Quando condeno a
infantilidade da maioria de nós, não estou me referindo a quem faz piadas e brincadeiras:
sem bom humor, não há quem aguente o rojão. Condeno é a falta de coragem.
Não criamos nossos filhos
para serem adultos, e sim para serem “felizes”, uma felicidade associada a
roupas, status, mordomia – quase nunca associada à educação, livros e
consciência. Dificilmente alguém se declara realizado por ter adquirido cultura
e conhecimento, mas se conseguiu comprar tudo o que sonhou, uau. Damos mais
valor a quem nos faz ganhar dinheiro do que a professores e artistas.
O Brasil tem duas
riquezas invejáveis: a natureza, pra começar. São 8 mil quilômetros de orla
marítima, a maior floresta do mundo, cânions, santuários, campos e montanhas
que são mais do que cartões postais: essa biodiversidade é que nos mantém
respirando e fornece nosso alimento. Sua preservação deveria ser uma causa de
todos. Isso é papo de comunista?
A segunda maior riqueza:
nossa arte (certeza: papo de comunista). Somos um povo abençoado pelo talento,
pela criatividade, pelo dom da palavra, da dança, de tudo que expressa nossa afetividade,
nossos ideais e o orgulho pelas próprias raízes (axé, Caetano, que manteve
quase 4 milhões de brasileiros ligados em sua live musical). Desde quando arte
é supérfluo? Existir em plenitude é também matéria-prima da nossa
sobrevivência. Cada artista dá voz, corpo e alma a uma sociedade que precisa se
manter arejada para renovar as ideias e as conexões mentais, nutrir-se,
expandir-se. Sem isso, resta o confinamento na bolha e a atrofia espiritual.
Mas crianções gostam de
mudança? Têm pavor, por isso se grudam na barra da saia dos militares, dos
pastores e dos caretas para evitarem os sustos que os tornariam adultos de
verdade. É assustador, sem dúvida, descobrir que somos diferentes uns dos
outros, que precisamos de filosofia e poesia mais do que de novelas, que sem
educação e leitura seremos sempre simplórios e manipuláveis, que conhecer e
respeitar todas as religiões é mais importante do que se apegar a uma só, feito
um escudo. É muito assustador abandonar a infância.
Adultos também têm medo,
como qualquer ser humano, mas não se deixam dominar por ele – ou não seriam
adultos. Apoiam os que têm propostas coletivas e abrangentes, escutam os outros
sem se deixar levar pelo moralismo, reconhecem que fazem parte de algo maior
que seu umbigo. Um adulto olha para os lados e enxerga o todo.
Uma criança, ao
contrário, quer ser única e mimada. Coleciona soldadinhos de chumbo e cultua
super-heróis. Quem tem coragem de crescer, põe os pés no chão, busca sua
independência e assume sua responsabilidade social, já uma criança se interessa
apenas em preservar seus brinquedos e só votará naquele que prometer aumentar
sua mesada.