Pergunte a uma mulher o que ela inveja nos homens e a resposta provavelmente será “fazer xixi em pé”. Nada original, mas pense: não fosse isso, seria o quê?
Nossas avós e bisavós
costumavam responder essa enquete dizendo “invejo a liberdade deles”. Eram de
outra época, ainda que contemporâneas da escritora e psicanalista Lou
Andreas-Salomé (sugiro comemorar o Dia da Mulher assistindo ao filme Lou), que
nasceu há 157 anos e que, muito antes da palavra empoderamento constar dos
dicionários, já era dona da sua vontade. Ela sabia que convenção é uma
abstração, e não um capataz com peso, altura, medida e um chicote nas mãos. O
conjunto de costumes sociais é um acordo sem contrato. Facilita as relações,
mas é passível de questionamento.
As convenções foram
criadas por homens, logo, seus maiores beneficiários. Eram deles a prerrogativa
de não ter horário para chegar em casa, não precisar dar explicação sobre seus
passos, contratar, demitir, legislar. Ninguém controlava seu vocabulário nem o
jeito que sentavam, nem com quem transavam. Qualquer escorregadela em seu
comportamento era recebida com uma desculpa abonadora: homem é assim mesmo.
“Assim mesmo” era seu habeas corpus. Um homem fora da curva costumava ser, no
máximo, um exótico, um excêntrico, já uma mulher fora da curva era a doida, a
sem vergonha. Ai de nossas avós se não andassem na linha, mesmo suspeitando o
descompasso desse arranjo.
Isso foi na pré-história.
Que mulher hoje precisaria invejar a liberdade de um homem? Apenas as que
escolheram ficar dentro da prisão, mesmo estando a porta destrancada. A
liberdade é excitante como fantasia, mas nem todas querem assumir a
responsabilidade de suas escolhas. Uma vez acostumadas ao quadradinho
conhecido, pode colocar a chave na mão delas que não saem, não. Ficam onde
estão.
Lá fora tem empregos e
demissões, tem viagens e tem penúria, tem paixão e tem sofrimento, tem escolhas
acertadas e vacilos históricos, tem você sozinha e muito bem casada. A
vertiginosa inconstância da vida, acessível a ambos os sexos.
Fazer xixi em pé? Nem
nisso vejo vantagem – com a correria dos dias, poder sentar por 30 segundos é
um luxo. Portanto, hoje estamos aptas a dar a mesma reposta que eles dão a este
tipo de pesquisa (como bem lembrou Mirian Goldenberg em recente artigo). Quando
perguntados o que invejam nas mulheres, eles naturalmente respondem: nada.
Melhor assim, sobra mais
tempo para a admiração mútua. Liberdade não significa libertinagem,
irresponsabilidade ou descompromisso. Ser livre não é um defeito, e sim uma
virtude. É o que permite criar uma trajetória que não seja imitação de outras,
ter uma existência com assinatura própria, enfim, ser uma pessoa absolutamente
honesta e autêntica. Mulher é assim mesmo. Agora é.