Minha irmã descobriu um
câncer de mama há exatamente um ano. Acompanhamos de perto todo o tratamento,
as quimioterapias, o enjoo, a queda de cabelo. A imunidade baixa nos apavorou,
às vezes, reações alérgicas nos assustaram. Tratamento hormonal e algumas sessões
de radioterapia, fechamos um ano com o tumor sumido. Bye, bye tumor.
O cabelo da minha irmã
vai voltar a crescer, você não. Como diz minha irmã, “vamos sambar na cara do
câncer!”. Ela fala isso mas eu não gosto que ela fale essas coisas, porque
obviamente tenho medo do câncer, um dia, voltar. Mas ela fala essas coisas com
surpreendente positividade, e acho que isso foi fundamental para o sucesso do
tratamento.
Pra todos nós, foi um ano
nervoso, de muitas lições. Aprendemos a estar mais juntos, a valorizar mais a
vida. Todo mundo resolveu fazer uma bateria de exames, coisa que a gente não
fazia há anos. Aprendemos a admirar o tempo juntos. Nos falamos mais,
declaramos mais nosso amor uns pelos outros. Essas coisas, no momento de dor,
se tornaram mais fortes. O que aprendemos durante o sofrimento fica pra sempre.
Contudo, ninguém sofreu
mais do que minha mãe. O coração de uma mãe que sente a possibilidade de perder
um filho não se recupera fácil. Ainda hoje, minha mãe chora ao falar da
descoberta do tumor. Já faz um ano, mas ela repete: “Eu queria que tivesse sido
comigo. Não me conformo”. Uma mãe não aceita que nada de ruim aconteça aos
filhos. Deseja a própria morte, nunca a dos seus. Uma mãe não se conforma com a
ingratidão do acaso. “Que fosse em mim”, ela diz.
Mal sabe ela que nós
sentimos o mesmo. Sei que vai acontecer um dia, mas não poderia perder minha
mãe. Sofreríamos todos muito mais. Preferimos que seja conosco. Nos unimos, nos
tratamos, superamos. Mas perder nossa rocha, nosso norte, seria muito grave.
O amor de família é uma
força irracional. São essas cordas imaginárias que nos mantêm unidos,
conectados mesmo a distância, esbarrando nas imprevisibilidades da vida.
Celebrando nossas risadas e lágrimas em conferências por vídeo. Brindando com
um vinho barato, cada um na sua cidade, a dádiva que é estar vivo. Pensando
sempre uns nos outros. Pensando sempre uns nos outros. É o que chamam de
família.