Se a gente cultiva o bom, o belo, o amoroso – dentro do
possível –, do resto, nestes dias, o país e o mundo se encarregam. Escrevi
aqui, postei no Face, acredito nisso, e me esforço. Mas, vamos admitir, difícil
não dar bola para o noticiário cada dia mais espantoso. Não que a mídia seja
isso, como diria o Trump, ao contrário; percebo jornalistas quase engasgados ou
suspirando ao dar uma lista de loucuras que nos ameaçam, talvez mais do que nós
mesmos supomos.
Mas alienação demais me causaria culpa, este é um momento
esquisito mesmo: calor sufocante, inesperadamente nuvens cor de chumbo fazendo
carrancas no céu, trovoada, chuvarada, ventania e... dourado e azul de novo
rindo de nós. Talvez a mãe natureza também esteja rangendo os dentes. Talvez
isso venha ocorrendo a cada tantos milhares ou milhões de anos, pois sabemos
que as eras glaciais e infernais se alternaram no planeta desde que planeta ele
é. Não me crucifiquem os ambientalistas: sim, eu acredito que nós, predadores e
alienados, atualmente estejamos influindo nisso.
Seja como for, não quero desfiar a ladainha de horrores
políticos que nos afrontam.
(...)
O problema é que crise, empobrecimento, insegurança, cabeças decapitadas, conhecidos assaltados ou mortos logo ali, por exemplo, são coisas muito, muito humanas.
(...)
O problema é que crise, empobrecimento, insegurança, cabeças decapitadas, conhecidos assaltados ou mortos logo ali, por exemplo, são coisas muito, muito humanas.
Desemprego? Humano demais. Pior é que a tudo isso se acrescenta
uma paulatina, cada vez mais evidente, apatia. (...)
Onde a indignação? Onde os panelaços? Onde ruas cheias de manifestantes? Onde o entusiasmo na esperança de conseguirmos mudar alguma coisa?
Onde a indignação? Onde os panelaços? Onde ruas cheias de manifestantes? Onde o entusiasmo na esperança de conseguirmos mudar alguma coisa?
E isso, gente, é o mais triste: a sensação de que não
adianta. Porque perdeu-se aqui no Brasil o mais precioso bem, talvez, da
espécie humana, por mais louca que ela ande: o pudor. A vergonha. Políticos ou
outras autoridades que cometessem alguma gafe séria, ou apresentassem propostas
escandalosas, quase criminosas, costumavam sumir por algum tempo, até que, já
que temos curta memória, voltavam ao cenário lampeiros e faceiros. Agora,
ninguém parece se constranger nem das coisas mais loucas.
Acusados, investigados, delatados, denunciados, presos, ou
que deviam estar presos, se apresentam, esbravejam, repetem incansavelmente que
não sabem de nada, são inocentes, é tudo maldade alheia (ainda não acusam a
mídia como o Trump, mas nunca se sabe quando vão começar). E assim, teimando em
curtir e cultivar o belo, o bom, o amoroso que existem na natureza, na arte e
nas pessoas (não todas, claro), ainda resisto à descrença total que ronda meus
calcanhares, bafeja irônica e sarcástica, rosnando que eu deixe de ser boba,
deixe de postar flores e borboletas e de escrever frases clara ou vagamente
otimistas.
Resisto mais ou menos, entre ânimo e desolação, porque num canteiro
prefiro as flores ao adubo... Mas que está tudo muito esquisito, ah, isso está.