Breu, meu
eu, Deus meu
Alguém
chamou minha mãe e não pediu a mim
Alguém de
algum Deus, algum querubim
Retirou-a
de cena sem a minha permissão
Alguém
arrancou-me o umbigo sem falar comigo
Algum, de
alguma misteriosa verdade, puxou-lhe o fio da vida,
A echarpe,
a pipa, a idade.
Alguém
anjo a levou pra compor outro coral
Alguém roubou
de mim a sua voz e a sua música que era o meu melhor vento
Adeus
moqueca, adeus corvento,
Alguém
levou meu mundo, meu invento, minha bruxa boa, meu unguento
Eu tô
ainda de vestido azul de bolinha, calcinha de babado, sentada na calçada,
sozinha
Minha mãe
não está na cozinha, no piano, na aula, na vizinha
Alguém
badalou meia-noite e a Cinderela virou açoite, pernoite
É breu,
Deus...
um buraco
fundo, um vão sem chão, o infortúnio
Eu quero
ao menos que, ao morrer o criador, não se vá também a criatura.
Está
escuro, quero luz, dá-me a luz...
Alguém
desatarraxou daqui minha lâmpada maravilhosa
Agora não
posso mais ter febre;
agora
ninguém mais reza e não há compressa;
agora eu
estou com pressa.
sexta-feira, 14 de abril de 2023
Marcadores:
Elisa Lucinda