É bom ter mãe quando se é criança, e também é bom quando se é
adulto. Quando se é adolescente a gente pensa que viveria melhor sem ela, mas é
um erro de cálculo. Mãe é bom em qualquer idade. Sem ela, ficamos órfãos de
tudo, já que o mundo lá fora não é nem um pouco maternal conosco.
O mundo não se importa se estamos desagasalhados e passando
fome. Não liga se virarmos a noite na rua, não dá a mínima se estamos
acompanhados por maus elementos. O mundo quer defender o seu, não o nosso.
O mundo quer que a gente fique horas no telefone, torrando
dinheiro. Quer que a gente case logo e compre um apartamento que vai nos deixar
endividados por vinte anos. O mundo quer que a gente ande na moda, que a gente
troque de carro, que a gente tenha boa aparência e estoure o cartão de crédito.
Mãe também quer que a gente tenha boa aparência, mas está
mais preocupada com o nosso banho, com os nossos dentes e nossos ouvidos, com a
nossa limpeza interna: não quer que a gente se drogue, que a gente fume, que a
gente beba.
O mundo nos olha superficialmente. Não consegue enxergar
através. Não detecta nossa tristeza, nosso queixo que treme, nosso abatimento.
O mundo quer que sejamos lindos, sarados e vitoriosos para enfeitar ele
próprio, como se fôssemos objetos de decoração do planeta. O mundo não tira
nossa febre, não penteia nosso cabelo, não oferece um pedaço de bolo feito em
casa.
O mundo quer nosso voto, mas não quer atender nossas
necessidades. O mundo, quando não concorda com a gente, nos pune, nos rotula,
nos exclui. O mundo não tem doçura, não tem paciência, não pára para nos ouvir.
O mundo pergunta quantos eletrodomésticos temos em casa e qual é o nosso grau
de instrução, mas não sabe nada dos nossos medos de infância, das nossas notas
no colégio, de como foi duro arranjar o primeiro emprego. Para o mundo, quem
menos corre, voa. Quem não se comunica se trumbica. Quem com ferro fere, com
fero será ferido. O mundo não quer saber de indivíduos, e sim de slogans e
estatísticas.
Mãe é de outro mundo. É emocionalmente incorreta:
exclusivista, parcial, metida, brigona, insistente, dramática, chega a ser até
corruptível se oferecermos em troca alguma atenção. Sofre no lugar da gente, se
preocupa com detalhes e tenta adivinhar todas as nossas vontades, enquanto que
o mundo propriamente dito exige eficiência máxima, seleciona os mais
bem-dotados e cobra caro pelo seu tempo.
Mãe é de graça.