O pai, cercado pelos filhos,
faz um pronunciamento: “Pretendo desobrigar vocês a usarem o cinto de
segurança, que só tem utilidade para quem dirige mal”. Os filhos se entreolham.
É sabido que o cinto de segurança evita mortes em casos de colisões de pequeno
e médio impacto. É um dispositivo de segurança para todos, não importa se
dirigem bem, se dirigem mal, se não dirigem: estando dentro de um veículo em
movimento, há risco. Motoristas e passageiros do mundo inteiro usam o cinto,
que tem eficácia comprovada. O pai estaria batendo bem?
Diante da reação de
perplexidade da família, o pai, no dia seguinte, diz que foi mal interpretado,
que ainda vai encomendar um estudo, aquela enrolação costumeira de quem faz uma
burrada atrás da outra e depois tenta consertar. Só que a mensagem principal
foi transmitida: o pai não confia no cinto de segurança. É um negacionista. E
mesmo que se reconheça que ele bobeou, no inconsciente a mensagem foi
assimilada. Amanhã, um dos filhos esquecerá de usar o cinto, e tudo bem. Depois
de amanhã, outro filho viajará no banco de trás, e prender o cinto parecerá uma
besteira. E assim, influenciados pela hierarquia paterna, circularão em meio ao
trânsito sem usar o cinto e, claro, não sairão ilesos no caso de um acidente,
tudo porque aquele homem, que deveria zelar pela família, usa sua autoridade
para dar exemplos estúpidos.
É assim também na vida
pública. Todo chefe de Estado é visto como o “pai da pátria”. Quem assume um
cargo de tamanha importância não pode se dar ao luxo de ir pela própria cabeça
e induzir tanta gente ao erro. É preciso que dialogue com outros líderes,
respeite a ciência, busque informação de qualidade e tenha compromisso
civilizatório. Presidência não é lugar para irresponsáveis.
Países que imunizaram
mais de 70% da população estão flexibilizando, aos poucos, o uso da máscara, e
mesmo assim, existe receio - ninguém se atreve a dizer que a pandemia é um
episódio do passado. No Brasil, menos ainda. Há muita vacina a ser aplicada
antes de relaxar. Milhares de brasileiros não procuraram até hoje os postos de
saúde para tomar a segunda dose e alguns nem mesmo a primeira, atrasando a
necessária imunização coletiva, o que não aconteceria se tivessem recebido o
incentivo categórico de quem comanda. Tenhamos em mente que, gostemos ou não,
há um homem ocupando o posto de líder, de influenciador, de pai da nação. Tudo
o que ele faz e diz, por mais bizarro que pareça, contagia e infecciona. Pai
ausente é um drama social. Afeta destinos. Todos precisam de um, mas não de um
que nos usa como cobaia de seus devaneios.