"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



sexta-feira, 13 de agosto de 2021

sexta-feira 13

 


— Não sou supersticioso — dizia, mas nas sextas-feiras 13 fazia o seguinte: não saía de casa, entende?

— Vamos que me acontece alguma coisa. Aí eu fico supersticioso.


Para proteger seu racionalismo, não se expunha. Não saía de casa. Não saía nem da cama.


— Telefona para o trabalho. Diz que eu estou gripado.

A mãe ia telefonar.

— E mãe...

— O quê?

— Me traz o café na cama?

A mãe trazia.


Ontem ele pediu para a mãe telefonar. Em vez de gripe, para não desconfiarem, mandou dizer que tinha torcido o pé. No escritório as pessoas comentaram:

— Já notaram? Toda sexta-feira 13 acontece alguma coisa com ele.

— Que azar!


Tomou café, almoçou e jantou na cama. Só levantou duas ou três vezes para ir ao banheiro, com muito cuidado. Dormiu um pouco. Leu um pouco, nada muito arriscado. Só quando o velho relógio da sala, o que imitava o Big Ben, tocou meia-noite, ele se levantou, escovou os dentes, tomou banho e se arrumou para sair.

— Onde é que tu vai? — Perguntou a mãe.

— Pra vida, coroa, pra vida.


Encontrou com a turma no bar. Durante a conversa, um dos amigos comentou:

— Ganhamos uma hora de existência.

E o outro comentou:

— Ganhamos, não. Recuperamos.

Ele não entendia nada.

— Como? O quê? Que história é essa?

— Acabou o horário de verão. Todos os relógios atrasaram uma hora.

— Quer dizer que ainda é sexta-feira 13?

Um amigo olhou o relógio.

— Por mais ... vinte e dois minutos.


Ele saiu correndo do bar. Precisava voltar para casa. Precisava voltar para a ...

Desapareceu num bueiro.