Gostar da própria solidão
é a manifestação mais clara de que chegou aos 40 anos. Não precisa mais sair de
casa para ser feliz, não é mais tributário do barulho e da multidão para se ver
acompanhado.
Gosta do silêncio e de
não fazer nada demais. Gosta do espaço vazio e da liberdade de não ter a agenda
cheia.
Passa a filtrar os
convites, a peneirar as festas, a abrir a porta para a rua somente quando
realmente é indispensável. Não sofre mais em dizer não. Prefere receber os
amigos em casa, em pequenos e semelhantes grupos, a virar a madrugada em
baladas com estranhos.
Dispensou o bordel dentro
de si. Tem como princípio sexo com qualidade, não mais pela quantidade. Não
está mais desesperado para transar toda noite, toda semana. Busca criar um
clima para o clímax, acima de tudo. A música de qualidade e a conversa
inteligente são preliminares indispensáveis antes de qualquer amasso.
Perdeu também a ganância
de enriquecer, o olho de águia do sucesso, opta por ganhar menos e se incomodar
menos.
Mudou a sua concepção de
prosperidade, paz é prosperidade.
O que fazia quando estava
gripado, de permanecer na cama lendo um livro ou emendando episódios de uma
série, agora ocupa a maior parte de seus dias sadios. Preocupa-se em aguar as
plantinhas, em aprender idiomas, em comprar verduras sem agrotóxico nas
feirinhas de bairro.
Nem para tomar vinho
acredita que depende de companhia. As quatro décadas revelam a satisfação de um
cálice sentado na varanda, sem ninguém para apressar os goles. Finalmente está
solto no seu mundo de pensamentos para degustar a safra e descobrir os taninos.
Sei que meus amigos
sopraram as 40 velinhas quando decidem se dedicar à cerveja artesanal. Largam
os botecos e a zona de desconforto da boemia pela produção caseira de sua
bebida. Ostentam experimentos e guardam as provas para limitados convidados.
São cientistas do isolamento, explicando, depois de cumprida a missão, o passo
a passo de sua incubadora com ostensivo orgulho.
Alguns encontram tempo
para maturar queijos, outros se aventuram a assar pães ou pizzas, com
sacerdócio de mestres-cucas. Se antes reclamavam da submissão doméstica das
mães e avós, que colocavam tortas a esfriar nas janelas, agora não acham nem um
pouco inconveniente o hábito de cozinhar, ainda que seja para o seu consumo.
Aliás, é simbólico nesta
faixa etária querer produzir a sua própria comida. A cozinha torna-se a parte
mais importante da residência, com aquisição de fornos potentes e panelas
inquebrantáveis.
O discernimento da
meia-idade surge com a renúncia. Entende-se que perder a agitação é ganhar
autoconhecimento. A experiência traz a clareza do que é bom e do que é ruim, de
que não vale realizar coisa alguma na contrariedade, de que nada mais será
feito para agradar ao outro.
Gostar-se é o início de
uma nova vida. Longeva vida, com a adrenalina da simplicidade.