Tive um pequeno
apartamento que vendi mobiliado, mas me aconselharam a retirar ao menos o
lustre, já que era uma peça que parecia rara. Então, lá fui eu retirar do teto
um lustre enorme e empoeirado, e até hoje ele anda pra lá e pra cá no bagageiro
do meu carro, pois não encontro tempo para ir a um antiquário. Cada vez que
abro o porta-malas, onde costumo transportar as sacolas do supermercado, me
deparo com o espaço ocupado pelo lustre e me pergunto: por que não o deixei para
o novo morador? Ganância, senhores.
Essa é uma pequena
história sobre arrependimento. Igual a essa tenho dezenas, todas tão
desimportantes quanto. Convites que não deveria ter aceitado, desabafos que eu
não precisava ter feito, e-mails escritos depois de três cálices de vinho, esse
tipo de coisa, bobeiras contumazes que não estragam nossa vida, apenas fazem
com que a gente se envergonhe por uns dias e acabe aprendendo mais sobre si
mesmo. Os poucos remorsos sérios têm a ver com relações afetivas e familiares
(a velha culpa: onde eu estava que não vi isso, não percebi aquilo?), mas,
ainda, tudo dentro da cota permitida de vacilos.
Arrependimentos nos
amadurecem e nos ajudam na correção de rota. Só se tornam um problema quando a
rota terminou, quando falta apenas meia-dúzia de curvas para a estrada chegar
ao fim.
Ninguém simpatiza com a
velhice avançada e motivos não faltam: doenças, falta de memória, perda da
autossuficiência e outros enguiços comuns a quem rodou bastante. Ainda assim,
doloroso mesmo é chegar tão longe e descobrir que entre os arrependimentos há
um, ou dois, ou vários que não foram desimportantes e, sim, cruciais.
Excetuando as pessoas que
confiam na vida eterna, para todas as outras, que acreditam apenas na vida
antes da morte, nada pode ser mais triste do que, no balanço final, descobrir
que abriu mão de um amor por causa de conveniências, que não foi amigo dos
filhos porque só pensava em si mesmo, que não realizou projetos pessoais por
causa de preguiça, que nunca arriscou uma guinada por causa de medos que agora
parecem sem sentido, que gastou seu tempo com gente idiota e hábitos herdados
de uma sociedade fútil, que não se permitiu conviver com pessoas diferentes por
preconceito.
Esse é o arrependimento
que não é uma bobeira contumaz, pois resulta numa secreta tragédia pessoal: o
desperdício de uma vida que poderia ter sido mais bem preenchida, mais
estimulante e com mais oportunidades de expansão.
Tem boa notícia no final
do texto? Tem. É sobre aquela meia dúzia de curvas que restam. Pode parecer
pouco, mas é o que se tem para hoje, e hoje é tudo o que importa.