"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



quinta-feira, 18 de outubro de 2012


O nome é um espelho. O primeiro e último espelho. A nossa estreia pública, na certidão de nascimento, e o nosso derradeiro aceno das letras, na lápide.

Enxergar o nome impresso foi sempre uma das minhas principais alegrias. Eu sabia que existia, mas era a chance de outros saberem. Vinha como promessa de alguma posteridade, de alguma fama, de algum significado maior.

Talvez a gente viva pelo desejo de ver nosso nome em destaque. É a primeira coisa que a gente aprende na escola: escrever o nome. No meu caso, em intermináveis cadernos de caligrafia.

É o motivo da batalha inicial — de uma guerra sem fim — dos pais por nossa causa: qual será o nome dele?

É uma briga que levamos vida afora, defendendo a grafia em hotéis e documentos e a pronúncia em telefonemas e encontros.

O nome é a solidão, a paz, o ferrolho dos recreios e das corridas, onde nenhum colega pode nos alcançar (terrível quando nos deparamos com um nome e sobrenome exatamente iguais ao nosso, e ainda descobrimos que o gêmeo bastardo é mais rico, sortudo e feliz e que, na verdade, somos o bastardo dele).

Sem nome, não existe destino. Recordo minha concentração obsessiva ao treinar a assinatura para a carteira de identidade, o temor de não repeti-la.

Pense na força do nome nas conquistas. Sem ele, sequer nos alegramos, não há mérito. O nome é a cicatriz da vitória.

Meu nome na toalhinha de rosto do jardim da infância. Meu nome na lista de chamada. Meu nome no boletim escolar. Meu nome no cabeçalho do bilhete de amor. Meu nome no título de eleitor. Meu nome na lista dos aprovados do vestibular. Meu nome no primeiro livro. Meu nome na casa própria. Meu nome no convite de casamento. Meu nome na conta de luz.

Mas o lugar mais importante de todos e o que mais esperei para colocar meu nome, e que hoje não faz nenhum sentido, era a lista telefônica. Antes do Google e dos sistemas de busca, só havia um jeito de encontrar alguém: consultando aquele calhamaço dividido entre as páginas cinza (residencial) e as amarelas (comercial). Não importava que a letra fosse de formiga, de bíblia, imperceptível, que dependia do corrimão do indicador. Quem ali constava desfrutava de respeito, de valor, de dote social. Ter o nome na lista telefônica era a prova incontestável de que havia ingressado na vida adulta. O momento que entrei como proprietário de endereço e telefone não me aguentei de contentamento: Nejar, Fabrício. Página 879 de Porto Alegre. Qualquer trote já identificava como resultado da publicação. Melhorou meu riso no trabalho. Melhorou meu desempenho sexual. Cresceu bigode nas vogais.

Fui mostrar ao meu avô que apareceu mais um Nejar na Lista Telefônica. O décimo primeiro, sublinhei a linha para não me confundir na hora de procurar.

— Olha, vô, aqui! Estou famoso.
— Agora você está igual a todos.
— Ei, por quê?
— Gente comum tem seu nome na lista telefônica, gente famosa tira.