Temos dificuldade de captar a lógica da união de casais que vivem discutindo, brigando e se ofendendo. Não deciframos o motivo de permanecerem num casamento se é para sofrer. Não desvendamos o enigma após a sucessão de barracos, escândalos e quebradeiras. Cansam o senso comum, esgotam a paciência dos amigos, perdem o apoio dos familiares.
É que eles podem estar se amando pelo irracional. São
incompatíveis na aparência, mas inseparáveis na essência.
Encontram sua harmonia no sexo, na explosão física, quando se
beijam e se lambem e se entregam sem usar a cabeça, quando não analisam os
fatos, quando não interpretam o comportamento um do outro, quando relaxam das
amarras e censuras, quando depõem as armas e vaidades e esquecem a disputa da
razão e do certo e errado.
Quando se oferecem apenas pelo toque, pelo silêncio ofegante,
pela realeza dos ouvidos.
São melhores como bichos do que como homens. São melhores na
ausência de pensamento, no contato físico, primitivo, total, na comunicação não
verbal.
Eles se conectam pelo instinto, pelo cheiro, pela doação
selvagem.
Perante a sociedade, são divergentes. Entre quatro paredes,
convergentes.
Perante a sociedade, travam um duelo. Entre quatro paredes,
formam um dueto.
E são muito mais carinhosos pelo tato do que pela fala.
Neles, a pele une o que a palavra separa.
É uma quebra de padrão, pois estamos acostumados a enxergar o
irracional como sinônimo de agressividade e de violência.
Esses pares malucos, inadequados e inoportunos têm um
irracional afetivo, um irracional terno, um irracional amoroso.
Ríspidos e grosseiros na racionalidade, por sua vez, lá no
inconsciente, não se largam e se complementam. Demonstram um equilíbrio
perfeito na cama. Como se fossem dançarinos de longa data.
A separação será incompreensível como a própria convivência.
Porque são felizes em algum lugar desconhecido dentro deles.