Agosto, “mês de ventos fortes”. Em torno dele se formaram muitas superstições, de tal sorte que, o oitavo mês do ano, é hoje rodeado de muito folclore.
Muitas coisas importantes aconteceram neste mês do imperador Augusto: o primeiro homem foi eletrocutado numa cadeira elétrica; o suicídio de Getúlio; a morte de Juscelino; a renúncia de Jânio; a renúncia de Nixon à presidência dos Estados Unidos, o infarto de Neckyr.
Seja
como for, se você é desses (ou dessas) que vive injuriando este mês, segue uma crônica
de Caio Fernando Abreu, com algumas sugestões para atravessar agosto.
Ela
já foi publicada aqui e aqui, mas vale a pela ler de novo.
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Para atravessar agosto é preciso antes de mais nada paciência e fé. Paciência para cruzar os dias sem se deixar esmagar por eles, mesmo que nada aconteça de mau; fé para estar seguro, o tempo todo, que chegará setembro — e também certa não-fé, para não ligar a mínima às negras lendas deste mês de cachorro louco. É preciso quem sabe ficar-se distraído, inconsciente de que é agosto, e só lembrar disso no momento de, por exemplo, assinar um cheque e precisar da data.
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Para atravessar agosto é preciso antes de mais nada paciência e fé. Paciência para cruzar os dias sem se deixar esmagar por eles, mesmo que nada aconteça de mau; fé para estar seguro, o tempo todo, que chegará setembro — e também certa não-fé, para não ligar a mínima às negras lendas deste mês de cachorro louco. É preciso quem sabe ficar-se distraído, inconsciente de que é agosto, e só lembrar disso no momento de, por exemplo, assinar um cheque e precisar da data.
Para atravessar agosto também é necessário reaprender a
dormir. Dormir muito, com gosto, sem comprimidos, de preferência também sem
sonhos. São incontroláveis os sonhos de agosto: se bons deixam a vontade
impossível de morar neles; se maus, fica a suspeita de sinistros augúrios,
premonições. Armazenar víveres, como às vésperas de um furacão anunciado, mas
víveres espirituais, intelectuais, e sem muito critério de qualidade. Muitos
vídeos, de chanchadas da Atlântida a Bergman; muitos CDs, de Mozart a Sula
Miranda; muitos livros, de Nietzsche a Sidney Sheldon. Controle remoto na mão e
dezenas de canais a cabo ajudam bem: qualquer problema, real ou não, dê um zap
na telinha e filosoficamente considere, vagamente onipotente, que isso também
passará. Zaps mentais, emocionais, psicológicos, não só eletrônicos, são
fundamentais para atravessar agostos.
Claro
que falo em agostos burgueses, de médio ou alto poder aquisitivo. Não me
critiquem por isso, angústias agostianas são mesmo coisa de gente assim, meio
fresca que nem nós. Para quem toma trem de subúrbio às cinco da manhã todo dia,
pouca diferença faz abril, dezembro ou, justamente agosto. Angústia agostiana é
coisa cultural, sim. E econômica. Mas pobres ou ricos, há conselhos — ou
precauções — úteis a todos. O mais difícil: evitar a cara de Dilma Rousseff em foto ou vídeo, sobretudo se estiver “saudando a mandioca” ou discursando sobre “metas” que não existem e que serão dobradas. Esquecê-la tão
completamente quanto possível (santo zap!): Dilma, a “mulher-sapiens” agrava agosto*, e isso é tão
grave que vou mudar de assunto já.
Para
atravessar agosto ter um amor seria importante, mas se você não conseguiu, se a
vida não deu, ou ele partiu — sem o menor pudor, invente um. Pode ser
Natália Lage, Antônio Banderas, Sharon Stone, Robocop, o carteiro, a caixa do
banco, o seu dentista. Remoto ou acessível, que você possa pensar nesse amor
nas noites de agosto, viajar por ilhas do Pacífico Sul, Grécia, Cancún, ou
Miami, ao gosto do freguês. Que se possa sonhar, isso é que conta, com mãos
dadas, suspiros, juras, projetos, abraços no convés à luz da lua cheia, brilhos
na costa ao longe. E beijos, muitos. Bem molhados.
Não
lembrar dos que se foram, não desejar o que não se tem e talvez nem se terá,
não discutir, nem vingar-se ou lamuriar-se, e temperar tudo isso com chás, de
preferência ingleses, cristais de gengibre, gotas de codeína, se a barra pesar,
vinhos, conhaques — tudo isso ajuda a atravessar agosto. Controlar o
excesso de informação para que as desgraças sociais ou pessoais não deem a
impressão de serem maiores do que são. Esquecer o Zaire, a ex-Iugoslávia,
passar por cima das páginas policiais. Aprender decoração, jardinagem, ikebana,
a arte das bandejas de asas de borboletas — coisas assim são
eficientíssimas, pouco me importa ser acusado de alienação. É isso mesmo;
evasão, escapismos. Assumidos, explícitos.
Mas
para atravessar agosto, pensei agora, é preciso principalmente não se deter
demais no tema. Mudar de assunto, digitar rápido o ponto final, sinto muito
perdoe o mau jeito, assim, veja, bruto e seco.
*modificado
Texto original:
O
mais difícil: evitar a cara de Fernando Henrique Cardoso em foto ou vídeo,
sobretudo se estiver se pavoneando com um daqueles chapéus de desfile à
fantasia, categoria originalidade…
FHC agrava agosto...
FHC agrava agosto...