"Ando no rastro dos poetas, porém descalça... Quero sentir as sensações que eles deixam por ai"



sábado, 28 de janeiro de 2012

O terrível dia de abrir as pernas


Homens pensam que abrir as pernas é a maior moleza: só deitar ali, arrancar a calcinha e correr pro abraço.
Na maioria das vezes é até verdade, mas um dia no ano, durante muitos anos, esse ato tão banal e corriqueiro vira um martírio abissal: o dia do papanicolau.

Menos uma data santa e muito mais um mergulho no inferno do desconforto, o dia começa com aquele famoso “pode se despir e colocar esse avental com a abertura voltada pra trás”.
Peladas, descalças sobre o chão frio e com um ventinho batendo na bunda, vamos nos encaminhando para a sala de exame.
Ao abrir a porta, temos a visão do hall do Hades: uma maca coberta por lençol de papel, dois apoios para os pés, um computador esquisitão e um médico com sorriso polido.

Deitamos. Deslizamos a bunda até a beira da maca, abrindo até a alma para a exploração iminente, encaixamos os calcanhares nos apoiadores.
“Agora relaxe.”
Então ele adentra o âmago do nosso ser.
Gelado, fino, metálico.
Um troço bizarro chamado espéculo.
Ele percorre o caminho e chega ao ponto final: ali pertinho do colo do útero, onde alguns homens adoram brincar de bate-estaca, nos provocando sensações tão agradáveis quanto uma perfuração de tímpano.
E, então, expiramos aliviadas.
Por pouco tempo.
Algo dentro de nós se expande e alarga.
Quer dizer, mais ou menos dentro. Dentro e fora, pra ser exata.
O bico de pato estilizado afasta nossas caras-metades inferiores até que a zona do agrião fique absolutamente livre para o ataque final: o dedo.
E nessa hora uma tremenda vulnerabilidade nos assola.
Além de escancaradas, temos um pedaço de mão cutucando cada canto e cavidade, procurando caroços, carnes estranhas e toda sorte de possíveis doenças.
Mas não é nelas que pensamos enquanto nossa bexiga é pressionada e os ovários são coçados.
Pensamos é no quanto aquela situação lastimável vai durar.
E então, num transe anual, enxergamos o mundo através dos olhos de Einstein: o tempo é mesmo relativo.
O exame nunca dura mais que cinco minutos, mas parece que daria para assistirmos a trilogia de O Senhor dos Anéis na seqüência.

O dedo é retirado, mas não é o fim.
É o anúncio da hora da entrada de um tipo de palito de sorvete que escarafuncha e raspa nossas umidades para retirar o “material” que será analisado e dirá se nossa querida está 100% em ordem e habilitada para uso contínuo.
Só daí somos despirulitadas e fechamos tudo o que estava aberto.

E pensar que a homarada faz o maior estardalhaço e arma um baita dramalhão só por causa de uma mera dedadinha no traseiro.
Mas como são mocinhas…