"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



segunda-feira, 20 de abril de 2015


Felicidade é ir ao estádio e não ser atingido na cabeça por um vaso sanitário arremessado por um fanático de merda.
É não comemorar gols de letra com uma torcida burra.
É vestir o manto sagrado do time, mesmo sendo ateu.
É sentar no chão da sala e brincar coisas de criança aos 48 anos de idade.
É dizer toda a verdade mesmo sem estar bêbado.
É mentir para o filho que a vida será para sempre boa.
É cantar “I’m singing in the rain” no chuveiro.
É ter alguém que lhe ensaboe as costas.
É voltar a sonhar que, de repente, você está completamente nu, em plena sala de aula, sem que ninguém tenha percebido ainda.
É conseguir tirar as roupas de alguém utilizando apenas os olhos.
É ser despido ao som de “Slave to love”, do Bryan Ferry.
É criar: voar sem asas
É manter um sonho vivo sem a ajuda de aparelhos.
É passar em frente uma construção e ser ovacionada pelos operários.
É assobiar canções de amor depois de ter arrancado os sisos com um dentista.
É permitir que uma paisagem o anestesie.
É contar com a música para ir tocando em frente.
É contar dinheiro, mas, nada que se compare a contar quantas vezes o mar quebra na praia durante o crepúsculo.
É malhar o músculo, ouvir Dorival Caymmi e operar a fimose.
É gozar a lua de mel todinha, ainda que se seja diabético.
É ter o privilégio de adoçar o café de um político ético. Ou seja: felicidade é se deparar numa esquina com um ornitorrinco albino e bilíngue.
É receber um beijo de língua da boca da noite.
É poder votar livremente.
É poder devotar a si mesmo toda a falta de fé que se sente.

Felicidade é foda.
Felicidade pode ser pra você e não pra mim.

Felicidade é jamais matar um homem, nem por força da lei.
Puta que o pariu! Felicidade é um parto normal bem sucedido.
É um torturador que se aposenta.
É a marmita que esquenta.
É quando um tirano morre.
É o renascer da esperança.
É quando a história castiga os insanos para sempre.
É tomar o primeiro chope após sair da UTI.
É evaporar um tumor.
É decifrar a caligrafia de uma receita médica.
É quando o doutor lembra o seu nome.
É deitar e rolar no passeio público.
É cagar e andar para o que pensam da gente.
É voltar a cagar, é voltar a andar, é estar por aí, vivo e aceso.
É sobreviver ao peso de um chatíssimo clássico da literatura mundial que alguém lhe indicou.
É chorar para as amigas durante a happy-hour.
É calar a dor no colo da mãe.
É um pobre poeta ser premiado, de repente, com uma rima rica.
É aprender a beijar com as primas.
É enterrar velhos ressentimentos.
Felicidade é incerta, é contar com uma coberta numa noite fria.
Felicidade é momento, varia.
Felicidade pode ser uma dose de cicuta no cálix bento.


A felicidade é uma coisa foda – Eberth Vêncio