"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



quarta-feira, 17 de julho de 2013


Ela tinha a beleza tranquila da maturidade.
Alguns fios de cabelo branco davam ao seu rosto um encanto especial.
De hábitos domésticos e simples, um de seus prazeres era assentar-se numa poltrona e entrar na bolha que a leitura cria.
Quem lê está num outro mundo, muito distante.

O marido a observava de longe. Olhos que observam são aqueles que olham quando o outro não está olhando. Seu olhar era o de apaixonado que desconfia, olhar de ciúme. Os olhos do ciumento vigiam.
Vigiam gestos, movimentos, horas, sorrisos.
Vigiam porque as modulações silenciosas e distraídas da pessoa amada podem conter revelações sobre aquilo que ela esta pensando.

O ciumento suspeita que o ser amado lhe esconda alguma coisa.
Olha na esperança de ver algo escondido, de entrar dentro do segredo do outro. O ciumento detesta os pensamentos.
Por mais que os vigie, eles estão além de sua vigilância.
Ele queria adivinhar seus pensamentos.
E a sua vigilância se exacerbava quando ela sorria ou ria.
Como explicar este sorriso se ele, o marido, não estava dentro do livro?
Ela não precisava dele pra ser feliz.
Porque ali, mergulhada no livro, o marido não existia...

O ciúme nasce quando se toma consciência de que a pessoa amada é livre. Ela é um pássaro pousado no ombro.
Nada o prende. Pode voar quando quiser.