No período de 18 meses,
as portas do mundo fecharam, ninguém entrou, ninguém saiu. De fronteiras a
residências, isolamento foi a palavra adotada. Quem ainda circulava pelas ruas,
não fazia por diversão: atendia doentes, comprava mantimentos, ia à farmácia e
voltava direto pra casa, sem a habitual passadinha no bar ou na academia no
final da tarde. Diante das estatísticas trágicas, e por respeito a tantas
perdas, pouco se falou na solidão como efeito colateral da pandemia.
E efeito sério, solidão
deprime. Não a todos - há quem lide muito bem com a própria companhia -, mas o
ser humano é gregário, sente falta de se juntar, misturar, confraternizar,
coisas que só agora, vacinados e aos poucos, tomando os cuidados necessários,
começamos a nos atrever. Mas demorou. Antes dessa lenta alforria, foi um tal de
dialogar com o espelho do banheiro, passar um tempão no sofá maratonando
séries, bater papo com os amigos por WhatsApp, pedir comida por delivery e
engordar. Pois é, não bastasse a deprê, solidão engorda. Muita gente ganhou uns
quilinhos extras durante o recuo forçado.
Mas a gente se entrega?
Se entrega nada. Crises estão aí para serem revertidas, compensadas. Se você
não reparou, eu reparei: durante o confinamento, o pessoal começou a dançar
entre quatro paredes. Quem estava namorando ou estava casado quando o
coronavírus chegou para estragar a festa (e manteve-se heroicamente casado,
apesar do excesso de grude), passou a fazer bailinho na sala, pagode na
cozinha, ensaiou um tango no corredor. Uma pequena caixa de som, uma boa
playlist no Spotify e quem diria? Bebida por conta da casa.
Já quem foi surpreendido
pela pandemia em plena entressafra amorosa, sem um par perfeito ou imperfeito,
se virou como? Do mesmo jeito. Fez festa de um. Suou a camiseta como se
estivesse na pista, cantou alto sem medo de acordar a vizinhança, levantou os braços
como se não houvesse amanhã - e ninguém sabia se haveria mesmo. Quem não soltou
suas feras, nem caiu na gandaia, ficou mais triste e pesado.
Nunca precisei de uma
ameaça global para dançar em casa, mas agora peguei gosto pra valer e enquanto
não fraturar uma vértebra, continuarei com minha rave individual.
(…)
Se não é meio ridículo
dançar sozinho? Pode acreditar, é maravilhosamente ridículo.