Oba, amanhã é dia de
faxina! Esse é o comentário entusiasmado de quem deixou 17 copos sujos na pia,
de quem não se deu o trabalho de desvirar o vaso de terra que foi derrubado
pelo gato no tapete da sala, de quem deixou marcas de dedos no vidro da janela
e o pó acumulando no canto dos móveis.
Oba, amanhã é dia de
faxina! É o brado dos que largam jornal velho na área de serviço, dos que
varrem os farelos do pão pra baixo do balcão da cozinha e dos que não passam
nem um papel toalha no fogão depois de um fim de semana de frituras.
Oba, amanhã é dia de
faxina, diz o dono de um sobrado num domingo à noite, ao perceber a semelhança
do seu pátio com uma avenida após a passagem de um bloco de Carnaval. Oba,
amanhã é dia de faxina, exclamam duas preguiçosas que dividem um apê e que não largam
o celular nem para recolher os fios de cabelo grudados no ralo do box ou para
procurar a tarraxinha do brinco que escorregou para baixo da cama. Uma
faxineira na segunda-feira equivale a uma fada madrinha, a uma visita de Nossa
Senhora.
Medo! Amanhã é dia de
faxina!
Medo? Também. A impecável
faxineira deixará tudo brilhando, sem vestígios do churrasco que o patrão fez
para 20 amigos e sem vestígio do desleixo das duas molengas que não levantaram
da cama no domingo. A faxineira encontrará a tarraxinha e deixará o apartamento
um brinco. Ficará tudo tinindo e fora de lugar. É esse o drama: depois que ela
se vai, a casa parece outra.
Você retorna à tardinha,
depois de um dia de trabalho, e está tudo quieto. O desengordurante com aroma
de flores silvestres deixou um cheirinho de limpeza no ar, mas o caderno de
anotações em cima da sua escrivaninha desapareceu. O porta-retratos com a foto
da sua mãe estará na quinta prateleira da estante e não na terceira. Sua pedra
espetacular trazida do Marrocos foi jogada no lixo. Os fios do seu equipamento
de som foram desconectados - nem o cabo do seu roteador escapou, você está
offline.
As fronhas foram
colocadas do lado invertido, os copos foram guardados em algum lugar
misterioso, os tapetes estão trocados e sua escultura do Buda foi parar no hall
de entrada - ficou melhor ali, admita: sua funcionária tem tino para decoração.
Oba, faxina! Exclamação
dos que ainda podem se dar ao luxo dessa ajuda. Mas o medo ronda aqueles que
sofrem ao perceber que a caixa de fósforos não estará na gaveta habitual, que
não suportam ver seus livros dispostos de outro jeito, que ficam fulos ao ver
que o violão foi colocado no armário em vez de encostado na parede. Cadê o
respeito pela nossa bagunça tão familiar? Quem somos nós sem nossos
desarranjos? Quem pode compreender a ordem da nossa desordem? Não é hora de
filosofar, e sim de descobrir onde a maluca enfiou o gato.