"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



sábado, 18 de dezembro de 2021

 


 Todos os dias é um vai-e-vem. A vida se repete na estação. Tem gente que chega pra ficar. Tem gente que vai pra nunca mais. Tem gente que vem e quer voltar. Tem gente que vai e quer ficar. Tem gente que veio só olhar. Tem gente a sorrir e a chorar. E assim, chegar e partir”.

(Encontros e Despedidas – Milton Nascimento)


Estamos vivenciando uma das épocas mais significativas do ano. O Natal e o Ano Novo são, para a maioria das pessoas, um momento de estar com a família e com amigos queridos. Não podemos esquecer que a essência do Natal está justamente no partilhar de afetos com aqueles que amamos.

 

Contudo, o Natal, mais especificamente, também pode ser um momento desconcertante e dificílimo de ser vivenciado, principalmente para as famílias que sofreram a perda, recente ou não, de um ente querido, pois esta época também é de nostalgia e recordações. Podemos ser invadidos por uma enxurrada de emoções e sentimentos diante da ausência de alguém que amamos.

 

Depois que perdemos alguém, achar sentido nas datas comemorativas pode ser algo demorado e dolorido. Parece que o natal é um amplificador de perdas.

Pode ser o seu primeiro natal e passagem de ano sem a pessoa que você ama ou pode ser mais uma data muito significativa sem ela. A sensação é de ausência, é de vazio é de solidão. A sensação é de não pertencimento, parece que estamos vivendo em uma época que não nos pertence mais. Uma parte de nós foi embora, uma pessoa primordial na minha existência, não está comigo mais e não será a mesma coisa mesmo! Após a perda de alguém uma transformação interna acontece e isso é inevitável.

 

Permita-se sentir a dor. Permitir talvez seja a palavra-chave. Permita-se sentir tristeza num momento em que todos estão alegres, afinal você está vivenciando a ruptura de um vínculo. Aceite seus pensamentos e sentimentos. Não tente racionalizar emoções tão fortes. Elas ocorrem porque perdemos, fisicamente, alguém que amamos, mas esta pessoa ainda está viva em nossos pensamentos e memórias.

Dê espaço para o seu sofrimento, ele é seu. Respeite o seu tempo. Se quiser ficar sozinha, fique. Se quiser ficar ao lado dos familiares que estão ali, fique! O primordial é você se respeitar, respeitar o seu coração e se acolher.

 

Com o passar do tempo, que é de cada um, vamos percebendo que a celebração familiar é algo muito importante, mesmo a ausência e a dor estando ali presentes. Ao mesmo tempo em que sinto a dor da ausência sou grata por amar tanto e sou grata também às pessoas que ainda estão presentes na minha vida.

 

Uma perda nos ensina a valorizar a vida. Faz-nos pensar que precisamos celebrar a vida dos que amamos e que estão presentes. Depois que experimentamos a dor do luto, o medo de outras perdas ficará evidente e o que podemos fazer é estarmos presentes na vida dessas pessoas. Pode parecer estranho falar isso, mas com o passar de muito tempo, percebemos que aprendemos muito com as perdas, cada uma trás um novo significado e uma nova reflexão porque nos transformaremos em outras pessoas. Ficamos feridos e a única opção que temos é encarar essa dor de frente. Perceberemos que se continuarmos a manter o foco na perda, não conseguiremos participar e celebrar a vida das pessoas que estão à nossa volta.

 

O Natal será para todo o sempre diferente depois de uma perda significativa. Faz parte do processo de luto compreender as emoções que estas datas nos proporcionam e, na medida do possível, se reorganizar emocionalmente para vivenciá-las. A morte de uma pessoa querida implica necessariamente numa profunda mudança de paradigmas em nossas vidas e na forma como vamos continuar a caminhada.

Talvez você encontre uma nova forma de vivenciar estes momentos, pois a elaboração do luto passa pela assimilação da ausência com a celebração com aqueles que estão vivos e fazem parte da nossa existência.

 

Enfim, acredito que o primordial é permitir-se.  Faça aquilo que fizer sentido para você e te trouxer um significado.


E toda dor passa? A resposta é sim. A dor insuportável vai embora e dá lugar a uma saudade suportável, apesar de existirem períodos de altos e baixos, o sofrimento pode diminuir ao ponto de virar uma lembrança boa.


O que a memória ama, fica eterno.

(Adélia Prado)