"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



sábado, 26 de dezembro de 2015

a mãe e o Natal


A mãe, em um impulso de coragem – ou de insanidade – se ofereceu para receber a família em casa no Natal.
A mãe passou o dia espirrando porque teve de resgatar seis caixas de decoração natalina que estavam soterradas em um ano de poeira na prateleira de cima do guarda roupas.
A mãe teve de se segurar para não acertar a mão na cara do infeliz que roubou a vaga dela no shopping.
A mãe ficou furiosa com a moça que roubou a vez dela na fila da loja de brinquedos, que mais parecia a faixa de Gaza.
A mãe teve que ser retirada pelo segurança da loja de roupas, porque ela ameaçou a vendedora com um cabide.
A mãe teve que ser consolada pelo verdureiro na feira quando a sacola dela estourou e os tomates saíram rolando ladeira abaixo.
A mãe abraçou o verdureiro como se fosse seu pai quando os tomates foram atropelados por um caminhão.
A mãe desejou que sua sogra fosse um tomate quando ela chegou e começou a dar pitaco na ceia.
A mãe rezou por sua integridade física quando seus sobrinhos chegaram.
A mãe, na verdade, rezou pela integridade física deles.
A mãe começou a fazer seu risoto com vinho branco muito concentradamente.
A mãe teve que pedir pra que o pai fosse ao mercado comprar mais vinho, porque ela bebeu meia garrafa quando os meninos quebraram o segundo vaso.
A mãe chorou feito criancinha quando, na hora de se arrumar, acertou o olho direito com o pincel do rímel.
A mãe quase voou por cima da mesa quando as crianças começaram a guerra de maionese.

A mãe, depois dessa odisseia, deitou a cabeça no travesseiro, feliz por ver toda a família junta e se divertindo e concluiu que aquele foi um Feliz Natal.