Olhando daqui, percebo que pessoas e circunstâncias tiveram
um propósito maior na minha vida do que muitas vezes, no momento de cada uma,
eu soube, pude, aceitei, ler. Parece-me, agora, que cada uma, no seu próprio
tempo, do seu próprio modo, veio somar para que eu chegasse até aqui, embora
algumas vezes, no calor da emoção da vez, eu tenha me rendido à enganosa
impressão de que veio subtrair. A vida tem uma sabedoria que nem sempre
alcanço, mas que eu tenho aprendido a respeitar, cada vez com mais fé e
liberdade.
O tempo, de vento em vento, desmanchou o penteado arrumadinho
de várias certezas que eu tinha, e algumas vezes descabelou completamente a
minha alma. Mesmo que isso tenha me assustado muito aqui e ali, no somatório de
tudo, foi graça, alívio e abertura. A gente não precisa de certezas estáticas.
A gente precisa é aprender a manha de saber se reinventar. De se tornar manhã
novíssima depois de cada longa noite escura. De duvidar até acreditar com o
coração isento das crenças alheias. A gente precisa é saber criar espaço, não
importa o tamanho dos apertos. A gente precisa é de um olhar fresco, que não
envelhece, apesar de tudo o que já viu. É de um amor que não enruga, apesar das
memórias todas na pele da alma. A gente precisa é deixar de ser sobrevivente
para, finalmente, viver. A gente precisa mesmo é aprender a ser feliz a partir
do único lugar onde a felicidade pode começar, florir, esparramar seus ramos,
compartilhar seus frutos.
Tudo o que eu vivi me trouxe até aqui e sou grata a tudo,
invariavelmente. Curvo meu coração em reverência a todos os mestres, espalhados
pelos meus caminhos todos, vestidos de tantos jeitos, algumas vezes disfarçados
de dor.
Eu mudei muito nos últimos anos, mais até do que já consigo
notar, mas ainda não passei a acreditar em acaso.