Um
avô me parou esses dias no final de uma palestra. “Se você acha que amor de pai
é grande, espere até se tornar vô”, disse. Duvidei. Amor de pai é tão grande,
ter filhos dá tanto trabalho, exige tanta dedicação, que amamos nossas obras
como se fosse o projeto de nossas vidas. “Mas depois de ser vô você percebe que
não deveria ter se preocupado tanto. Amor de vô é amor puro, compreensivo e
afetuoso. A gente olha pro nosso filho, pensa em tudo o que errou e tenta
acertar com o neto”, contou o senhor. “A gente aprende que ser duro demais ou
preocupado demais ou estressado demais com dinheiro é bobagem”, disse. “Amor de
vô é puro amor, sem preocupações bobas”.
Realmente,
tenho tantas preocupações bobas. Obrigo as meninas a comerem todo o almoço.
Exijo que ponham os pratos na pia. A mais velha lava louça, a mais nova, às
vezes, seca (apenas os itens de plástico, já quebrou copos demais). Peço que
digam “por favor”, “com licença”, “obrigado”. Regulo tempo vendo televisão.
Cobro desempenho escolar. Não permito doce antes das refeições. Insisto para
que lavem as mãos e escovem os dentes. Sou chato! Terrível! O pior pai do
mundo!
Já
ouvi mais de uma vez, de diversas pessoas: “todo amor que meu pai não me deu
agora dá para meus filhos”. Os netos parecem ser a redenção para pais que
amaram de menos, trabalharam demais, foram duros e insensíveis. Agora se
derretem com os bebês dos filhos. “Devia ter sido mais relaxado”, parecem
dizer.
Tenho
medo que minhas filhas sejam fúteis, comprometidas apenas com o próprio bem
estar sem olhar ao redor. Tenho medo que valorizem o material, que não façam
bons amigos. Quero que sejam bem sucedidas na profissão que escolherem, é
claro, e não sofram desilusões amorosas. Sou estressado demais, sem dúvidas.
Preocupado demais.
Devo
ser menos pai e mais vô? Ou cada um tem a sua função? Devo estressar minhas
filhas para que sejam boas e cumprir minha função de avô mimando meus netos?
Terei netos? Ou ficarei esperando em vão o momento de amar crianças sem
preocupações, como aquele avô me disse ser possível?
Amor
de pai e mãe é cheio de culpa. Não sabemos nunca se estamos certos. Não sabemos
se estamos mimando demais ou abraçando de menos. Se estamos formando anjos ou
monstrinhos. Se seremos pais orgulhosos ou envergonhados. A insegurança nos
acompanhará por anos. Até que nossos filhos cresçam e nos mostrem onde erramos
e onde acertamos. Nossos netos serão nossa redenção.