Ele me contou a história em um tom baixo de
voz. Terminaram a relação, mas a cicatriz não havia fechado. Ele ainda gostava
dela, só que não deu certo. Namoraram durante quase um ano, ele morando em
Porto Alegre, ela em Vitória do Espírito Santo. Mais de 2.000km os separavam.
Não podiam pegar um avião todos os meses. Tinham seus empregos, suas famílias.
Culpava a distância pelo fim. Agora era tratar de conhecer outra pessoa para se
reerguer. “Já entrei no Tinder”, disse ele. Tive vontade de rir, mas ele não
parecia estar fazendo piada. Fiz cara de “agora vai”, sem convicção.
Relacionamento à distância – não são todos
assim, hoje? Em vez de conviver, viramos uns bisbilhoteiros. Compreensível, já
que esse troço chamado rede social captura mesmo. Se você é seguidor de gente
interessante, então, é um vício, pois são muitos textos bem escritos, fotos
originais, comentários divertidos, dicas de livros e filmes. Ainda assim,
moderação e tino: ninguém é tão estupendo como se apresenta no mundo virtual.
Onde foi parar nosso lado sombrio?
Fraquezas, angústias, dúvidas: não há espaço
para eles no Instagram e no Facebook. Dá a impressão que ninguém chora ou se
atrapalha no cotidiano – são raros os que expõem sua bad trip (o ego não
deixa). Normal, mas é bom lembrar que quem aprisiona sua dor não se relaciona,
não pra valer. Intimidade se atinge com divisão de fardo, troca. Paixões e
amigos dão sentido à nossa vida porque ajudam a nos passar a limpo, a colarmos
nossas fraturas, a nos tornarmos pessoas melhores. Cultuo a solidão, como já
disse mil vezes, mas ela é um pit-stop, apenas. Se escolho estar sozinha o
tempo inteiro, sem interagir com as emoções dos outros e sem expressar as
minhas inquietudes de viva voz, não evoluo, nada evolui.
Meu amigo conhecia profundamente sua namorada
capixaba? Pouco, pois o WhatsApp não dá conta da nossa humanidade, não
substitui olhares e abraços. Difícil demonstrar nossos desconfortos através de
mensagens online, então dá-lhe oba-oba. Resultado: depressão virou epidemia e
os suicídios se sucedem porque, entre outros motivos, as pessoas se sentem
inadequadas por estar sofrendo, o que é um absurdo. Sofrer é adequado. Sofrer é
normal. Todo mundo sofre, mesmo que não pareça. E não parece mesmo, pela
tremenda distância estabelecida entre o nosso eu real e o real dos outros.
Do quarto dos pais ao quarto dos filhos pode
existir um corredor de 2.000km a separá-los. Entre a minha cadeira no
restaurante e a sua, abre-se uma cratera a cada vez que colocamos o celular
sobre a mesa e ficamos checando as redes em vez de conversar, rir, fazer
confidências.
Relacionamento à distância é silêncio a dois, pode estar acontecendo aí mesmo dentro do seu casamento perfeito.
Relacionamento à distância é silêncio a dois, pode estar acontecendo aí mesmo dentro do seu casamento perfeito.