Eu vim aqui me buscar. E
aqui parecia ser longe, muito longe do lugar onde eu estava, o medo costuma ver
as distâncias com lente de aumento.
Vim aqui me buscar porque
a insatisfação me perguntava incontáveis vezes o que eu iria fazer para
transformá-la e chegou um momento em que eu não consegui mais lhe dizer
simplesmente que eu não sabia.
Vim aqui me buscar porque
cansei de fazer de conta que eu não tinha nenhuma responsabilidade com relação
ao padrão repetitivo da maioria das circunstâncias difíceis que eu vivenciava.
Vim aqui me buscar porque
a vida se tornou tediosa demais. Opaca demais. Cansativa demais. Encolhida.
Vim aqui me buscar
porque, para onde quer que eu olhasse, eu não me encontrava. Porque sentia uma
saudade tão grande que chegava a doer e, embora persistisse em acreditar que
ela reclamava de outras ausências, a verdade é que o tempo inteirinho ela
falava da minha falta de mim.
Vim aqui me buscar porque
percebi que estava muito distante e que a prioridade era eu me trazer de volta.
Isso, se quisesse experimentar contentamento. Se quisesse criar espaço, depois
de tanto aperto. Se quisesse sentir o conforto bom da leveza, depois de tanto
peso suportado. Se quisesse crescer no amor.
Vim aqui me buscar, com
medo e coragem. Com toda a entrega que me era possível. Com a humildade de quem
descobre se conhecer menos do que supunha e com o claro propósito de se
conhecer mais. Vim aqui me buscar para varrer entulhos. Passar a limpo alguns rascunhos.
Resgatar o viço do olhar. Trocar de bem com a vida. Rir com Deus, outra vez.
Vim aqui me buscar para
não me contentar com a mesmice. Para dizer minhas flores. Para não me
surpreender ao me flagrar feliz. Para ser parecida comigo. Para me sentir em
casa, de novo.
Vim aqui me buscar. Aqui,
no meu coração.