"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



domingo, 29 de março de 2015

só na hora do aperto?


Eu não te conheço.

Não sei se você é católico, protestante, judeu, muçulmano. Não sei se é um dos meus, sem religião, sem igreja, mas cheio de fé. Tanto faz. Acredito naquele velho clichê de que não importa qual a sua crença, desde que ela te faça uma pessoa melhor.

Não sei qual é seu Deus. Se ele é o clássico senhor de cabelos brancos, se é só um feixe de luz, se é um negão bacana de dread, se é o cosmo, se é só um abraço acolhedor ou se é, como para Alberto Caeiro, as flores e as árvores, e os montes e o sol e o luar.

(mas se você, de fato, não tem Deus nenhum, acredito que essa leitura seja perda de tempo)

Enfim, sobre esse seu Deus, quando é que você se lembra dele?

Lembra de Deus num sábado de sol, ao abrir a janela? Ou será que nessa hora só lembra da piscina, da cerveja ou da bicicleta no parque?
Lembra de Deus ao ver uma criança na rua? Ou só quando a sua criança tem 37 graus de febre ou notas baixas na escola?
Lembra de Deus ao comer uma fruta fresca ou um pão quentinho? Ou só quando precisa que sua calça feche por causa dos quilos a mais?
Lembra de Deus quando se sente bem após um período de mal estar? Ou só enquanto há um incômodo?
Lembra de Deus quando vê um pedinte com olhos tristes no farol? Ou só quando ele se aproxima de você, te causando algum tipo de medo?
Lembra de Deus quando recebe um abraço com amor? O só quando o amor dá errado e você precisa se reerguer?
Lembra de Deus quando entra em sua casa tão querida? Ou só quando o trânsito não te deixa chegar nela?
Lembra de Deus quando faz carinho em um filhote de cachorro? Ou só quando se depara com uma barata voadora?
Lembra de Deus quando o médico te diz que está tudo ótimo? Ou só quando há alteração nos exames?

Sabe aquele amigo que só te procura na hora do aperto? Quando precisa de ombro, de grana, de favor? E pior: ajudamos esse cara e na hora em que fica tudo bem, ele não te dá um abraço agradecido, nem tem convida para comemorar. Só vai te procurar uns meses depois, quando outro problema surgir.

Será que às vezes não somos um desses com Deus? Deixando que ele participe da nossa vida só na hora da cobrança e do aperto?

Será que estamos sendo boa companhia para nosso Deus? Ou somos o tal cara oportunista e folgado?

Não acredito que nossos deuses nos abandonem.

Mas será que quando alguém deseja que você vá com Deus ele vai com você por obrigação ou por vontade? Vai feliz, te amparando, ou vai só cumprir sua função?
Será que esse Deus está feliz ao nosso lado, como estamos ao lado dele? Cabe a nós fazer com que ele esteja. E isso não é nada além do que se chama de “gratidão”.

Porque amor, com amor se paga.

___Ruth Manus