Basta uma mulher manifestar certa amargura e logo surge
alguém para chamá-la, ofensivamente, de mal-amada. Pois então. É o que somos
todas, mal-amadas. E todos os homens são também. De Norte a Sul, formamos uma
população de mal-amados: o país não quer nada com a gente.
Desde que comecei a ter alguma noção de política (no meu
caso, quando entrei na faculdade), mantenho uma relação de desconfiança com o
Brasil. Sabia que ele havia feito sofrer muita gente antes de mim, um repressor
sádico, que torturava entre quatro paredes. Eu o amei quando criança porque não
o conhecia direito, até que cresci e ele pareceu crescer também,
democratizando-se e passando a fazer promessas que eram tudo o que alguém
apaixonado gostaria de ouvir.
O Brasil é um sedutor. No discurso, acena com reciprocidade.
Necessidades básicas atendidas. Direito de ir e vir, liberdade de expressão,
troca de ideias. Uma relação adulta, prazerosa, possibilitando que todos
evoluam juntos. O amor ideal.
Mas o Brasil fala muito e faz pouco. O Brasil promete e às
vezes chega perto de realizar nossos sonhos, mas logo reincide na cafajestada.
Não sai da adolescência. Vive se deixando levar pela lei do menor esforço,
querendo obter vantagens, sobrevivendo de conquistas rápidas e inconsistentes,
deslumbrado pelo próprio poder e esquecido de suas obrigações. Um gargantão que
às vezes dá a impressão de que virou gente grande, mas virou nada, é o mesmo
moleque de sempre.
Diante desse descompromisso explícito por parte dele, nasceu
nossa mágoa. O povo brasileiro, em sua maioria, hoje se comporta como quem
levou um fora. Como quem teve seu amor recusado. E daí para ficar rancoroso é
um passo.
A gente acreditou que iria dar certo. Acreditou que haveria
futuro, uma relação sólida e para sempre. Que o visual exuberante, esse país
tão belo, tinha também conteúdo, honestidade, ética, inteligência. Mas ficou só
no desejo, não rolou. Todas as brasileiras são mulheres de bandido. Todos os
brasileiros se envolveram com uma nação biscate. O Brasil não quer saber de
relacionamento sério. É crau e fim. Não telefona nem manda flores no dia
seguinte.
Cada um de nós ainda procura se apegar a algo que nos pareceu
bom no início da relação com o país – o que pareceu bom pra você? Os militares?
Sarney? Collor? Fernando Henrique? Lula? Deu em nada ou quase nada. Hoje
estamos todos nos xingando mutuamente, numa ânsia desesperada de apontar
culpados pela própria desilusão, sem perceber que temos algo profundo em comum:
o ressentimento. Uma tremenda dor de cotovelo. Somos todos vítimas de um amor
cívico que o país nunca retribuiu.