Eles surgem em número
cada vez maior, principalmente nos finais de semana. Não que não deem o ar da
sua graça também nos dias úteis. Basta apenas que o sol se mostre, despudorado,
assim que nasce a manhã.
Nos parques, nas praças,
nas ruas, eles sentam ao sol, cuia em uma mão, celular na outra. A conversa
está tão boa que, distraídos, às vezes sorvem o celular e sorriem para a cuia,
apontada para uma selfie. Carentes de contato humano, sentam próximos uns dos
outros, bem próximos mesmo, ombro tocando ombro. Nada como aproveitar as
alegrias do convívio.
Eles caminham pelas ruas,
destemidos. Fazia tempo, foi um longo e úmido inverno. Agora, indiferentes a
recomendações e conselhos, aproveitam o prazer do vento nos seus rostos nus.
Tem maior atentado à moral e aos bons costumes que esse, nos dias de hoje?
Eles, os sem-máscara, sem
distanciamento e - porque vem junto no pacote - sem consideração pelos outros,
acham que o mundo ainda é aquele velho lugar que conheceram. Que o vírus é
invenção da China, coisa de comunista. E que basta usar vermífugo e remédio
para lúpus que tudo, tudo passa. Bem, nem todos pensam assim. Mas quem desistiu
da máscara merece ser colocado no mesmo saco.
Qual o problema em usar?
Ah, é que dói a minha
orelha. Meu filho, minha filha, tem modelos de todos os jeitos. Impossível que
um com a tira mais larguinha, ou mais elástica, ou que amarre atrás da cabeça,
impossível que não exista alternativa para a tua orelha. Deixa de frescura,
bota logo essa máscara porque, não demora, nós vamos chegar a 150 mil mortos.
Ah, é que me dá agonia,
não consigo respirar direito. Meu querido, minha querida, e por isso tu vais te
arriscar a contaminar geral, perdigotando na cara alheia? Conheço muita gente,
muita mesmo, que teve contato com a doença sem sintomas. Meu filho só soube por
que o exame sorológico acusou anticorpos. Para sorte dos outros, ele não pisa
fora da porta sem máscara. Deixa de ser egoísta, bota logo essa máscara porque,
não demora, nós vamos chegar a 150 mil mortos.
Ah, eu gosto de mostrar o
meu rostinho lindo para os outros. Meu cidadão, minha cidadã, manda selfies,
manda nudes, manda brasa no Instagram, mas bota logo essa máscara porque, não
demora, nós vamos chegar a 150 mil mortos.
Ah, eu sei que, no
tocante a isso daí, essa questão é só para criar pânico, para falir o comércio,
para acabar com a nossa indústria, coisa de alarmista, não passa de uma
gripezinha, um resfriadinho, quem tem histórico de atleta não sente nada e quem
pegar é bundão. Meu correligionário, minha correligionária, vírus não tem a ver
com política. Cada um acredita no que quiser - é o ônus da democracia, na boa
definição do Ciro Gomes -, mas a saúde pública não tem dois lados. Estamos
todos na mesma. Custa botar logo essa máscara porque, não demora, nós vamos
chegar a 150 mil mortos?
O pior é que alguns
países que já davam a conta por liquidada, viram, aparentemente do nada, o
surgimento de novos casos. Nova Zelândia e Espanha, por exemplo. De Hong Kong -
que tem pela China a mesma ojeriza que o inesquecível Weintraub - veio a
notícia de um possível caso confirmado e acompanhado de reinfecção. A coisa não
é brincadeira, é feia e vem se debruçando. Bota logo essa máscara porque, não
demora, nós vamos chegar a 150 mil mortos.
Meu consagrado, minha
consagrada: custa pensar um pouquinho nos outros?
Claudia Tajes