Quantos e-mails escrevi e não enviei?
Quantas mensagens pensei, suspirei, coloquei a mão direita na
consciência e a mão esquerda no coração e deletei?
Quantas cartas feitas longamente, dolorosamente e, ao cabo,
desisti da palavra?
Quantas declarações, juras, perdões, explicações e
retratações nunca encontraram o seu destino e a paz do outro lado?
Quantas vezes escrevi e desisti, apontei o lápis da pupila,
gastei os punhos e recuei, vi que as frases não fariam efeito, o que foi dito
pessoalmente não vingaria na tinta e na tela?
Quantas madrugadas passei em claro escolhendo os vocábulos, e
não fui melhor que o silêncio?
Quantos momentos a esperança não falou mais alto e declinei
de acrescentar qualquer sopro de gentileza em uma relação?
Quantos tormentos desapareceram com as fotografias verbais e
a minha esperança?
Quantos escritos -
intuo que inúmeros, dezenas - que joguei
fora por me enxergar inteiramente desanimado para qualquer tentativa?
Quantos WhatsApps estive digitando sem fim e não apareceu o
que desejo dizer para o contato?
Escrever e apagar, ensaiar e cancelar, bailar com o corpo
encostado no verbo e esconder o rosto no travesseiro.
Ainda questiono se não ter mandado nada em horas cruciais da
minha existência foi coragem ou covardia - às vezes covardia é falar de menos e
não expor o que se está passando, às vezes covardia é falar demais e machucar
sob o pretexto da sinceridade.
Guardo sérias dúvidas se responder não seria uma vaidade do
sofrimento, pois não tem graça sofrer sozinho e cultivamos uma esquisita mania
de arrumar culpados para aquilo que não deu certo.
Eu também raciocino que não adianta escrever para ofender ou
por se sentir ofendido, porque o destinatário somente lerá as primeiras linhas
e deduzirá o resto.
Quantos novos eus surgiriam se teclasse enviar, se insistisse
na fúria e na paixão, se fosse menos cerebral e mais sanguíneo?
Quantas confissões coloquei no papel e afastei repentinamente
dos olhos alheios?
Quantas mentiras desfrutei da chance de desmanchar e me
retrai na culpa e não despachei adiante?
Quantos textos desesperados que jamais sairão do bloco de
notas, quantos arquivos moribundos, salvos com nomes esdrúxulos, estão
abandonados na pasta Meus Documentos?
Quantos desentendimentos e ódios poderia desatar se confiasse
no destino, mas quantos igualmente escândalos e barracos teria provocado com a
cabeça quente?
Mal-me-quer, bem-me-quer, nunca preveremos qual será o
preconceito que emergirá das verdades. As opiniões mudam conforme os pecados.
O que acredito é que para algum lugar vão as cartas que
redigimos e não mandamos. Elas devem
ficar registradas em um ponto remoto de nossa memória, de nossa carne, de nossa
carnação, em algum lugar dos desacontecimentos acontecidos.
Alguém lê. Mesmo que seja Deus. Mesmo que seja a minha
versão avançada no inconsciente.
Só não enviei por um motivo, uma crença na vida: ninguém tem
a obrigação de me amar. E pressionar e convencer são ações que apagam todo o
charme espontâneo do amor.