"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Deus, seja o motivo de hoje!


Têm um dia no ano em que eu invariavelmente choro.
É quase como um choro com data marcada.
Apesar dos choros outros do resto do ano, tem um dia do ano em que eu sempre choro e da mesma dor. Dor de ver o meu menino crescer: no dia do aniversário dele.
Ele, o meu menino, faz anos e eu me lembro daquela frase da Elizabeth Stone: "Tomar a decisão de ter um filho é grave. É decidir, para sempre, ter o seu coração andando por aí, fora do seu corpo".

Começo uns dias antes com uma melancolia meio sem explicação e um dia antes, é inevitável, o choro vem, e então eu lembro porque estou chorando e lembro que é assim, todos os anos, afinal.

E é como se me surgissem todos os dias da nossa pequena e simples vida em comum e eu me sentisse uma mulher enorme, vitoriosa, porque depois de tantos dias difíceis, de tantas noites sem dormir, das tantas vezes sem dinheiro, do enorme medo e da responsabilidade de ter de cuidar do bem-estar e da saúde do menino, ele está ali, se lambuzando com os restos da lata de leite condensado, do meu lado, ele vingou e eu me sinto uma deusa, uma deusa que chora como um rato, mas uma deusa.

E eu me sinto pequena, igual a todas as mães do mundo que enrolam brigadeiros no dia do aniversário dos seus filhos e que tem as mesmas preocupações.
Eu me sinto pequena e com o coração quente, amolecido, porque este menino que vingou é o menino do meu coração, aquele com quem eu brigo todos os dias de manhã para acordar e ir para o colégio (e ele tem um mau humor horrível como o meu!), aquele que me ensinou que as relações de amor na vida das pessoas são uma construção diária, vida inteira, que filho a gente não gosta só porque pariu, mas porque aprende a gostar no meio da guerra doméstica, todo dia um pouquinho, aprende a conhecer, a ver o jeito, a entender, se surpreender, porque filho vem pra ensinar o nosso tamanho, a resistência do nosso coração, o olhar para o outro, a ter paciência com o que cresce ali, do lado, perto, é filho que ensina a gente a ser mãe.

(Lélia Almeida)