tudo”



Já faz uns três anos que chega novembro e sempre – todo novembro! – eu estou completamente exausto querendo desistir de tudo e ir morar na praia. Novembro é o mês em que eu cansei de tudo: não aguento mais viajar; não aguento mais fazer check-in em hotel (especialmente aqueles em que você tem que preencher um papelzinho e depois o moço do balcão pergunta tudo de novo pra você porque não entendeu a sua letra); não aguento mais gente que manda áudio longo no WhatsApp; não aguento mais celular caindo naquele vão do banco do carro que não dá pra pegar de jeito nenhum; não aguento mais elevador que abre e você pergunta: “Está descendo?” e uma pessoa lá dentro diz: “Não, está subindo”; não aguento mais gente que insiste em colocar uma mala do tamanho de um contêiner no compartimento do avião enquanto todo mundo espera de pé sem entender a qual aula de Física que este cidadão faltou; não aguento mais garçom que pergunta se a água é com ou sem gás (é claro que é sem gás!); e não aguento mais gente reclamando que está cansado e que só quer desistir de tudo e ir morar na praia.

Em novembro, estou tão cansado que entro em um modo de conversa stand by. As pessoas falam comigo, eu respondo normalmente, mas, na verdade, estou com a cabeça longe, estou imaginando-me de calção, barriga branca e nariz vermelho, chutando a espuma do mar dos Ingleses, tomando drinks feitos no abacaxi debaixo de um guarda-sol, pendurando a conta no quiosque da praia, a brisa batendo e eu sem nenhum e-mail pra responder. Sem celular, sem wi-fi, sem grupo de WhatsApp.

Cansei do formato do celular na minha mão o tempo todo. Cansei de olhar pra tela de três em três segundos. Só quero coisa analógica, quero ler jornal, sujar os dedos com a tinta preta, quero ler uma enciclopédia Barsa, datilografar em uma Olivetti, quero andar de bonde, não aguento mais nada. Não aguento nenhuma modernidade, Netflix, cupcakes, estampas de unicórnios. Não estou nem aí se alguém disse algo no Twitter, se o Instagram tem um novo filtro que tira todas as espinhas da nossa cara. Chegou novembro, e eu estou insuportável.

Cansei de coisas de que todo mundo gosta. Cansei de palavras em inglês, de startãps que fazem éps com faunding de vêntur céptalists, de amigos que estão analisando um bísnes, com o bãdjet apertado tentando alcançar o breique íven. Não sei nem se quero encontrar mais pessoas. Acho que já encontrei pessoas demais este ano, está bom assim. Eu deveria ter contado a quantidade de pessoas que eu encontrei.

Acho que deveríamos ter uma contagem anual de pessoas que encontramos e, quando chegasse a determinado número, você seria mandado para uma praia deserta, poderia ficar lá até o Réveillon. Estou tão cansado que imagino um Réveillon sozinho. Eu leria um livro até as oito da noite, tomaria uma sopinha e iria dormir com protetores de ouvido para não ouvir os fogos. Coitados dos cachorros. Cachorros me agradam. Ainda não cansei de cachorros. Acho que não estou tão cansado assim.



#dia da liberdade

#fique por dentro
O Dia da Liberdade ou Dia Nacional da Liberdade foi instituído no Brasil através da Lei nº 13.117, de 7 de maio de 2015.
A data já era comemorada nos Estados de Minas Gerais 
e do Rio de Janeiro.
O Dia Nacional da Liberdade remete à data do nascimento de 
Joaquim José da Silva Xavier  - Tiradentes.
(12 de novembro de 1746)



“Disse-lhe Jesus: 'Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, ainda que morra, viverá; e quem vive e crê em mim, não morrerá eternamente. 
Você crê nisso?”

(João 11:25-26)

domingo, 11 de novembro de 2018


qualquer corda



Quando menina, nunca olhava embaixo da cama a fim de conferir se havia algum monstro aguardando que eu apagasse a luz para só então me atacar. Bicho-papão era coisa que não me apavorava, mas eu tinha um medo absurdo de areia movediça, como se isso fosse um perigo menos fantasioso do que monstros embaixo da cama. Ficava em pânico quando via cenas de filmes em que alguém caía numa poça melequenta e, sem conseguir nadar, ia sendo tragado aos poucos para o fundo. Help, um salva-vidas! Não havia. Até que, subitamente, alguém surgia com uma corda e resgatava a vítima que, a essa altura, estava apenas com as duas mãos para o lado de fora.

Aí eu cresci. E admito, encabulada, mesmo grandinha ainda passei boa parte da vida me perguntando: quem é que vai aparecer com a corda?
Porque tem hora que você se sente bem assim: num lodo, enterrada até a cintura, sem ninguém por perto para puxar você pelo braço, para te alcançar uma boia, para jogar um cipó. Como é que você foi parar nesse lamaçal? Ah, pois é.

Sabe como é que foi, seu moço, eu conto: vinha correndo naquela direção, no meio da mata fechada, assustada por achar que estava sendo perseguida por algum animal selvagem, e então corri, corri tanto que quando vi, tchibum, caí nesse areal movediço desgraçado, e a margem, que seria facilmente alcançável com duas braçadas, ficou longe demais das minhas possibilidades. Estou imobilizada pela força sugadora desse buraco maligno.

Quantas vezes isso já nos aconteceu? Metaforicamente, é claro. Sabe como é que foi, seu moço, eu conto: vinha fugindo da minha verdadeira identidade, sem coragem para ser uma pessoa mais original e livre, assustada por achar que não daria conta de viver fora dos padrões, e então corri, corri tanto que, quando vi, tchibum, caí nessa rotina movediça desgraçada, e o meu sonho de ser eu mesma, que seria facilmente alcançável com duas braçadas, ficou longe demais da minha realização. Estou imobilizada pela força sugadora das minhas escolhas covardes.

Ou. Sabe como é que foi, seu moço, eu conto: vinha correndo na direção oposta a um amor que me exigiria muita dedicação e entrega, corri evitando todos os desejos que tentavam tomar posse do meu corpo, assustada por achar que não daria conta de tanta intensidade, de tanto sentimento, e então corri, corri tanto que, quando vi, tchibum, caí nessa mesmice movediça desgraçada, e a minha grande paixão, que seria facilmente alcançável com duas braçadas, ficou longe demais da minha realidade. Estou imobilizada pela força sugadora dos convencionalismos.

Tudo o que a gente quer é agarrar em alguma coisa para sair de uma vida atolada. Um novo amor. Um novo projeto. Uma viagem. Religião. Astrologia. Terapia. Curso tântrico. Uma corda. Qualquer corda.



— Venham a mim, todos vocês que estão cansados de carregar as suas pesadas cargas, e eu lhes darei descanso.

Mateus 11:28 / NTLH

sábado, 10 de novembro de 2018

que o amor vire rotina



Que o amor vire a rotina de sermos trazidos à tona até que tenhamos uma melhor perspectiva de nós mesmos: e isso nos conduza para além do narcisismo. Que o amor vire a rotina de termos seguranças que não se confundam com a ilusão da posse e convicções que não moram na inércia.

Que o amor vire a rotina de ser agente transformador para que possamos questionar diariamente: O que posso ser? Onde quero estar? O que me faz querer ficar? E abraçar a liberdade das perguntas e respostas.

Que o amor vire a rotina de entender que, sendo o Outro esse mistério e, sendo nós mesmos essa vasta possibilidade de tramas a serem desvendadas, nunca poderemos ser abreviados ou passíveis de conclusão. Pois se o que cresce precisa mais de espaço do que de constância, então que o amor não encontre na impermanência o desamparo, nem na solidez do sentimento um motivo para condenar a conquista à estagnação.

Que o amor vire rotina, até que a rotina seja amor.


“Não há nada no mundo que esteja melhor repartido do que a razão: todos estão convencidos de que a tem de sobra”.

René Descartes

#eu na vida!

“Você não pode controlar tudo. 
Seu cabelo foi colocado na sua cabeça para te lembrar disso.”

das coisas que nunca se diz



Não sinto raiva da rotina; mas sinto saudade das surpresas. Do bilhete no para-brisa, da visita inesperada, do elogio sem ensaio ou da velha frase dita de um jeito novo. Não sinto por trabalhar o dia todo; mas sinto falta de alguém perguntar como foi o meu dia. Sinto falta de colo, por mais crescida que eu esteja. E de alguém que me enxergue além da fortaleza que pareço ser.

Não me incomoda ver no meu rosto que o tempo passou; mas me incomoda, e muito, ver as pessoas escondendo o tempo de si mesmas. Crentes que um creme-anti-idade, vai esconder o passado e a vida que viveram.

Não creio mais em contos de fadas, mas creio nas fadas que se apresentam na minha vida das formas mais incríveis e inesperadas. Não morro por não ter realizado todos os meus sonhos, sonhei tanto que deixei reservas, mas morro aos poucos quando tenho que abrir mão daqueles sonhos que escolhi realizar.

Já não me importa mais se você não ouve o que eu falo, mas me importa muito quando não me deixam falar. Não me incomoda mais a música do vizinho, mas me incomoda muito o silêncio de quem vive comigo. Quero falas, quero risos, quero participação efetiva e não uma lista de presença.

Não quero voltar a ser criança, mas me recuso a matar a criança que ainda resta em mim. Aquela que gosta de brigadeiro, que compra meias coloridas e que lê gibis na sala de espera lotada de gente grande.

São coisas que nunca dizemos, que nunca revelamos para não causar mais problemas do que já temos. Um dia calamos, seja por negligência ou por acomodação. No outro calamos por precaução. E quando nos damos conta, não sabemos mais como falar. Então guardamos tudo na última gaveta de nós mesmos. Aquela onde ficamos sozinhos, completamente nus e à deriva de nossas fraquezas. É aí que somos de verdade quem somos. Onde não existe filtro que mascare nossas verdades. 

Um dia a gente cria coragem e abre essa gaveta. E eis que lá estão eles. Nossos medos, nossas opiniões mais escusas, nossas angústias escondidas e nossos sonhos engavetados. Então nos vemos assim, tão simplesmente como somos. Sem mais nem menos, sem antes nem depois. Apenas nós e tudo aquilo que sentimos; de bom, de ruim, de grande, de pequeno, de lucidez, de loucura.

Por que será que é tão difícil ser quem somos? Por que será que precisamos ser “tantos”,  para esconder o “um” que realmente somos? 
Era para ser tudo tão simples! Pena termos optado por complicar.



A Palavra se tornou um ser humano e morou entre nós, cheia de amor e de verdade. E nós vimos a revelação da sua natureza divina, natureza que ele recebeu como Filho único do Pai.

João 1:14 / NTLH

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

o amor, em alguns toques


Tive um vizinho que discutia com a namorada três vezes por semana. Eu ouvia tudo. Não por opção: morava no apartamento de baixo. Aquilo era amor ao choro e à reconciliação. Mas não um ao outro.

Difícil saber o que é amor. Mais fácil saber o que não é.

Um namorado citou Guimarães Rosa: amor é “descanso na loucura”.

Com ele vivi mais a loucura do que o descanso, mas o aprendizado tem que começar por algum ponto. O vizinho devia estar nesse estágio. Com o tempo vi que ele tinha razão. O namorado, não o vizinho.

Amor é mesmo aquela sensação de voltar para casa.

Adormecer lado a lado é a grande prova. No dia seguinte, acordar e sentir que está levando alguém com você. Descobrir um sorriso ridículo no canto da boca. Pronto, encaixou. Feito pecinhas de Lego: diferentes, mas vindas do mesmo mundo

Lego é gostoso. Quebra-cabeça não.

Amor não é desejo: é feito de. Amor é feito de amor, mas não só.

Amor não tem razão. Ninguém ama pelas qualidades do outro, nem apesar dos seus defeitos. Ama porque o outro é o outro e pronto.

Amor é pacote completo.

Você sabe que é amor quando se descobre cúmplice. Quando tem a coragem de se mostrar. E de se ver. O outro é um espelho. Vai encarar?

Você sabe que é amor quando se entrega. Mas é melhor guardar algo para si mesmo. Amor não pode ser só para o outro.
Amor é um exercício do não ter. Amar e não ter nada em troca. Porque se é amor, não é em troca. Amor não serve para nada, não garante nada. Como as coisas boas da vida.

Amor é presença e é falta. Uma não vive sem a outra. Amor é liberdade. Gostoso é saber que o outro, com tantas opções, escolheu você mais uma vez. O que fazer para que amanhã ele faça a mesma escolha? Mantenha-se distraído.

Amor é feito de hoje. Da arte de não fazer tudo sempre igual. Da construção. Como revestir parede com aquelas pastilhas bem pequenas. No amor é preciso colocar uma por uma. Sem pressa de ver pronto. Para mim, é esse o sentido de amar como se não houvesse amanhã. Menos voraz do que sugere.

Mas posso estar errada. Sou amadora. Amei paredes inteiras. Quanto mais aprendo, menos sei. Gosto do aprender.

Uma convicção: amor é delicadeza. Eu sempre quis falar isso para o vizinho...