Então é Natal... Em vez dos votos tradicionais, deixo aqui um texto que não é específico sobre a noite feliz, mas que traduz o espírito com que devemos levar a vida hoje, amanhã e todos os dias. Handle with care. Trate bem dos seus mais caros presentes: as pessoas que estão perto de você.
Trégua, risos e tim-tim!
Certamente você já leu a frase que acompanha o aviso
“Fragile” em embalagens que chegam do exterior. Duas mãos espalmadas circundam
uma caixinha e a etiqueta diz: Handle with care. Manuseie com cuidado.
Uma querida amiga que mora na Suécia me mandou um e-mail essa
semana dizendo que muitas pessoas deveriam ter este adesivo grudado no próprio
corpo. Eu diria que não apenas muitas: todas. Afinal, nada mais frágil que um
ser humano.
Costumamos tratar com delicadeza as crianças, por seu tamanho
e inocência, e os idosos, por sua vulnerabilidade física e por respeito, mas
quando se trata da vastíssima parcela da população que se situa entre esses
dois extremos, passamos por cima feito um trator desgovernado. A ideia geral é:
adultos sabem se defender.
Alguns sabem, outros menos. Todos nós recebemos vários
trancos da vida e acabamos desenvolvendo alguma resiliência e capacidade de se
regenerar, mas isso não quer dizer que não há dentro de nós algo que possa
quebrar de forma irreversível.
E quebra mesmo. Espatifa de forma a impedir a colagem dos
cacos. Handle with care.
Há por aí campanhas pregando mais gentileza e mais educação,
e assino embaixo, naturalmente. Mas elas têm um caráter superficial, induzem
apenas a gestos e atitudes corteses, como esperar alguém sair do elevador antes
de a gente entrar, dar bom dia a quem cruza por nós, desejar feliz Natal e boas
festas. Isso é tratar bem, não tratar com cuidado.
Tratar com cuidado significa se colocar no lugar do outro e
dimensionar o quanto uma estupidez pode machucar. Significa levar em
consideração as dificuldades de alguém a fim de não exigir demais de seus
sentimentos e posicionamentos. Significa compreender que a comunicação é
fundamental para o entendimento e a paz, e que atitudes bruscas podem ser mal
interpretadas. Significa honrar o laço construído e não colocar na intimidade a
desculpa para agredir – agressões não podem virar hábito da casa.
O que cada pessoa leva dentro? Sonhos que podem parecer
bobagem para os outros, mas que são sagrados para ela. Traumas que ainda não
foram superados e que doem a cada vez que são lembrados. Vergonhas inconfessas.
Feridas que custaram a cicatrizar e que basta um cutucãozinho para reabrirem.
Desejos que não merecem ser ridicularizados. Necessidade de ser amado e aceito.
Uma parte da infância que nunca se perdeu.
As pessoas gritam e rugem umas para as outras, quando não
fazem pior: ignoram umas às outras, como se todos fossem feitos de pedra, como
se todos estivessem protegidos por plásticos-bolha, como se a blindagem fosse
geral: é só mirar e atirar que não dá nada.
Dá sim. Pode não parecer, mas todo ser humano é um cristal.