Amizade vai além do
momento.
É comum ser amigo de
contextos idênticos e se distanciar com os hábitos diferentes.
Quando você está
solteiro, o normal é fazer cumplicidade com quem frequenta festas e não se
apega a uma relação. Quando está casado, o normal é criar laços com outros
casais e privilegiar jantares e viagens. Quando está com filhos, o normal é
sair com quem também está conhecendo as manhas e as longas manhãs dos bebês.
Amizade verdadeira
ultrapassa a normalidade e o oportunismo do convívio.
Estas nem são amizades
verdadeiras, mas afinidades circunstanciais. São colegas de uma época, de uma
fase, de um estilo. Acabam unidos provisoriamente por um gosto, circunscritos a
uma vizinhança etária. Desaparecem diante de nossa primeira mudança, de nossa
primeira transformação de personalidade.
Permanecem quando há um
interesse imediato, um arranjo benéfico do cotidiano, e somem quando não existe
mais uma desculpa para se ver e se ouvir. Dependem de um pretexto para se
manter próximos.
Os conhecidos da academia
ficarão no passado dos halteres assim que cansarmos dos treinos.
Os conhecidos da
faculdade ficarão na lembrança do quadro ¬negro assim que nos formarmos. Os
conhecidos dos cursos de idiomas ficarão nos livros de exercícios assim que
dominarmos uma nova língua.
Amigo mesmo é o que não
experimenta uma fase igual e permanece junto. Quebra o espelho e não se machuca
com os cacos.
Amigo mesmo é o que não
tem filho e vem brincar com nossas crianças, não reclama dos gritos e dos
choros e não diz que “pela trabalheira, não pensa em ser mãe ou ser pai tão
cedo”. Não se justifica, está lado a lado qualquer que seja o cenário.
É aquele que se separou e
não amaldiçoa nossa paixão recente. É aquele que não tem emprego fixo e não
inveja o nosso sucesso. É aquele que não tem nenhum problema grave e escuta com
paciência e atenção as nossas lamúrias.
Não é o de empatia fácil,
feita de experiências semelhantes: só porque atravessa a fossa entende a nossa
fossa, só porque transborda de alegria festeja a nossa alegria. Amigo não dá
nem para contar nos dedos, pois sempre estará segurando nossa mão.