"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



sábado, 20 de fevereiro de 2021

inimigos

 


O apelido de Maria Tereza, para Norberto, eraQuequinha’. Depois do casamento, sempre que queria contar para os outros uma de sua mulher, o Norberto pegava na sua mão, carinhosamente, e começava:

- Pois a Quequinha...

E a Quequinha, dengosa, protestava:

-Ora, Beto!

 

Com o passar do tempo o Norberto deixou de chamar a Maria Tereza de Quequinha. Se ela estivesse ao seu lado e ele quisesse se referir a ela, dizia:

- A mulher aqui...

Ou, às vezes:

- Esta mulherzinha...

Mas nunca mais Quequinha.

 

(O tempo, o tempo. O amor tem mil inimigos, mas o pior deles é o tempo. O tempo ataca o silêncio. O tempo usa armas químicas.)

 

Com o tempo, Norberto passou a tratar a mulher por Ela.

- Ela odeia o Charles Bronson.

- Ah, não gosto mesmo.

Deve-se dizer que o Norberto, a esta altura, embora a chama-se de Ela, ainda usava um vago gesto de mão para indicá-la. Pior foi quando passou a dizer ‘essa aí’ e a apontava com o queixo.

- Essa aí...

E apontava com o queixo, até curvando a boca com um certo desdém.

 

(O tempo, o tempo. Tempo captura o amor e não o mata na hora. Vai tirando uma asa, depois cura.)

 

Hoje, quando quer contar alguma coisa da mulher, o Norberto nem olha na direção. Faz um meneio de lado com a cabeça e diz:

- Aquilo...