Conversávamos sobre um amigo que ainda reluta sobre o que
gostaria de ser quando crescer quando a velha senhora liquidou o assunto: Pouca
vergonha. No meu tempo, aos 35 anos as pessoas já estavam com a vida resolvida.
O jovem rapaz em questão tem exatamente 35 anos, casou e se
separou, não tem filhos e está pensando em fazer outro curso na universidade,
já que não se adaptou à primeira profissão que escolheu. De fato, ele não está
com a vida resolvida.
Até pouco tempo atrás era assim, tínhamos um norte a seguir:
escolhíamos um par e um trabalho e, dali por diante, seríamos sensatos se não
trocássemos mais de rumo, gozando a aposentadoria dos desejos. Nunca mais se
preocupar com nada, apenas aproveitar a tal vida resolvida.
Havia quem simulasse direitinho a acomodação, mas se já
naquela época o apaziguamento não era tão bem resolvido assim, imagine hoje.
Hoje, minha senhora, a vida resolvida fica para depois que o
vivente bater as botas. Aí, sim, estará tudo resolvido, bem resolvido, três
palmos abaixo da terra. Antes, tem nada resolvido. Nada.
No fluir dos dias deste século 21, deixamos de ser
adolescentes indecisos para nos tornar adultos indecisos, mas vamos tateando,
vamos experimentando, que a palavra experiência é que tem justificado todas as
atitudes: a experiência de um hobby, de uma viagem, de um amor, de outro amor,
e de outro mais. A experiência de trabalhar com fotografia e depois trocar pela
experiência de trabalhar como professor de violoncelo, e então dirigir um
documentário sobre uma orquestra mirim. E depois abrir um restaurante
vietnamita, que logo fechará porque surgiu a oportunidade de viver uma
experiência botânica num parque no interior de Goiás. Sonhos prestes a se
realizarem até que outros sonhos chamem e novas experiências se descortinem: a
palavra movimento também está muito em uso, vale lembrar.
Experiência e movimento, dupla dinâmica – dinâmica mesmo –
que veio substituir casamento, família e profissão, o trio que amarrava o
cristão numa vida resolvida.
Bem vertiginosos, esses novos tempos em que é permitido
querer tudo e querer mais, em que ser considerado uma pessoa de confiança não
implica em criar raízes numa única cidade, e tampouco em ter uma única mulher
ou um único marido para sempre, mas alguns ao longo de uma vida longa. Filhos
do primeiro casamento, do segundo – e no terceiro, aleluia, a lua de mel
merecida, com os netos visitando de vez em quando. Inventam-se atividades
conforme a demanda: ainda haverá cursos profissionalizantes daqui a alguns
anos? A conclusão de uma faculdade será requisito fundamental para garantir um
futuro? Ainda existirá futuro ou o tempo se resumirá a um eterno presente,
renovável a cada segunda-feira?
Experiência, movimento.
A vida resolvida era segura, mas muito parada.