Dei pra me emocionar cada vez que falo dos
amigos. Deve ser a idade, dizem que a gente fica mais sentimental. Mas é fato:
quando penso no que tenho de mais valioso, os amigos aparecem em pé de igualdade
com o resto da família. E quando ouço pessoas dizendo que amigo, mas amigo
meeeesmo, a gente só tem dois ou três, empino o peito e fico até meio besta de
tanto orgulho: eu tenho muito mais do que dois ou três. São uma cambada. Não é
privilégio meu, qualquer pessoa poderia ter tantos assim, mas quem se dedica?
Fulano é meu amigo, Sicrana é minha amiga. É
nada. São conhecidos. Gente que cumprimentamos na rua, falamos rapidamente numa
festa, de repente sabemos até uma fofoca pesada sobre eles, mas amigos? Nem
perto. Alguns até chegaram a ser, mas não são mais por absoluta falta de
cuidado de ambas as partes.
Amizade não é só empatia, é cultivo. Exige
tempo, disposição. E o mais importante: o carinho não precisa - nem deve - vir
acompanhado de um motivo.
As pessoas se falam basicamente nos
aniversários, no Natal ou para pedir um favor - tem que haver alguma razão
prática ou festiva para o contato. Pois para saber a diferença entre um amigo
ocasional e um amigo de verdade, basta tirar a razão de cena. Você não precisa
de uma razão, basta sentir a falta da pessoa. E, estando juntos, tratarem-se
bem.
Difícil exemplificar o que é tratar bem. Se
são amigos mesmo, não precisam nem falar, podem caminhar lado a lado em
silêncio. Não é preciso troca de elogios constantes, podem até pegar no pé um
do outro, brigar talvez (e porque não!?) delicadamente.
Não é preciso manifestações constantes de
carinho, podem dizer verdades duras, às vezes elas são necessárias. Mas há sempre algo sublime no ar
entre dois amigos de verdade. Talvez respeito seja a palavra. Afeto, certamente. Cumplicidade? Mais
do que cumplicidade. Sintonia? Amor? Esta lengalenga de novo? Sério, só mesmo
amando um amigo para permitir que ele se atire no seu sofá e chore todas as
dores dele sem que você se incomode nem um pingo com isso.
Só mesmo amando para você confiar a ele o seu
próprio inferno. E para não invejarem as vitórias um do outro.
Por amor, você empresta suas coisas, dá o seu
tempo, é honesto nas suas respostas, cuida para não ofender, abraça causas que
não são suas, entra numas roubadas, compreende alguns sumiços - mas liga quando
o sumiço é exagerado. Tudo isso é amizade com trato.
Se amigos assim entrarem na sua vida, não
deixe que sumam. Porém, a maioria das pessoas não só deixa como contribui para
que os amigos evaporem. Ignora os mecanismos de manutenção. Acha que amizade é
algo que vem pronto e que é da sua natureza ser constante, sem precisar que a
gente dê uma mãozinha. E aí um dia, abrimos a mãozinha e não conseguimos contar
nos dedos nem dois amigos pra valer. E ainda argumentamos que solidão é um
sintoma destes dias de hoje, tão emergenciais, tão individualistas. Nada disso.
A solidão é apenas um sintoma do nosso
descaso.
20/07 - dia do amigo