Telefonei para minha mãe
hoje de manhã, e ela, ao ouvir minha voz, sussurrou com doçura: “Filha,
saudades...”. Não fazia nem 48 horas que ela havia almoçado aqui em casa, sem
contar os dois telefonemas que haviam sido trocados ontem, e ela já estava com saudades.
Isso me fez sentir a filha mais amada do mundo e a mãe mais megera do planeta.
Não vejo minha própria
filha há dois meses (está morando ali na Nova Zelândia) e quando me perguntam
se não estou derretendo de saudades eu digo que sim, claro, mas na verdade
tenho falado com ela mais hoje do que quando ela dormia no quarto ao lado. O
WhatsApp e o Facebook fazem com que minha saudade não mereça virar uma queixa e
muito menos um sofrimento. Minha saudade é tolerável, ainda que o adjetivo
tolerável não costume ser tolerado pelo passional universo materno.
Lembro com certa
nostalgia de quando a gente esperava uma carta, esperava para revelar uma foto,
esperava para colocar os olhos no bebê que ainda estava dentro da barriga. Pois
andaram me mostrando a ecografia de um feto de quatro semanas cuja resolução
era incrivelmente parecida com a de uma selfie. Hoje em dia você pode dizer se
seu filho puxou ao pai ou à mãe meses antes de ele nascer. Esperar é verbo
condenado à extinção.
Se não há mais espera,
onde colocar a saudade? Posso ver e falar com quem eu quiser, na hora que
quiser, em tempo real. Qualquer país do Hemisfério Norte está mais próximo do
que a esquina aqui de casa. Longe é um lugar que não existe, confirmado.
Caducou até mesmo a Teoria dos 6 Graus de Separação, estudo que prova que
estamos a seis pessoas de distância de qualquer outra pessoa, até mesmo do
Barack Obama. Ora, o Obama está no Twitter. E já falei com Mark Ruffalo pelo
Facebook. Não preciso de intermediários. Daqui a pouco até Deus estará online
(aliás, está).
A saudade é provocada
pela ausência, mas quem se ausenta, hoje? Aqueles que morreram, apenas – para a
morte não há aplicativo. Já reclamar de saudade de quem está vivo virou apenas
um afago verbal, uma declaração de amor, e não uma carência real de contato, a
não ser que se esteja muito desanimado para ligar os apetrechos eletrônicos que
nos conectam. Temos recursos, temos acesso. A saudade já não precisa ser
tamanha, podemos torná-la comedida.
Não estou falando da
saudade entre amantes: beijos e seus derivados, só ao vivo mesmo. E para
amenizar a saudade constante que minha mãe sente, ela que se nega a aderir ao
mundo digital, só vejo um jeito: forçá-la a aceitar um smartphone de presente e
convidá-la para almoçar mais vezes.