De volta ao Brasil para
votar, depois de muito necessárias férias, que há séculos não tirávamos, entrei
num turbilhão que, de longe, mesmo com internet, não me parecia tão nocivo. Mas
foi pior do que eu pensava: raiva, ódio, insultos, calúnias, intolerância
absoluta, mentiras, dissolução de laços bem bonitos e dignos entre amigos e
família – por causa da política. Dos políticos. De nós mesmos, que nos tornamos
raivosos, intolerantes, capazes das mais loucas afirmações. Expressamos nessa
batalha muito de nossas mágoas e frustrações.
Mas, inesperadamente, no
Face, encontro uma imagem linda, comovente, quase irreal neste mundo que anda
pra lá de besta: uma camiseta, um elefante (meu bicho preferido), com flores
atrás de uma orelha, óculos coloridos, e a legenda (estou traduzindo): “Num mundo em que você pode ser qualquer coisa,seja gentil”. Ou, se quiserem, seja
bondoso. Tolerante. Humano.
A violência desde sempre
me assusta: não precisa ser a física, de um tapa, um empurrão, uma voz
alterada, mas a emocional, da acusação injusta, da invencionice maligna, da
desconsideração com humanidade, cortesia, e democracia – ah, a palavra tão
usada, mal usada, abusada.
Os que a defendem são
muitas vezes os mais intolerantes, arrogantes e ignorantes que não conhecem nem
medem o peso das palavras (dizia meu pai, “o pior burro é o burro falante”):
correto é só o que eu penso, bom é só o que eu faço, o resto é tudo bandido,
fascista, maldoso, ignorante, explorador de pobres e desvalidos, pisa em cima
da cultura, despreza a saúde etc, etc, etc. (Poderia ser uma linha inteira de
etcs.)
Basta refletir um pouco,
abrir olhos e orelhas, ver que estamos numa situação-limite. Este pobre país
nunca esteve tão por baixo, com tantos miseráveis, doentes não atendidos,
podridão em vez de saneamento (sem falar na podridão moral), desrespeito,
precariedade em vez de infraestrutura, cultura muito esquisita, e a maioria sem
saber o que pensar. Ou começando a pensar, o que é bom. Pois andam acontecendo
mudanças no país, e há quem comece a respirar: será mesmo, será?
Então resolvi hoje falar
dessa camiseta, desse elefantinho, dessa gentileza que deveria ser o habitual,
e acho que não é. Na maioria das vezes, em família, amigos, trabalho, não
acontece muito, e quando ocorre até nos admiramos: olha só, que cara educado, bondoso,
camarada. A gente se sente bem com ele, e não é artificial, nem imposto. O
beijo de bom-dia em casa, alguma indagação sobre como foi a noite, ou a festa,
ou como poderá ser a prova na escola, o novo amigo, ou o ombro que ontem doía
tanto. Pequenas, miúdas coisas que fazem a vida, uma vida boa, uma vida humana
como deveria ser: pausas para respirar, para se olhar, para escutar... para
reencontrar com prazer.
Claro que a vida não é
esse mar de rosas e risos. Mas pode ser, muito mais vezes do que tem sido.
Podemos tentar viver e conviver, e votar, e torcer, e trabalhar, estudar,
viajar, comer, dormir, sem o incrível estresse da raiva, do xingamento, do
insulto, e dos maus desejos e da desinformação fatal.
Viva o elefantinho que
nos propõe: neste vasto mundo em que você pode fazer tantas coisas, seja
bondoso, seja gentil. Be kind.