Felicidade é ir ao estádio e não
ser atingido na cabeça por um vaso sanitário arremessado por um fanático de
merda.
É não comemorar gols de
letra com uma torcida burra.
É vestir o manto sagrado
do time, mesmo sendo ateu.
É sentar no chão da sala
e brincar coisas de criança aos 48 anos de idade.
É dizer toda a verdade
mesmo sem estar bêbado.
É mentir para o filho
que a vida será para sempre boa.
É cantar “I’m singing in
the rain” no chuveiro.
É ter alguém que lhe
ensaboe as costas.
É voltar a sonhar que,
de repente, você está completamente nu, em plena sala de aula, sem que ninguém
tenha percebido ainda.
É conseguir tirar as
roupas de alguém utilizando apenas os olhos.
É ser despido ao som de
“Slave to love”, do Bryan Ferry.
É criar: voar sem asas
É manter um sonho vivo
sem a ajuda de aparelhos.
É passar em frente uma
construção e ser ovacionada pelos operários.
É assobiar canções de
amor depois de ter arrancado os sisos com um dentista.
É permitir que uma
paisagem o anestesie.
É contar com a música
para ir tocando em frente.
É contar dinheiro, mas,
nada que se compare a contar quantas vezes o mar quebra na praia durante o
crepúsculo.
É malhar o músculo,
ouvir Dorival Caymmi e operar a fimose.
É gozar a lua de mel
todinha, ainda que se seja diabético.
É ter o privilégio de
adoçar o café de um político ético. Ou seja: felicidade é se deparar numa
esquina com um ornitorrinco albino e bilíngue.
É receber um beijo de
língua da boca da noite.
É poder votar
livremente.
É poder devotar a si
mesmo toda a falta de fé que se sente.
Felicidade é foda.
Felicidade pode ser pra você e não
pra mim.
Felicidade é jamais matar um homem,
nem por força da lei.
Puta que o pariu! Felicidade é um
parto normal bem sucedido.
É um torturador que se
aposenta.
É a marmita que
esquenta.
É quando um tirano
morre.
É o renascer da
esperança.
É quando a história
castiga os insanos para sempre.
É tomar o primeiro chope
após sair da UTI.
É evaporar um tumor.
É decifrar a caligrafia
de uma receita médica.
É quando o doutor lembra
o seu nome.
É deitar e rolar no
passeio público.
É cagar e andar para o
que pensam da gente.
É voltar a cagar, é
voltar a andar, é estar por aí, vivo e aceso.
É sobreviver ao peso de
um chatíssimo clássico da literatura mundial que alguém lhe indicou.
É chorar para as amigas
durante a happy-hour.
É calar a dor no colo da
mãe.
É um pobre poeta ser
premiado, de repente, com uma rima rica.
É aprender a beijar com
as primas.
É enterrar velhos
ressentimentos.
Felicidade é incerta, é contar com
uma coberta numa noite fria.
Felicidade é momento, varia.
Felicidade pode ser uma dose de
cicuta no cálix bento.
A felicidade é uma coisa foda –
Eberth Vêncio