A entrevista era
para uma rádio e foi dada por telefone, o que me salvou do vexame. Os ouvintes
não me viram fechando os olhos, franzindo o cenho, buscando no fundo do cérebro
a palavra que não vinha. Cheguei a dar dois soquinhos na testa, tentando acordar
alguém lá dentro. Não adiantava. Era um verbo básico, corriqueiro, desses que a
gente usa toda hora, mas desapareceu. E eu ali, com a frase pela metade, sem
conseguir concluir. Desesperador. Esse tipo de vacilo parece durar cinco
angustiantes minutos, e não apenas cinco segundos, que é o tempo que a gente
costuma levar pra buscar uma expressão substituta.
Nada a ver com
nervosismo ao falar em público. Acontece a mesma coisa quando estou tendo uma
conversa informal: na hora que a palavra vai sair pela boca, evapora. Fico
feito uma pateta, sem lembrar o que ia dizer. Outro dia, estava recomendando
uma profissional para uma amiga, e queria usar um adjetivo para valorizá-la. E
a droga do adjetivo não vinha. “Ela é muito... como diz? Muito... muito....
como diz quando a pessoa é... quando ela não faz....”
Minha amiga
tentava ajudar. “Muito econômica? Muito honesta?”
“Não, não... Ela
é muito....ah, caramba, como diz quando a pessoa é... quando não se.... quando
fica na dela... DISCRETA!!! Ela é muito DISCRETA!!!”
Essa era eu,
exaltada pela vitória. Minha amiga e eu rimos à beça, ela também tem seus
lapsos.
A senilidade,
dizem, é a causa dessa amnésia ocasional. Pode ser, aceito o diagnóstico sem
resmungar, mas acho que, no fundo, é cansaço. A gente passa a vida dando
explicação, emitindo opiniões, tentando se fazer entender. Lá pelas tantas,
esgota. Tenho procurado falar menos e escutar mais, não por ser magnânima, mas
por pura preguiça. Não tenho mais energia para provocar discussões ou
prolongá-las. Já não me entusiasma fazer alguém mudar de ideia, buscar
argumentos para convencê-la disso ou daquilo. Muito esforço. O silêncio nunca
me pareceu tão confortável.
Assim sendo,
aproveitando que ando mais relaxada, meu vocabulário anda disperso. Às vezes,
quando estou conversando com alguém e começo a contar uma história, não
encontro um determinado verbo na ponta da língua, onde ele deveria estar. Não
sei onde se mete. Some junto com algum substantivo.
Deve acontecer
com você também, de vez em quando. Não chega a ser grave, mas é... como que
diz... é... ah, meu Deus... é.... CONSTRANGEDOR! Isso, constrangedor. Então,
por via das dúvidas, ando reduzindo as atividades em frente ao microfone e me
afastando de plateias numerosas. Para evitar fiascos, já que estou sendo
paulatinamente abandonada pelas palavras, logo por elas. De escritora para
ex-critora, em breve. Sem drama, continuemos a rir.