Ele não sabe mais
nada sobre mim.
Não sabe que o
aperto no meu peito diminuiu, que meu cabelo cresceu,
que os meus olhos
estão menos melancólicos, mas que tenho estado quieta, calada, concentrada numa
vida prática , e sem aquela
necessidade toda de ser amada.
Ele não sabe
quantos livros puder ler em algumas semanas.
Não sabe quais são
meus novos assuntos nem os filmes favoritos.
Ele não sabe que a
cada dia eu penso menos nele,
mas que conservo
alguma curiosidade em saber se o seu coração está mais tranqüilo,
se seu cabelo
mudou, se o seu olhar continua
inquieto.
Ele nem imagina
quanta coisa pude planejar durante esses dias,
e como me isolei
pra tentar organizar todos os meus projetos.
Que tenho sentido
mais sono e ainda assim, dormido
pouco.
Que tenho escrito
mais no meu caderno de sonhos.
Que aqui faz tanto
frio, ele não sabe por mim.
Ele não sabe que
eu nunca mais me atentei pra saudade.
Que simplesmente
deixei de pensar em tudo que me parecia instável.
Que aprendi a não
sobrecarregar meu coração, este órgão tão nobre.
Ele não sabe que
eu entendi que se eu resolver a minha dor,
ainda assim,
poderei criar através da dor alheia sem precisar sofrer junto pra conceber um
poema de cura.
Hoje foi um dia em
que percebi quanta coisa em mim mudou e ele não sabe sobre nada disso.
Ele não sabe que
tenho estado tão só sem a devastadora sensação de me sentir sozinha.
Ele não sabe que
desde que não compartilhamos mais nada sobre nós,
eu tive que me
tornar minha melhor companhia:
ele nem imagina
que foi ele quem me ensinou esta alegria.
...
Eu te agradeço por
esse afastamento lento e gradual e pela viagem interrompida por seus perpétuos
atrasos causados pelo medo de tirar os pés do chão.
Agora, a cada dia
eu preciso de uma roupa nova desde que minhas malas
foram extraviadas
para sempre com todo o nosso excesso de bagagem.
Eu te agradeço
pela honestidade da sua omissão tão previsível que sempre confundi com meus
presságios.
Essa ida sem
despedida que você covardeou: eu finjo que não sei, você finge que não foi.
E a gente segue
inventando que ainda se interessa pelo que começamos a construir juntos,
num outro
contexto, pra realçar nossos vínculos.
Eu te agradeço a
descoberta de que se não seguimos juntos nessas coisas do amor,
seja porque talvez
eu, veterana
enquanto
você ama-dor.