A gente não tem como saber se vai dar certo. Talvez, lá
adiante, haja uma mesa num restaurante, onde você mexerá o suco com o canudo,
enquanto eu quebro uns palitos sobre o prato — pequenas atividades às quais nos
dedicaremos com inútil afinco, adiando o momento de dizer o que deve ser dito.
Talvez, lá adiante: mas entre o silêncio que pode estar nos esperando então e o
presente — você acabou de sair da minha casa, seu cheiro ainda surge vez ou
outra pelo quarto –, quem sabe não seremos felizes? Entre a concretude do beijo
de cinco minutos atrás e a premonição do canudo girando no copo pode caber uma
vida inteira. Ou duas.
Passos improvisados de tango e risadas, no corredor do meu
apartamento. Uma festa cheia de amigos queridos, celebrando alguma coisa que
não saberemos direito o que é, mas que deve ser celebrada. Abraços,
borrachudos, a primeira visão de seu necessaire (para que tanto creme, meu
Deus?!), respirações ofegantes, camarões, cafunés, banhos de mar – você me
agarrando com as pernas e tapando o nariz, enquanto subimos e descemos com as
ondas — mãos dadas no cinema, uma poltrona verde e gorda comprada num
antiquário, um tatu bola na grama de um sítio, algumas cidades domesticadas sob
nossos pés, postais pregados com tachinhas no mural da cozinha e garrafas
vazias num canto da área de serviço. Então, numa manhã, enquanto leio o jornal,
te verei escovando os dentes e andando pela casa, dessa maneira aplicada e
displicente que você tem de escovar os dentes e andar ao mesmo tempo e saberei,
com a grandiosa certeza que surge das pequenas descobertas, que sou feliz.
Talvez, céus nublados e pancadas esparsas nos esperem mais
adiante. Silêncios onde deveria haver palavras, palavras onde poderia haver
carinho, batidas de frente, gritos até. Depois faremos as pazes. Ou não?
Tudo que sabemos agora é que eu te quero, você me quer e
temos todo o tempo e o espaço diante de nossos narizes para fazer disso o
melhor que pudermos. Se tivermos cuidado e sorte – sobretudo, talvez, sorte —
quem sabe, dê certo? Não é fácil. Tampouco impossível. E se existe essa
centelha quase palpável, essa esperança intensa que chamamos de amor, então não
há nada mais sensato a fazer do que soltarmos as mãos dos trapézios, perdermos
a frágil segurança de nossas solidões e nos enlaçarmos em pleno ar. Talvez nos
esborrachemos. Talvez saiamos voando. Não temos como saber se vai dar certo — o
verdadeiro encontro só se dá ao tirarmos os pés do chão –, mas a vida não tem
nenhum sentido se não for para dar o salto.
Antonio Prata