“Pensando com mais
clareza, agora vejo que aquela relação foi a experiência mais fascinante que
vivi.” Oi?
Um ano antes, a mulher
parecia um trapo encardido, passava chorando pelos cantos, lamentando a má
sorte de ter se apaixonado por um Don Juan que só a humilhava e a fazia sofrer,
e agora aquela dilaceração toda se transformou na experiência mais fascinante
já vivida?
Sim. Qual o espanto?
Depois que o amor acaba,
entra em cena a isenção. Você não faz mais parte daquela encrenca. Está
desobrigada de administrar revezes, de procurar soluções para impasses, de
fazer parte de um jogo maluco de sedução. Não há mais adoração, esperança,
ódio, raiva, desapontamento. E não havendo nada, tampouco há interesse em
descredibilizar o outro para tentar manter o que resta da própria dignidade.
Não há mais risco. Ninguém mais precisa se salvar. Agora você pode, enfim,
avaliar o que aconteceu por outro ângulo.
Então, dali de onde ela
estava, de uma distância segura do passado, tudo se transfigurou.
O amor não era mais analisado pelo que havia sido, mas pelo que agora representava.
O amor não era mais analisado pelo que havia sido, mas pelo que agora representava.
O que antes era
dilacerante virou uma bela experiência anexada ao currículo. O que antes era
gigantesco foi reduzido a um tamanho médio. O que antes era definitivo virou
passageiro. O que antes era pra sempre encontrou um fim sereno.
Dimensionamos nossas
emoções de acordo com a potência do momento. Acreditamos nas definições que
costumamos dar ao que está sendo experimentado, usando com orgulho palavras
como “infinito”, “certeza”, “eterno”. Ficamos apalermados pelo vigor da
experiência, pelo absoluto das nossas sensações, até que, depois de um longo
tempo de crença, perde-se a aposta, o jogo termina e vamos para outra mesa do
cassino, onde tudo recomeça.
É quando o passado ganha
uma nova cara e uma nova definição. O que era desespero transfigura-se em
infantilidade, o que era perturbador torna-se risível, o que era intenso parece
frugal. Você acreditou que era personagem de um melodrama, era assim que
enxergava a história de dentro. Pulou para fora e agora só vê a parte amena, só
a beleza da sua inocência. Aquela não é mais você, aquilo deixou de ser um tour
de force, agora você se dá conta de que, quando se está no epicentro de um
acontecimento, tudo parece maior do que é.
Estando em meio ao
tsunami, é inevitável sofrer, emocionar-se, dilacerar-se, abraçar todos os
sentimentos inerentes àquele mergulho: não há como antecipar o amanhã, só
existe a asfixia do hoje. O consolo é lembrar que é só uma questão de tempo
para tudo acabar num leve e agradecido “valeu”.