Recebi, por e-mail, um
convite para um evento literário. Aceitei, e logo a moça que me convidou pediu
meu número de whatsapp para agilizar algumas informações. No dia seguinte,
nossa formalidade havia evoluído para emojis de coraçãozinho. No terceiro dia
ela iniciou a mensagem com um “bom dia, amiga”. Quando eu fizer aniversário,
acho que vou convidá-la pra festa.
Postei no Instagram a
foto de um cartaz de cinema e uma leitora deixou um comentário no direct. Disse
que vem passando por um drama parecido com o do filme, algo tão pessoal que ela
só quis contar pra mim, em quem confia 100%. Como não chamá-la para a próxima
ceia de Natal aqui em casa?
Fotos de recém-nascidos
me são enviadas por mulheres que eu nem sabia que estavam grávidas. Mando
condolências pela morte do avô de alguém que mal cumprimento quando encontro
num bar. Acompanho a dieta alimentar de estranhos. Fico sabendo que o amigo de
uma conhecida troca todos os dias as fraldas de sua mãe velhinha, mas que não
faria isso pelo pai, que sempre foi seco e frio com ele — e me comovo, sinto
como se estivesse sentada a seu lado no sofá, enxugando suas lágrimas.
Mas não estou sentada a
seu lado no sofá e nem mesmo sei quem ele é, apenas li um comentário deixado
numa postagem do Facebook, entre outras milhares de postagens diárias que não
são pra mim, mas que estão ao alcance dos meus olhos. É o reino encantado das
confidências instantâneas e das distâncias suprimidas: nunca fomos tão íntimos
de todos.
Pena que esse mundo fofo
é de faz de conta. Intimidade, pra valer, exige paciência e convivência, tudo o
que, infelizmente, tornou-se sinônimo de perda de tempo. Mais vale a
aproximação ilusória: as pessoas amam você, mesmo sem conhecê-la de verdade. É
como disse, certa vez, o ator Daniel Dantas em entrevista à Marilia Gabriela:
“Eu gostaria de ser a pessoa que meu cachorro pensa que eu sou”.
Genial. Um cachorro
começa a seguir você na rua e, se você der atenção e o levar pra casa, ganha um
amigo na hora. O cachorro vai achá-lo o máximo, pois a única coisa que ele quer
é pertencer. Ele não está nem aí para suas fraquezas, para suas esquisitices,
para a pessoa que você realmente é: baste que você o adote.
A comparação é meio
forçada, mas tem alguma relação com o que acontece nas redes. Farejamos uns aos
outros, ofertamos um like e de imediato ganhamos um amigo que não sabe nada de
profundo somos nós e provavelmente nunca saberá. A diferença – a favor do
cachorro – é que este está realmente por perto, todos os dias, e é sensível aos
nossos estados de ânimo, tornando-se íntimo a seu modo. Já alguns seres humanos
seguem outros seres humanos sem que jamais venham a pertencer à vida um do
outro, inaugurando uma nova intimidade: a que não existe de modo nenhum.