(...) Nem todos sabem como surgiu esta prática de guardar o
estômago para os prazeres oriundos do mar ou das afamadas receitas portuguesas
quando o assunto é bacalhau.
É certo que não há, nas sagradas escrituras, nenhuma norma ou
referência que regulamente o consumo de peixes nesta época do ano. Da mesma
forma como é fácil compreender a jogada comercial que motivou a prática.
Na virada do século XV para o XVI o Vaticano financiava boa
parte das grandes expedições marítimas. Para tanto associou-se a vários reis e
rainhas católicos, em particular da Espanha e Portugal. Nos novos continentes
descobertos, seu quinhão estava assegurado — a peso de muito ouro e enormes
propriedades.
É nesta época que, de repente, a Igreja cisma de decretar
que, em reconhecimento ao sofrimento de Cristo, os fiéis não poderiam consumir
carnes “quentes” ou “vermelhas” durante a Quaresma.
O que nem todos sabiam é que o Vaticano, na verdade, era proprietário
da maior frota bacalhoeira — caravelas para a pesca do bacalhau que levavam os
“dóris”, barcos a remo nos quais os pescadores (bacalhoeiros) se lançavam ao
mar para a pesca.
Seus armazéns ficavam abarrotados e era preciso escoar
regularmente a mercadoria antes do vencimento dos prazos de validade (afinal,
peixe salgado também estraga porque o sal se desfaz a baixas temperaturas
durante o inverno).
Assim, visando a maximizar seus lucros, espertamente os
padres proibiram o consumo de outros tipos de carne durante a Quaresma. Não deu
outra: as vendas de bacalhau explodiram, já que o alimento era apreciado nas
camadas populares europeias, sobretudo portuguesas, por ser nutritivo e barato.
Os ricos e nobres continuaram mandando brasa nos seus faisões.
__Luis Nassif