Diante dos fatos, a vergonha. Vergonha pelas alianças sem
critério, pelos acertos por baixo dos panos, pelos conchavos, pela desfaçatez
com a qual ninguém se constrange mais. Governantes cometem indecências para
garantir sua boquinha e a corrupção, que é a verdadeira inimiga de todos nós,
segue pouco discutida.
Como e quando a corrupção irá acabar?
Se a Lava-Jato fosse uma operação permanente de combate à
impunidade, a corrupção talvez diminuísse um pouco, pois sempre tem um ou outro
que amarela quando cogita ir para a cadeia. Mas o mais provável é que surjam
novos e sofisticados métodos de roubalheira – o ser humano é criativo. Será que
não existe um jeito de cortar a corrupção pela raiz?
O primeiro passo é lembrar qual é a raiz da corrupção: o
dinheiro.
O segundo passo é acreditar em conto de fadas. O empresário
Ricardo Semler deu uma ótima entrevista para a Globonews, em que declarou que
só há uma maneira de acabar com a corrupção no Brasil e no mundo: modificando
nossa relação com o dinheiro.
Talvez ele também acredite em príncipes e princesas, mas por
mais idealista que seja, não há como discordar. Por que as pessoas corrompem e
são corrompidas? Para obterem vantagens – quase todas envolvendo dinheiro ou
poder.
Em um mundo ideal (portanto, irreal), as pessoas receberiam
pelo seu trabalho um valor justo para garantir suas necessidades e estaria
ótimo assim. Se seu trabalho rendesse mais do que elas precisam, beleza – elas
teriam acesso a supérfluos, o que não é pecado, desde que esteja tudo dentro da
lei, sem precisar burlar contratos ou molhar a mão alheia. Se valorizássemos as
principais qualidades humanas, ninguém precisaria fazer besteira para parecer
mais importante do que é.
Como se mede a importância de alguém? Pela ética. Pela
compaixão. Pela honestidade. Pela competência.
Isso no reino da fantasia, pois aqui, neste mundo pirado e
competitivo, as pessoas medem a importância uma das outras por metro quadrado,
por cavalos no motor, por dólares no Exterior, por técnicas farsescas de
sedução, pelo que está escrito no cartão.
Não basta ter reais suficientes. Queremos realeza.
Mas em vez de nos sentirmos soberanos através do número de
amigos que fizemos, através da credibilidade conquistada, através de nossas
vitórias profissionais e emocionais, queremos é sentir o gostinho de estacionar
onde bem entender, de voar pelas estradas sem ninguém nos alcançar, de receber
tratamento VIP, de sermos vistos como diferenciados, criaturas acima do bem e
do mal. Para que esperar merecermos coisas boas da vida se podemos comprar as
extraordinárias?
A corrupção só terminará quando o dinheiro deixar de ser
usado para mascarar nossa miséria existencial.