Um dos maiores problemas
de Bolsonaro é que ele se importa demais com o que a imprensa diz a seu
respeito. Ele queria ser amado pelos jornalistas, queria que todos o elogiassem
e o aplaudissem, mas não é assim que acontece, então ele se revolta, perde o controle
e fala besteira.
Nesta segunda-feira,
Bolsonaro estava se autoelogiando, lembrando do seu “histórico de atleta”, ao
que atribui o fato de ter se curado da covid-19, e então não se aguentou: teve
que assacar contra os jornalistas. Mandou: "Quando (a covid) pega num
bundão de vocês, a chance de sobreviver é bem menor".
Ou seja: morre de
covid-19 quem é bundão.
Diogo Mainardi, ao saber
da declaração de Bolsonaro, gravou um vídeo compassivo diante das águas da
Lagoa de Veneza. Lembrou que seu pai, Ênio Mainardi, morreu de covid-19, e
perguntou se tinha o direito de sentir vontade de socar a boca do presidente da
República, como o presidente da República disse ter vontade de fazer com um
jornalista naquele mesmo dia.
É evidente que Diogo
Mainardi, vivendo a dor de um filho que perdeu o pai, tem o direito de sentir
vontade de socar a boca de Bolsonaro. Familiares e amigos de outros 115 mil
brasileiros que morreram de covid devem estar sentindo o mesmo. Portanto, neste
exato momento, centenas de milhares, talvez milhões de brasileiros estejam
odiando Bolsonaro por uma única declaração absurda que ele fez.
Ainda assim, Bolsonaro
seguirá emitindo tolices, porque ele simplesmente não consegue entender que
falar em público é diferente de falar em particular, sobretudo quando quem fala
é presidente da República. Bolsonaro acredita que está sendo autêntico quando
ofende pessoas ou diz palavrões, e na verdade está sendo apenas grosseiro. Essa
grosseria faz com que ele seja criticado pela imprensa, o que o machuca e
provoca nova reação destemperada e nova crítica.
Está certo que todos os
presidentes se queixaram da imprensa. Todos. Lula chegou a sonhar com o que
chamava de “regulação”, um eufemismo para censura. Mas nenhum, nem os “impichados”
Collor e Dilma, nem o impopular Temer, nenhum se abalou tanto com a opinião dos
jornalistas quanto Bolsonaro.
É algo curioso, porque
Bolsonaro está cercado de bajuladores. Eles o chamam de “mito”, veja só. Eles,
exatamente como os lulistas, não conseguem ver nele nenhuma falha, como se
Bolsonaro fosse uma espécie de super-herói. Mas não é suficiente. Bolsonaro
anseia por um elogio mais do que todos os outros: o elogio dos jornalistas.
Ora, você não pleiteia o
afeto de quem despreza. Só lhe causa aflição a malquerença de quem você deseja.
Com o que, concluo que essa insistência de Bolsonaro em atacar jornalistas não
é ódio; é amor. Mas o amor dos espíritos primitivos, como o homem que, não
admitindo a rejeição da mulher, tenta matá-la: “Se você não vai ser minha, não
será de mais ninguém!” Para esse homem paleolítico, a mulher tem obrigação de
amá-lo tão somente porque ele quer - ele acha que tem méritos e que é dever
dela reconhecê-los. Se ela não reconhece, ela é que está errada.
Bolsonaro é assim.
Bolsonaro é um homem sem requintes. Em sua compreensão de mundo, ele acredita
que tem direito a todos os louvores. Ele olha para a imprensa cheio de angústia
esperançosa, ele quer aprovação, quer carinho, e só encontra censura. Então,
sofre. Sofre por amor. Bolsonaro ama a imprensa de uma forma como a imprensa
jamais foi amada. Compreendo a dor de Bolsonaro. É a dor que desatina sem doer,
é um descontentamento contente, é uma ferida que dói e que se sente, é o fogo
que arde sem se ver.
__David Coimbra