Texto de Nathalí Macedo
Acordei um pouco cansada. Cansada de segurar o choro, de
contar as novidades, de sorrir para parecer que está tudo bem. Cansada de ser
forte.
Dormi nua. Tirei as roupas e as máscaras junto com elas, mas
precisei de as voltar a colocar pela manhã; umas calças meio rasgadas, uns
sapatos confortáveis e um disfarce de pessoa feliz, feliz a tempo inteiro.
Alguém que tem a obrigação de ser agradável.
Passei a pensar demasiado sobre o mundo. Isso é um pouco
arriscado porque passamos a entender demais e uma vez desvendadas certas
coisas, não dá para voltar atrás. Talvez a ignorância seja mesmo uma bênção,
não nos apercebermos da crueldade com que eventualmente o mundo é capaz de nos
tratar.
Acordei um pouco cansada das minhas próprias escolhas. Apenas
por hoje não quero decidir absolutamente nada (açúcar ou adoçante, kizomba ou
rock’n roll, bom dia ou foda-se?).
Não quero ser compreendida. É só mais uma obrigação que dá
imenso trabalho. Apenas por hoje, não me vou esforçar para ser amada ou para
agradar aos outros. Que nada seja dito ou pensado a meu respeito: hoje só me
resta existir.
Acordei um pouco perdida em relação aos smartphones, às
pessoas, à confusão urbana que estranhamente se confunde com a minha própria
confusão. Não vou escolher uma playlist: toquem o que quiserem. Não vou pensar
sobre as pessoas: sejam exatamente o que quiserem. Hoje, apenas por hoje, não
quero conclusões.
Quero passar despercebida, como numa capa de invisibilidade
mágica. Quero quase não existir até conseguir ajustar-me a esse medo de ser
eternamente desajustada. Não quero prazos ou compromissos ou sorrisos ou
explicações. Apenas por hoje quero coexistir passivamente e sem qualquer
indício de indignação. A minha alma precisa de férias.