"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020



Mineiro é precavido.

Mesmo quando viaja de avião para o litoral, já vai de biquíni ou de calção por baixo das roupas.
Está na fila do embarque, disfarçado, com as peças prontas para o mergulho. Ainda que falte retirar a bagagem, embarcar em ônibus, ir para hotel, não quer perder tempo. Não duvido que não tenha passado protetor.
Ele se mata antes para poder relaxar depois e não pensar mais em nada. Só relaxa quando dá conta de todos os preparativos.
Com objetivo de evitar incomodações, incomoda-se de véspera.

Suas promessas não têm fim. Vive comprando briga com os calendários. E não muda de opinião em clima ruim. Põe uma coisa na cabeça e não aposenta a ideia até cumprir. As circunstâncias desfavoráveis não interrompem os seus sonhos e passeios.

Mineiro é o cauteloso teimoso, ansioso por natureza.
Tenta pagar as contas antes da data do vencimento, tenta guardar dinheiro para uma emergência, tenta organizar a mala uma semana anterior à partida, tenta aniquilar a carga do emprego com antecedência, tenta aliviar as demandas virando as madrugadas para não legar pendência aos colegas. Disputa, diariamente, uma corrida com a eternidade. Não pretende receber nenhum telefonema perturbando a sua folga.

Mineiro permanece adiantado um mês. Estamos em janeiro, ele já está em fevereiro. Há treze meses por ano para ele.

Por mais que eu esqueça algo para o veraneio, minha esposa Beatriz sempre se lembra antes de mim. Não tem graça. Não recordei do repelente, lá aparece ela com o produto. Não me ative com o cotonete, vem ela mostrar os palitos azuis em sua bolsa. Ela fez um sacolão na farmácia com o que poderíamos precisar e não precisar também. Trouxe um hospital junto para a praia, nos casos de gripe, febre, alergia, enjôo, enxaqueca, dor de barriga, bicho-de-pé, queimadura. Posso escolher a doença que ela providenciará a cura.
Há componentes inacreditáveis em sua nécessaire. Já surgiu com um saca-rolhas. Ou um coador para suco verde. Quem pensaria nisso?

É comum vê-la tirar coelhos de seu boné. Nem me espanto mais.